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CRÍTICA

Kiyoshi Kurosawa testa limites éticos no capitalismo em 'Cloud'

Novo longa de Kiyoshi Kurosawa foi exibido na noite de abertura do 14º Olhar de Cinema, em Curitiba

Allan Lopes

Publicado: 12/06/2025 às 13:24

Masaki Suda interpreta o controverso Yoshi em 'Cloud'/Foto: Divulgação

Masaki Suda interpreta o controverso Yoshi em 'Cloud' (Foto: Divulgação)

O dinheiro pode ser a redenção de alguns e a ruína de outros. Em seu novo filme Cloud, o diretor Kiyoshi Kurosawa coloca Ryosuke Yoshii (Masaki Suda) nesse abismo moral: um homem disposto a recomeçar a vida ao lado da namorada Akiko (Kotone Furukawa), mesmo que seu caminho de esperança se construa sobre a perdição alheia. Selecionado como filme de abertura da 14ª edição do festival Olhar de Cinema, realizado em Curitiba, o longa teve sua estreia acompanhada pelo Viver nesta quarta-feira (11).

Autor de pérolas como Cure e Pulse, Kurosawa mais uma vez canaliza o mal-estar social em sua assinatura inquietante. O filme, que foi escolhido pelo Japão para a corrida do Oscar deste ano, é inspirado em um evento real e aborda a história de um grupo de justiceiros formado na internet que se rebela contra Yoshii, um revendedor online de produtos baratos a preços elevados.

Apesar de trabalhar como operário em uma pequena fábrica, o jovem se dedica a revender todos os tipos de mercadorias online, desde roupas a equipamentos médicos. Ao se sentir lesada, sua clientela é dominada por um sentimento de raiva, levando até mesmo pessoas não diretamente prejudicadas a se unirem contra ele, motivadas por ressentimentos pessoais.

Impedido de comparecer ao festival por já estar envolvido na produção de seu novo longa, Kurosawa gravou um vídeo para o público brasileiro. “Cloud traz uma realidade que poderia ser de qualquer pessoa no Japão atual”, afirma. Com a devida licença do aclamado diretor, a leitura pode ir além das fronteiras japonesas e refletir qualquer um tentando sobreviver, ou sonhar, dentro do capitalismo.

No caso de Yoshi, ele contou com a ajuda de seu fiel escudeiro Sano (Daiken Okudaira) em duas frentes. Primeiro, para lidar com a demanda intensa do negócio; depois, para protegê-lo dos clientes traídos. Tudo o que restava ao revendedor era se preocupar com o faturamento “Preocupe-se apenas em fazer dinheiro. Eu trato do resto”, disse Sano. Afinal, no sistema capitalista, até a violência pode ser terceirizada.

Misturando thriller, ação e um humor que surge nos cantos mais improváveis, Kurosawa faz do filme um espelho desconfortável. Afinal, quem nunca se perguntou se valeria a pena trocar o peso da rotina por atalhos como os jogos de aposta — mesmo à custa da própria integridade? Em Cloud, essa escolha deixa de ser hipotética e revela até onde estamos dispostos a ir quando a promessa de uma vida melhor bate à porta.

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