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Observatório Econômico O fantasma da exclusão ronda os planos de saúde

Por: Fernando Dias - Diario de Pernambuco

Publicado em: 31/12/2018 13:50 Atualizado em:

Ano novo, preço novo. Ao longo dos últimos anos os usuários de planos e seguros de saúde em todo o Brasil vivem o tormento de cada novo ano terem de arcar com reajustes escorchantes, as vezes até dez vezes superiores à inflação do período. Apesar de haver um agente regulador neste processo, a Agência Nacional de Saúde (ANS), esta realidade não só perdura faz bastante tempo como, ao que tudo indica, deverá perdurar em um horizonte ainda indefinido. O que está acontecendo? Planos e seguros de saúde se tornaram a galinha dos ovos do ouro do mercado? A ANS está cega? Este negócio irá se sustentar deste jeito?

Vamos a primeira questão. Apesar de algumas das grandes operadoras terem registrado lucros milionários nos últimos anos, a falência de operadores de planos e seguros saúde é uma constante. Como pode um setor só aumenta de forma escorchante o custo dos segurados e passa uma década para reajustar os valores que paga aos médicos ter prejuízo? É a forma como está organizado o serviço, onde a ANS optou por uma regulação em termos de cestas de procedimentos amplas, e isto nos leva a segunda questão.

A ANS não está cega, ela apenas optou por uma forma de regulação que, a luz da teoria econômica, não parece fazer qualquer sentido. A prestação deste tipo de serviço no Brasil é sujeita a lista de procedimentos cobertos, e que é incrivelmente ampla e costuma de tempos em tempos ser expandida. Ocorre que no segmento de saúde se lida basicamente com risco, e este risco é usualmente relacionado com o perfil dos clientes. É mais ou menos como no seguro automotivo, onde o preço do seguro é baseado em uma série de características do proprietário do carro.

Os planos e as seguradoras não podem segmentar desta forma, as únicas segmentações possíveis são por idade e planos corporativos. Isto significa que em cada grupo há clientes dos mais variados perfis, e com diferentes intensidades de uso dos planos e seguros, sendo que todos pagam a mesma coisa. Este tipo de problema, de risco moral e seleção adversa, foi descrito faz décadas e o precursor destes estudos foi inclusive laureado com o prêmio Nobel. Como não se pode utilizar as ferramentas construídas para lidar com os riscos das carteiras de clientes o que ocorre é que se paga pela média da sinistralidade, e esta por sua vez é condicionada pelos indivíduos de maior risco dentro do grupo. Resultado, os preços ficam particularmente elevados na percepção dos indivíduos de menor risco, que tendem a sair da carteira e isto faz preços subirem ainda mais pois a média sobe dado que os indivíduos que usam menos saem do grupo.

É viável no longo prazo? Dizemos em economia que os agentes reagem, e aqui temos um bom exemplo. A principal segmentação possível é por grupo de idade e esta característica tem efeito bem conhecido sobre a sinistralidade, quanto mais velho maior o uso. A reação óbvia é elevar substancialmente o custo para o grupo mais velho. Em verdade, e os valores hoje cobrados pelas principais operadoras de planos e seguro saúde sugerem esta hipótese, o mais razoável para estes agentes é simplesmente excluir as faixas etárias superiores. É claro que não é permitido simplesmente excluir, mas isto é um efeito natural de valores excepcionalmente elevados que inviabilizam a contratação. Assim se construiu a situação atual, onde os planos individuais estão sumindo, apenas os corporativos são amplamente oferecidos, e os mais idosos pagam valores que por vezes beiram o absurdo.

Com base nesta hipótese é possível concluir que ao longo das próximas décadas, se nada for feito, a tendência é que apenas os grupos mais jovens tenham planos e seguros saúde, e todos os demais dependam exclusivamente do SUS e do atendimento particular. É torcer que um mínimo de bom senso chegue até Brasília.