Prefeitura de Olinda prepara desocupação das margens da Avenida Pan Nordestina
No local, funcionam lojas de roupas, óticas, salões de beleza, barbearia, lanchonetes e uma oficina mecânica, que, segundo a gestão municipal, configuram "ocupação indevida do espaço urbano".
Sem decisão judicial, a Prefeitura de Olinda prepara a desocupação de mais de dez edifícios irregulares construídos às margens da Avenida Pan Nordestina, em frente a uma escola estadual. No local, funcionam lojas de roupas, óticas, salões de beleza, barbearia, lanchonetes e uma oficina mecânica, que, segundo a gestão municipal, configuram “ocupação indevida do espaço urbano”.
No entanto, desde 1992, Moisés Severino Bispo, de 71 anos, trabalha como vendedor em dois fiteiros em frente a Escola Estadual Referência em Ensino Médio (EREM) Áurea de Moura Cavalcanti. Ele conta que, na tarde da quarta-feira (9), foi surpreendido por agentes da Secretaria de Meio Ambiente e Planejamento Urbano (Semapu) de Olinda.
“Ali eles demoliram ontem”, diz, se referindo a uma pilha de entulhos de alvenaria. “Era o meu filho que estava levantando uma loja. Não avisaram nada, só derrubaram tudo. Não me deram nada para assinar. Colaram uns avisos de interditado aqui, mas arranquei”.
Os fiteiros de Moisés são de chapa de aço e foram legalizados, segundo ele, ainda na década de 1990. “Eu peguei uma declaração com o diretor do colégio da época, fiz uma planta da barraca e levei na prefeitura. De lá até 2014, paguei a taxa de uso de solo para a Prefeitura. Depois disso, eles disseram que não aceitariam mais o pagamento”, afirma.
Em 2014, os comerciantes da área protestaram contra a retirada das barracas. Na época, o grupo reclamou que não foram criadas alternativas de local de trabalho ou chamados para conversar. “Depois disso, ficamos aqui. Pagamos nossas contas, seguimos com nosso comércio. Até quarta, quando vieram derrubando tudo sem avisar e colocando placas de interditado, sem conversar com a gente”, declara Moisés.
Além dos fiteiros, a notificação foi feita a todas as lojas construídas na calçada da escola. “Dá vontade de fechar a avenida todinha com pneus e sofás velhos e protestar. Isso aqui é tudo que construímos, sabe?”, diz um dos comerciantes, que prefere não se identificar. Nas portas, trabalhadores afirmaram ao Diario de Pernambuco que não sabiam o que fariam após o aviso.
Foi um deles que recebeu o papel, escrito com caneta azul, da mão de um dos agentes da Semapu. O texto dizia que eles possuíam um prazo de cinco dias para saírem do local. Segundo os comerciantes, o prazo encerra na segunda-feira (14).
“Desesperador”
Usando o Google Mapas, a reportagem apurou que as edificações em alvenaria começaram a tomar forma na Avenida Pan Nordestina em 2012. As estruturas cresceram, ganhando novos andares e escadas em 2018.
“O ponto não é meu, é alugado. Quando eu cheguei estava na planta. Eu investi em reboco, revestimento, pintura e tudo”, relata outro, que também pede para não ser identificado, e trabalha em uma das lojas há cinco anos.
Nenhuma das sete pessoas ouvidas pela reportagem declaram saber, até a chegada dos agentes da Semapu, que as construções são ilegais. Os comerciantes também disseram desconhecer a irregularidade das construções e afirmaram que o suposto dono não apresentou alvará ou documentação. O Diario de Pernambuco não o localizou.
“Nós não estamos batendo o pé para ficar aqui. Estamos todos muito nervosos. Cinco dias é pouquíssimo tempo para conseguirmos achar um novo lugar, nos mudar, começar tudo de novo”, declara outro comerciante.
Para o grupo, a saída dos comércios tornaria a via “ainda mais perigosa”. “Aqui é mal iluminado, essa é uma via super-parada, direto tem assalto por aqui. Aqui já é ruim de segurança, sem as lojas, eu acho que vai ficar ainda pior”, finaliza.
Portaria de Instauração
No Diário Oficial do Ministério Público de Pernambuco, publicado em 4 de julho, uma portaria de instauração, assinada pelo promotor Jefson M. S. Romaniuc, busca apurar “possíveis irregularidades em alvenaria nas calçadas do entorno da Escola EREM Áurea de Moura Cavalcanti”. De acordo com a portaria, as construções estariam obstruindo a entrada da escola.
Tais irregularidades poderiam violar, segundo o MPPE, a legislação de uso e ocupação do solo urbana, à regularidade fundiária, o direito à educação, à segurança pública e à proteção do patrimônio público estadual.
Para isso, o órgão solicitou que a Prefeitura adotasse medidas pertinentes para solucionar o problema e tomasse as medidas administrativas pertinentes, sob pena de responsabilização.
O que diz a Prefeitura de Olinda
A Prefeitura de Olinda afirma que a ação de notificação e desocupação segue o pedido do MPPE e declara que “as estruturas estão instaladas sobre área pública, especificamente nas calçadas do entorno da unidade escolar, caracterizada como área de recuo ou faixa de domínio do Departamento de Estradas de Rodagem (DER)”.
Afirma também que essa é uma “remoção administrativa de construções irregulares em bem público, conforme previsto na legislação urbanística e ambiental... A medida tem amparo legal no Código de Posturas do Município e no Plano Diretor vigente, que preveem a desobstrução de áreas públicas ocupadas sem autorização”, diz trecho.
O Diario de Pernambuco questionou qual diálogo foi estabelecido com os ocupantes antes da emissão da ordem de desocupação, qual alternativa foi oferecida, porquê concederam apenas cinco dias para a desocupação e quando a demolição será feita. A Prefeitura de Olinda, entretanto, não respondeu até a publicação dessa reportagem.
Por meio de nota, a Secretaria de Estadual de Educação informou que a retirada das edificações não está sob responsabilidade da pasta e que não fazem parte da unidade escolar.
O Diario procurou também o Departamento de Estradas de Rodagem, mas também não obteve retorno.
Nota da Prefeitura de Olinda
A Prefeitura de Olinda, por meio da Secretaria de Meio Ambiente e Planejamento Urbano, informa que a ação de notificação e desocupação nas imediações da Escola EREM Áurea de Moura Cavalcanti obedece ao Procedimento nº 01923.000.133/2024, instaurado pelo Ministério Público de Pernambuco (MPPE). O órgão ministerial solicitou esclarecimentos sobre a natureza da ocupação, a titularidade do terreno e as providências adotadas pela gestão municipal diante das denúncias recebidas.
Durante vistoria técnica, foi constatado que as estruturas em questão estão instaladas sobre área pública, especificamente nas calçadas do entorno da unidade escolar, caracterizada como área de recuo ou faixa de domínio do Departamento de Estradas de Rodagem (DER). Tais construções são irregulares, não possuem alvará ou licenciamento, e configuram ocupação indevida do espaço urbano, comprometendo a acessibilidade e o ordenamento territorial.
A Prefeitura não trata o caso como reintegração de posse, mas como remoção administrativa de construções irregulares em bem público, conforme previsto na legislação urbanística e ambiental. A medida tem amparo legal no Código de Posturas do Município e no Plano Diretor vigente, que preveem a desobstrução de áreas públicas ocupadas sem autorização.
Ressalta-se que a ação não tem relação com obras na rodovia PE-15, sendo motivada exclusivamente pela necessidade de atender à solicitação do Ministério Público e de assegurar o uso correto da área pública.