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MÚSICA
Retrospectiva 2020: Consolidação digital, lives e álbuns da quarentena na música de Pernambuco
Publicado: 24/12/2020 às 10:51

JS, O Mão de Ouro produziu os maiores hits do carnaval, Priscila Senna brilhou com lives e Almério lançou álbum ao vivo e foi indicado ao Grammy Latino/Foto: Los Panchos, Sérgio Arruda e Juarez Ventura/Divulgação

"Somos o primeiro setor a parar e seremos o último a voltar". Essa foi uma das frases mais repetidas por artistas da música, um segmento que enfrentou o inesperado desafio da suspensão de shows por conta da pandemia. Foi um ano de reivindicações, em parte amenizadas pela conquista da Lei Aldir Blanc (com pagamento de auxílio emergencial a profissionais e instituições do ramo) e de muitas perdas. Tanto financeiras, com cancelamentos de concertos, festas populares (São João, ciclo natalino) e festivais (Rock in Rio, Lollapalooza, Coquetel Molotov, que fez edição virtual), que afetaram toda uma cadeia de produção, quanto de estrelas.
A Covid-19 causou a morte de diversas personalidades, como o próprio compositor Aldir Blanc, Paulinho (vocalista do Roupa Nova), o cantor pernambucano Louro Santos, além de Manu Dibango e Wallace Roney, ícones do jazz internacional. Por outras causas, perdemos gigantes da música brasileira como Moraes Moreira, Renato Barros, Vanusa e Riachão, e astros do rock mundial a exemplo de Van Halen, Little Richard e Neil Peart.
O ano também consolidou o digital. Como em outros ramos, destacaram-se aqueles que conseguiram expandir suas presenças no âmbito virtual, seja nas plataformas ou nas redes sociais, consolidando um importante passo para os caminhos do mercado nos próximos anos - o tão falado "novo normal". Um recente levantamento da Associação Brasileira da Música Independente revelou que foi observado um crescimento de até 30% de envios diários de músicas para o streaming. Também mostra que, das 200 canções brasileiras mais tocadas diariamente no Spotify, 53,52% são de selos independentes. Em Pernambuco, o brega e o brega-funk ainda são os gêneros que mais conseguem surfar nessa constante ascensão digital.
Ainda antes da pandemia chegar no país, o brega-funk foi o gênero mais tocado do Brasil no carnaval, de acordo com listas do Spotify e do YouTube, sobretudo com produções do recifense Jhonatan Ramos dos Santos, o JS, o Mão de Ouro - Surtada, com Dadá Boladão, e Sentadão, com Felipe Original, são algumas delas. JS foi convidado para elaborar remixes das sinfonias de Beethoven em uma ação de comemoração aos 250 anos do compositor, organizada pela Warner, selo que detém os direitos dos clássicos do alemão. No segundo semestre, no entanto, o furor nacional em torno do brega-funk deu uma certa arrefecida por causa de outra tendência nordestina: o piseiro, cujo destaque ficou com a dupla Os Barões da Pisadinha.
LIVES
Outro fenômeno do ano foram as lives, modelo usado desde Lia de Itamaracá até Geraldinho Lins. No estado, quem brilhou nesse formato e expandiu seu alcance foi Priscila Senna, nome também ligado ao brega - embora atualmente evite o rótulo do gênero por questões mercadológicas. A cantora, que começou o ano fazendo um inédito show no palco do Marco Zero, no carnaval, acumulou cerca de 1 milhão de acessos em seu primeiro ao vivo no YouTube, com 100 mil espectadores simultâneos. Esse êxito foi uma consequência da mudança de estratégia de sua carreira: com músicas de "sofrência", Priscila tenta dialogar cada vez mais com um universo que mescla sertanejo e arrocha - o baiano Tierry é um exemplo que tem feito muito sucesso nesse meio.
Embora essa guinada para estéticas mais "nacionais" parecesse ser uma tendência geral, quem prefere um brega romântico mais clássico ganhou uma nova esperança com a Banda Sentimentos, que emplacou o hit Onde estás já no final do ano, o que deu visibilidade para todo o seu repertório. A dupla VK Quebradeira e Anderson Neiff foram as revelações do brega-funk, conseguindo atingir adolescentes e crianças de várias capitais vizinhas do Recife com um efeito de "mania" semelhante ao que foi consagrado através de boy bands.
Um ano triste, mas rico em produções pernambucanas


