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OBSERVATÓRIO ECONÔMICO

A bala de prata não existe

Publicado em: 29/04/2019 11:48

Em uma economia pouco desenvolvida e envolta em crises contumazes como a nossa não é estranho que as pessoas fiquem em busca de alguma solução mágica que, ao balançar de uma caneta, irá resolver todos os nossos problemas de renda e distribuição, e sem uma gota de nosso próprio esforço. Não raro, nessas economias, ou nestas sociedades caso prefiram, grupos políticos costumem encorajar este tipo de pensamento sempre na concepção que eles possuem a tal caneta divina. Mesmo que em alguns poucos milhares de anos de história documentada jamais tenha havido qualquer registro que isto tenha existido em qualquer tempo ou lugar, várias centenas de milhões ainda acreditam, em maior ou menor grau, nesta fábula social.

Por estas terras nos últimos meses a fábula da vez é que a reforma da previdência irá a todos redimir. Bobagem, embora a falta da reforma deva a todos condenar, a sua aprovação é tão somente parte do processo de realinhamento da sociedade brasileira a uma sociedade global cada vez mais competitiva. O passo mais importante, além da reforma, talvez seja mesmo que aos poucos eliminar primeiro a visão do capitalismo de amigos e, na sequência, estabelecer que existe o capitalismo com estado e não o capitalismo de estado. O estado como parceiro no investimento, nos ganhos e no risco precisa substituir o estado que assume investimento e risco enquanto deixa o ganho para o empresário.

A expectativa de ganho caminha de mãos dadas com o risco, isto é algo estabelecido desde sempre na sociedade e desde décadas na teoria econômica. Veja-se o caso dos imóveis no Brasil, por exemplo, os preços explodiram entre 2000 e 2014 e depois estagnaram.

Enquanto o boom foi sustentado pelo crescimento da renda e do crédito quem investiu ganhou muito, e quando a oferta saturou o mercado quem investiu viu seu dinheiro ficar preso em um ativo sem valorização e de liquidez absurdamente baixa. Isto é parte do jogo, se repete com qualquer investimento em qualquer mercado, dos imóveis a bolsa de valores.

Em um contexto de maior competitividade nos mercados globais qualquer iniciativa que permita a nossa população lidar com esta situação é bem-vinda. Formações sólidas em empreendedorismo, em disciplinas de base tecnológica e valorização da formação em lógica formal (matemática) e comunicação (línguas) são o caminho universal que as nações com sucesso na aspiração ao clube dos desenvolvidos tomaram. Nós não. É inaceitável que o Brasil permaneça em um modelo de ensino em que nada se agrega qualidade do conhecimento ou a produtividade do indivíduo, e isto se evidencia na forma do crescimento de anos de estudo da população enquanto permanecemos em posições vexatórias na avaliação internacional da educação (PISA) e não nos movemos na produtividade do trabalho por anos a fio.

Observando como um leigo os paradigmas aplicados a educação no Brasil, e julgando pelos resultados, não resta dúvida que se trata de um fracasso retumbante. E nem o ensino superior se salva, com mais da metade dos alunos matriculados em cursos de direito e administração e com foco destacado na realização de concursos públicos.

Todos os indicadores recentes, da educação ao PIB, sugerem que o Brasil está ficando para trás do resto do mundo na corrida pelo desenvolvimento qualquer seja o conceito aplicado. Já está mais que na hora de começar a parar de querer a reinventar a roda, de entender como outros países superaram dificuldades e buscar soluções ao invés de criticar alternativas. E, definitivamente, esquecer a fábula do capitalismo sem risco e da bala de prata que resolverá todos os nossos problemas. Que conste, até hoje estas crenças resolveram apenas os problemas de quem fez você acreditar nelas.

* PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA UFPE.
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