Em 'Die, My Love', Jennifer Lawrence volta aos extremos da maternidade
Também estrelada por Robert Pattinson, comédia sombria de Lynne Ramsey (de 'Precisamos Falar sobre Kevin') começa forte, mas que não sai da primeira camada
André Guerra - Enviado especial
Publicado: 17/05/2025 às 23:34
Um dos filmes mais aguardados do Festival de Cannes 2025 finalmente estreou na Riviera Francesa, com a presença do elenco, liderado pelos astros Jennifer Lawrence e Robert Pattinson, e da diretora Lynne Ramsey (de Precisamos Falar sobre Kevin e Você Nunca Esteve Realmente Aqui). Misto de comédia sombria e suspense psicológico, Die, My Love (sem previsão de estreia nos cinemas brasileiros) está em competição pela Palma de Ouro e o Diario esteve presente na sessão de imprensa do último sábado (17), às 22h.
Na trama, inspirada no livro homônimo escrito Ariana Harwicz lançado em 2017, um casal, Grace (Lawrence) e Jackson (Pattinson), se muda para uma casa isolada na floresta, onde ela rapidamente engravida. Desde muito cedo, porém, fica claro que algo está errado e essa mãe, claramente em depressão pós-parto, começa a agir de modo imprevisivelmente agressivo.
Quase oito anos atrás, Jennifer se lançou no mais desafiador papel de sua carreira no alegórico e altamente controverso Mãe! (2017) e, passada uma fase de baixa na sua filmografia, a atriz retorna à pressões extremas da temática da maternidade de uma forma drasticamente diferente. Enquanto naquele filme de Darren Aronofsky ela era o alvo passivo da brutalidade promovida pelos homens e ignorada pelo seu marido, em Die, My Love sua presença é que é o corpo ativo da violência.
Não fica claro no longa os detalhes das condições psíquicas de Grace e pouco é fornecido também sobre o passado daquele casal — menos ainda sobre os outros personagens que circulam pela história, como o vizinho misterioso vivido por Lakeith Stanfield. O que importa à narrativa de fato são os surtos, às vezes abruptos e às vezes premetidáveis, da protagonista em uma jornada irrefreável de rejeição ao papel que lhe foi desenhado.
Apesar de tratar dessa emancipação sem julgamentos morais e de abraçar algumas ideias do cinema contemporâneo sobre papéis definidos em casamentos (a inércia do marido frente aos acessos da esposa tal qual sua ausência sexual, a hipocrisia dos coadjuvantes, a natureza como parábola do feminino), Die, My Love não tem uma agenda particularmente propositiva. A intenção da diretora parece mais propor uma experiência incômoda, uma assinatura célebre sua, do que tecer uma tese edificante.
O problema é que, para isso, a trama precisaria de um pouco mais de substância e massa muscular que desse conta de desenvolver uma progressão narrativa. Da maneira como as coisas acontecem, o filme parece mais uma sucessão de cenas que buscam um impacto mais bruto (com som e imagem potentes) do que um desenrolar que promova um impacto dramático real para além dessa primeira camada. São várias as cenas em que a personagem faz ou ameaça fazer algo chocante e, mesmo assim, Die, My Love parece estar no exato mesmo lugar desde as primeiras cenas até o anticlimático desfecho.
Quem escapa dessa superficialidade, dentro do possível, é a própria Jennifer Lawrence, cujo humor continua tinindo e a capacidade de magnetizar a plateia apenas com o jeito de se mover em cena se mantém tão impressionantes como nos seus grandes trabalhos. Com menos tempo de tela, Robert Pattinson está ótimo nesse papel de marido infantilizado, com um olhar sempre melancólico, como se fosse mais um filho que ela precisa cuidar.
Melhor no seu humor ácido do que nas suas incursões de terror psicológico, Die, My Love é forte candidato para a categoria de Melhor Interpretação Feminina do Festival de Cannes, tanto pela presença poderosa da estrela quanto pela carga temática, mas está longe de ser uma experiência completa em todas as suas intenções dramáticas e sensoriais.