Uma consequência do consumo pelas plataformas digitais é a perda da tradição do formato de álbum - artistas da música pop mais ligada a jovens, sobretudo da periferia, apostam cada vez mais em singles esporádicos. O coronavírus também fez muitos artistas adiarem os seus lançamentos. Em Pernambuco, no entanto, surgiram boas novidades.
Ainda antes da pandemia, tivemos o EP Atiça, da Banda Eddie, com um frevo de cunho social. Após quatro anos sem novidades de estúdio, a Academia da Berlinda lançou o álbum Descompondo o silêncio, dando continuidade à sua estética híbrida, que une surf music com influências afro-caribenhas, latinas e nordestinas, dessa vez com produção do renomado carioca Alexandre Kassin. Na seara dos "titãs" da música pernambucana, Geraldo Azevedo lançou o Arraiá para o São João. A lendária banda Ave Sangria lançou o seu primeiro clipe: Vendavais.
Quem movimentou mais a agenda de lançamentos de álbuns foi a turma ligada ao Reverbo, coletivo que reúne artistas ligados a uma sonoridade da MPB com elementos pernambucanos, tendo o multi-instrumentista Juliano Holanda como principal produtor. Alexandre Revoredo foi o primeiro, em abril, com um álbum intitulado com seu sobrenome. Natural de Garanhuns, ele trouxe uma sonoridade orgânica e composições que exaltam a sua verve poética. Um dos destaques nessa seara foi o álbum Estamos juntos, de Isabela Moraes, lançado em maio. A caruaruense já era conhecida como compositora e estreou mostrando uma voz forte.
Outro nome ligado ao Reverbo, PC Silva estreou com Amor, saudade e tempo, em julho, mesclando uma regionalidade contemporânea com a MPB e um toque de erudito. Almério lançou o bom Desempena ao vivo, com registro de show do álbum Desempena em 2018 no Teatro de Santa Isabel. Ele também concorreu ao Grammy Latino por Acaso casa ao vivo, gravado durante apresentação ao lado da baiana Mariene de Castro.
Outro destaque foi Bella Kahun, do selo de hip hop PE Squad, que apresentou Crua, que mescla R&B com MPB, brega, jazz e bolero. Juvenil Silva fez diferente: não lançou o EP Isolamento acústico no streaming. Era necessário entrar em contato com o artista pelas redes para comprar com valor colaborativo e receber o conteúdo por e-mail. Igor de Carvalho (EP Querido caos) e Luccas Maia (Barulho de mar) também lançaram álbuns.
Uma iniciativa nascida na pandemia foi o selo Boa Vista Jazz Records, com enfoque na produção de obras, pesquisa, catalogação e reflexão crítica do jazz em Pernambuco. Eles lançaram o álbum Mongiovi Trio, do projeto homônimo, e Summertime, da Contrabanda, o primeiro do gênero produzido no estado. Ainda sobre salvaguarda, Reginaldo Rossi foi considerado o Patrono do Brega pela Alepe e ganhará uma estátua no Pátio de Santa Cruz, no Centro, local de história boemia.
LUTO
Grandes perdas na música em 2020, por ordem cronológica
Neil Peart (baterista do Rush)
10/01, aos 67 anos, de câncer no cérebro
Luiz Vieira (cantor e compositor de PE)
16/01, aos 91 anos, de parada cardíaca
David Olney (cantor de folk)
20/01, aos 71, de parada cardíaca durante show
Tunai (cantor e compositor)
26/01, aos 69 anos, de parada cardíaca
Edwin de Olinda (percussionista de PE)
05/02, aos 51 anos, de insuficiência respiratória
Gláucio Lopes (cantor sertanejo)
26/02, aos 28 anos, de afogamento
Henrique (da dupla com Netto)
02/03, aos 22 anos, de traumatismo após acidente
Adelaide Chiozzo (cantora)
04/03, aos 88 anos, de infecção urinária e pulmonar
Kenny Rogers (ícone do country)
21/03, aos 81 anos, de causas naturais
Manu Dibango (ícone do jazz)
24/03, aos 86 anos, de Covid-19
Riachão (sambista)
30/03, aos 98 anos, de causas naturais
Wallace Roney (ícone do jazz)
01/04, anos 59 anos, de Covid-19
Ellis Marsalis (jazzista)
02/04, aos 85 anos, de Covid-19
Bucky Pizzarelli (guitarrista)
02/04, aos 94 anos, de Covid-19
Bill Withers (ícone do blues)
03/04, aos 81 anos, de complicações cardíacas
Devani Ferreira (Tantinho da Mangueira)
13/04, aos 72 anos, após queda
Moraes Moreira (cantor e compositor)
13/04, aos 72 anos, após infarto
Lee Konitz (saxofonista)
16/04, aos 92 anos, de Covid-19
Aldir Blanc (cantor e compositor)
04/05, aos 73 anos, de Covid-19
Ciro Pessoa (ex-Titãs)
05/05, aos 62 anos, de Covid-19
Florian Schneider (do Kraftwerk)
06/05/2020, aos 73 anos, de câncer
Little Richard (pioneiro do rock)
09/05, aos 87 anos, de câncer ósseo
Carlos José (cantor romântico)
09/05, aos 85 anos, de Covid-19
Fabiana Anastácio (cantora gospel)
04/06, aos 45 anos, de Covid-19
Ennio Morricone (compositor de trilhas)
06/07, aos 91 anos, após fraturar o fêmur
Pinto do Acordeon (músico)
21/07, aos 72 anos, de câncer
Peter Green (do Fleetwood Mac)
25/07, aos 73 anos, de causas naturais
Renato Barros (Renato e Seus Blue Caps)
28/07, aos 76 anos, de complicações cardíacas e pulmonares
Hugo Carranca (músico pernambucano)
17/08, aos 42 anos, de tumor cerebral
Jack Sherman (ex-Red Hot)
22/08, aos 64 anos, de infarto
Zuza Homem de Mello (escritor e pesquisador)
04/10, aos 87 anos, de infarto
Van Halen (músico)
06/10, aos 65 anos, de câncer na garganta
Mestre Chocho (referência no choro em PE)
22/10, aos 96 anos, de Covid-19
Vanusa (cantora)
08/11, aos 73 anos, de insuficiência respiratória
Louro Santos (cantor de PE)
23/11, aos 49 anos, de Covid-19
Paulinho (do Roupa Nova)
14/12, aos 68 anos, de Covid-19
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