Fotobiografia

Fotobiografia sobre dom Helder Camara é lançada no Recife

Publicado em: 28/08/2019 19:58 | Atualizado em: 28/08/2019 20:22

Em 1979, o dom com o então líder sindical Lula, Marisa e Sandro, um dos filhos do casal. Foto: Natanel Guedes/CPDOC JB
 
Um amplo mosaico visual. A expressão usada pelo designer Augusto Lins Soares define a obra que ele organizou, O santo revelado - Fotobiografia dom Helder Camara. Com lançamento nessa quarta-feira (28), no Palácio dos Manguinhos, mais do que traduzir em imagens a dimensão histórica do falecido arcebispo de Olinda e Recife, o livro descortina um homem de muitas faces. Quantos eram Helder? Para os que os rotulavam de “o bispo vermelho”, referência a seus posicionamentos políticos, surge um amante das artes. Aos que o enxergavam como somente um homem de pés nas comunidades pobres, apresenta-se alguém aberto ao diálogo político, econômico e eclesial.
 
Tal qual o mosaico, o dom Helder mostrado nas cerca de 200 fotografias é feito de pequenas peças. As imagens pinçadas pelo organizador enfatizam isso em uma lógica temática e não linear. Pela tradição, o início seria a cronologia da vida do religioso cearense (1909-1999), que comandou a arquidiocese local entre 1964 e 1985. Mas Augusto optou por começar pelo chão. Não um chão qualquer, o da Igreja das Fronteiras, com a sacristia, onde dom Helder morou de 1968 até o fim da vida, o terraço e a calçada do templo. E o que se vê é um chão de tons diferentes, porém amplo e que dialoga com a luz e o verde de portas, janelas e jardins. 
  
As fotos do dito “chão do dom” convidam para o mundo das páginas seguintes. E o que surge, além das necessárias páginas da biografia, são blocos de fotos reveladores da relação do arcebispo com o mundo e a família, com a juventude e o afeto, com a celebração e a cidadania. Por fim, frases do arcebispo e obras de arte inspiradas nele, um homem de várias famílias. Sua ideia de família ultrapassa os laços sanguíneos. Onde residiu, no Rio e no Recife, ele criou amizades. “O amigo verdadeiro muitas vezes discorda do amigo. Tenta ajudá-lo a ver claro”, disse. 
 
Chico Buarque cantou A Banda na casa do arcebispo. Foto: Sérgio Lobo/Acervo IDHEC
Além dos amigos, o arcebispo se encontrou, nas Fronteiras ou longe dela, com papas: João XXIII, Paulo VI e João Paulo II; líderes religiosos, como o budista Dalai Lama, o bispo anglicano Desmond Tutu e a freira Madre Teresa de Calcutá; presidentes da República, de Juscelino Kubitschek a generais da ditadura militar; artistas, incluindo Elis Regina, Luiz Gonzaga e Chico Buarque; e o então líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva, em 1979, ao lado da mulher, Marisa, e um filho, Sandro.
 
Folhear o livro, projeto do Instituto Dom Helder Camara (IDHeC) e da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), indica o quanto o arcebispo se preocupava com os pobres, embrenhando-se em ladeiras e lamaçais das comunidades. Nas páginas, estão fotos dele no Morro Azul, no Rio, em 1956, e no Morro da Conceição, no Recife, em 1968. A obra revela o olhar cuidadoso de dom Helder em relação à juventude, aos sem-teto, aos trabalhadores, aos doentes e à igreja da qual era bispo. Sobretudo, sintetiza o diretor-executivo do IDHeC, Antônio Carlos Maranhão de Aguiar, com os direitos humanos. “A luta dele por toda vida foi pelos direitos humanos em sua integralidade. Direitos que coloca acima de ideologias e partidos políticos”, afirmou.
 
Pela defesa dos mais pobres, dom Helder recebeu de João Paulo II, em 1980, quando o pontífice esteve no Recife, a saudação de “irmão dos pobres, meu irmão!”. A saudação se exprime bem na fotografia em que o papa abraça o arcebispo ao descer no aeroporto da capital. A foto consta entre as imagens conhecidas de dom Helder mundo afora. Mas existem imagens pouco vistas pelo grande público e pertencentes ao arquivo do IDHeC. É o caso de um registro de 1991 em que o então arcebispo emérito de Olinda e Recife, sentado, come de cabeça baixa, enquanto a televisão exibe George Bush, presidente dos EUA. Na parede, Jesus crucificado. Para ilustrar a foto, a frase: “Tenhamos sempre o cuidado de nos perguntar se alguém nos fala de violência: de que violência se trata? Da violência dos oprimidos ou da violência dos opressores?”. 
 
Já Gonzagão entoou Pense n'eu. "Seja sempre o rei, porque você é a alma do Nordeste", disse o dom ao músico. Foto: Acervo IDHEC
 
A ideia de publicar uma fotobiografia não se deu por acaso. O IDHeC possui um acervo de 150 mil páginas catalogadas e digitalizadas sobre dom Helder. Com essa dimensão, segundo o diretor do instituto, seria impossível falar do arcebispo somente com palavras. Às fotos, que ilustram da primeira à penúltima década do século 20, o projeto uniu palavras do próprio dom Helder, de jovens artistas, que produziram desenhos exclusivos ao livro, do cordelista Pablo José Borges, bem como dos escritores Leonardo Boff, Frei Betto e Marcelo Barros. Este, monge e teólogo, resume, colhendo do discurso de posse de dom Helder na arquidiocese local, o que seria o pastoreio do arcebispo e, de certo modo, o que se vê na fotobiografia: “Quem quer que esteja sofrendo no corpo e na alma, seja pobre ou rico, quem que esteja desesperado, terá lugar especial no coração do bispo.”
 
SERVIÇO
Lançamento do livro O santo revelado - Fotobiografia de dom Helder Camara
Quando: Quarta-feira (28), às 19h 
Onde: Palácio dos Manguinhos (Av. Rui Barbosa, s/n, Graças)
Editora: Cepe (191 páginas, R$ 100)
Vendas: nas livrarias da Cepe e no Idhec (Rua Henrique Dias, 278, Boa Vista, ao lado da Igreja das Fronteiras) 
Informações: 3231-5341 ou 3421-1076
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