LITERATURA
Morcego Cego, livro mais complexo de Gilvan Lemos, ganha nova edição pela Cepe
Por: Emannuel Bento
Publicado em: 09/07/2021 11:52 | Atualizado em: 09/07/2021 12:34
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Foto: Cepe/Divulgação |
Um dos autores pernambucanos mais importantes da segunda metade do século passado, Gilvan Lemos (1928-2015) foi um mestre da ficção moderna brasileira. Contudo, o artista passou a carreira insatisfeito por não ter alcançado a projeção desejada, mesmo após 20 títulos publicados. O lançamento de Morcego cego (1998) pela editora Record, em um evento pomposo no Teatro Apolo, traduzia uma espécie de última tacada para esse sonhado destaque. Essa pretensão, é claro, também está presente na própria obra. Morcego cego, que pode ser considerado o seu livro mais complexo em narrativa e refinado linguisticamente, acaba de ganhar uma nova edição pela Cepe Editora.
O evento virtual de lançamento será nesta sexta-feira (9), às 19h, em live no canal da Cepe no YouTube com participação de Lívia Valença, sobrinha de Gilvan e responsável pelo Espaço Cultural Escritor Gilvan Lemos, em São Bento do Una, e do pesquisador e escritor Pedro Américo de Farias, que manteve uma longa amizade com o escritor. A mediação será do jornalista Thiago Corrêa, autor da biografia Gilvan Lemos: o último capítulo (Cepe, 2017).
Em Morcego cego, Gilvan conta a trajetória de Juliano, menino criado em situação de miséria e que se torna um homem ambicioso, mas atormentado pelos dramas do passado. O autor rompe com a estética linear e mescla simultaneamente três tempos da narrativa para costurar as memórias do personagem, que está em diálogo com um narrador, apesar de revelado no final. Os capítulos iniciados pela letra "A" resgatam a infância pobre e os segredos sobre a origem, já os de letra "B" mostram seu caminho na criminalidade e as relações de interesse, enquanto nos de letra "C", ele divaga sobre sucessos e fracassos.
"Se compararmos Morcego cego com os seus primeiros livros, vamos notar que existe um amadurecimento. Na primeira fase, ele é como um contador de histórias, talvez menos preocupado com a técnica. Nesse livro existe essa mudança, um desejo pelo rebuscamento", diz Thiago Corrêa. "Acredito que Morcego cego represente bem essa coisa de Gilvan buscar mais projeção. Acho que ele sentia que os outros escritores da geração dele tinham esse cuidado. Eu o vejo querendo buscar sentidos, experimentações e mudanças."
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Foto: Cepe/Divulgação |
Apesar da constante insatisfação de Gilvan, Corrêa ressalta que o autor é um artista conhecido e que os grandes escritores da posterioridade reconhecem o seu talento. "A editora Record, que publicou Morcego cego pela primeira vez, era uma das maiores do Brasil. Mas as coisas não aconteceram do jeito que ele esperava", diz o jornalista. O escritor ganhou destaque em 1968, com o livro Emissários do diabo (Editora Civilização Brasileira). Foi eleito por aclamação para a cadeira 26 da Academia Pernambucana de Letras em 2011, quatro anos antes de sua morte.
A advogada e escritora Lívia Valença, sobrinha de Gilvan, ressalta a complexidade de Morcego cego. "O romance mostra a jornada de Juliano para descobrir um segredo. O personagem é um morcego porque é incapaz de sobreviver à luz, mas procura a luz o tempo todo. Nesse caso, a luz seria a glória, a fama e riqueza. Apesar disso, também sinto uma pegada de humor. Eu nunca vi um crítico literário tocar nesse aspecto", conta.
"Ele também era um cinéfilo e usava muito a linguagem do flashback, que é uma técnica do cinema. Por isso, acredito que muitos livros seus poderiam virar filmes", continua Lívia, que tomou como uma missão pessoal tornar a obra do tio mais conhecida. "Minha luta agora é conseguir fazer com que Anjo do quarto dia (1987) e Espaço terrestre (1993) virem filmes. Isso poderá tornar a obra dele mais conhecida, pois ele não é conhecido como deveria no Brasil. Isso porque não era um marqueteiro nato. Ele se escondia, era tímido, humilde", opina a sobrinha. Esses títulos citados, inclusive, foram reeditados pela Cepe em 2013 e 2018, respectivamente, além de Olhos da treva (reedição em 2012), Emissários do diabo (2013), Jutaí menino (2016) e Noturno sem música (2016).
Espaço Cultural
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Fachada do Espaço Cultural Escritor Gilvan Lemos, em São Bento do Una (Foto: Divulgação) |
Desde 2012, Lívia Valença vem consolidando em São Bento do Una o Espaço Cultural Escritor Gilvan Lemos, que ocupa um prédio construído na década de 1940 para abrigar a cooperativa dos produtores rurais do município. Administrado pelo Instituto Lívio Valença, o local ainda está na busca da conclusão após esforços da advogada, que vem investindo do próprio bolso e aprovando projetos via Funcultura (três, até o momento) para viabilizar etapas do espaço.
"O projeto precisa de mais dinheiro, pois o prédio estava completamente destruído. Quero que esse complexo tenha museu, salão para exposição de pintura e de fotografia, biblioteca infantil, café cultural, oficinas de arte, um terraço aberto de mais de 600 m2 para feira de livros e de artesanato, salão de jogos, parque e estacionamento" diz. "Vou batalhar para conseguir. Quando ficar pronto, desejo que o espaço seja auto sustentável com a venda de ingressos e com a realização de eventos diversos."
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