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Guaiamum Treloso Rural une diferentes tribos com 13 horas de música

Cordel do Fogo Encantado, Baco Exu do Blues, Ave Sangria, Dadá Boladão e outras 16 atrações agitaram um público que transitou entre três palcos na paisagem verde de Aldeia, em Camaragibe

Publicado: 10/02/2019 às 19:31

Dadá Boladão, Baco Exu do Blues e Cordel do Fogo Encantado foram algumas dos destaques do evento. Foto: Marlon Diego/Divulgação/

Dadá Boladão, Baco Exu do Blues e Cordel do Fogo Encantado foram algumas dos destaques do evento. Foto: Marlon Diego/Divulgação/

Dadá Boladão, Baco Exu do Blues e Cordel do Fogo Encantado foram algumas dos destaques do evento. Foto: Marlon Diego/Divulgação
Indo rock psicodélico ao brega-funk, o Guaiamum Treloso Rural reuniu diversas tribos musicais neste sábado (9), com programação realizada na Fazenda Bem-Te-Vi, localizada no município de Camaragibe, no Grande Recife. Cordel do Fogo Encantado, Baco Exu do Blues, Ave Sangria, Dadá Boladão e outras 16 atrações agitaram um público que transitou entre três palcos e algumas intervenções espalhadas pela paisagem verde. Foram 13 horas de programação em uma localidade afastada do centro urbano, um conceito de evento que mimetiza o festival Woodstock, realizado no interior da Califórnia.
 
O espaço, melhor aproveitado e mais organizado que nas edições anteriores, foi equipado com diversos bares e uma extensa praça de alimentação. Para chegar até oo sítio, localizado no pacato bairro de Aldeia, o público teve a opção de pagar por com "transfers" locados pela organização. A grade de shows começou por volta das 14h30, com apresentações dos pernambucanos Kalouv e Fontes. Quem chegou antes do pôr do sol também conseguiu acompanhar My Magical Glowing Lens.

Marrakesh se apresenta no palco Devassa. Foto: Marlon Diego/Divulgação

O evento só começou a ganhar “tom” de festival durante o show do Jaloo, realizado durante o crepúsculo no palco Naná, intitulado em homenagem ao percussionista Naná Vasconcelos. Após estrear em Pernambuco durante o No Ar Coquetel Molotov de 2016, o paraense voltou ao estado com visual e repertório atualizado, a exemplo de Say goodbye e Cira, Regina e Nana. Também cantou faixas do álbum #1 (2016), como Chuva, Last dance e Insight. MC Tha, que havia sido anunciada como participação especial do show, conseguiu trazer ineditismo ao concerto, com destaque para a sensível performance do sucesso Céu azul. A dupla mostrou muito entrosamento no palco, chegando a pular nos braços do público.

No palco Devassa, a carioca Ana Frango Elétrico conseguiu capturar a atenção dos presentes com seus vocais agudos e irreverentes. Apresentou canções do disco Mormaço queima (2018), conhecido por mesclar rock setentista, punk e pop. Apesar dessa "aura de novidade", o ápice foi durante a participação de Duda Beat - uma artista que, ironicamente, já fez três shows em festivais de destaque no estado só no últimos semestre. Elas cantaram Lança perfume, de Rita Lee, e sucessos da pernambucana radicada no Rio, como Bédi beat e Bixinho.

Já era noite quando Ave Sangria subiu no palco Naná, por volta das 19h. A banda clássica do rock psicodélico se deparou com um público predominantemente de jovens, apesar do único disco da banda ter sido lançado há mais de 40 anos. "A gente nem imaginava que iria voltar. Voltamos graças à internet, pois foi um público jovem nos conheceu e gostou do som”, afirmou Marco Polo, vocalista do grupo. A banda apresentou Seu Waldir, Geórgia, a carniceira, entre outras faixas do álbum de 1975. Também adiantou algumas novidades de Vendavais, novo álbum que será lançado em abril deste ano.

Marco Polo, vocalista do Ave Sangria. Foto: Marlon Diego/Divulgação

Às 21h10, o rapper carioca BK mudou a atmosfera do Devassa. Os admiradores da cultura hip hop chegaram ao ambiente para prestigiar canções do elogiado álbum Gigantes (2018). Antes de começar o show, o artista fez questão de mencionar tragédias recentes do Rio de Janeiro: o incêndio no Centro de Treinamento do Flamengo e o assassinato de 13 jovens nas favelas de Santa Teresa e Catumbi. "Vamos usar esse show para mandar energia para ad famíliad dessas pessoas", pediu o rapper. Com mensagens de empoderamento negro, críticas ao racismo e a desigualdade social, o rapper conseguiu conduzir em uma “rodinha punk” incansável na frente do palco - teve seu apogeu nas faixas Porcentos, Jovens e Vivos.

Rapper BK. Foto: Marlon Diego/Divulgação

Em seguida, a maior parte do público presente migrou para o palco Devassa para prestigiar Dadá Boladão, a primeira atração de brega-funk da história do Guaiamum Treloso. O show contou com uma linguagem demasiadamente pop, principalmente com uma abertura em que os dançarinos uniformizados coreografavam instrumentais eletrônicos. Em seguida, o MC iniciou o show com o sucesso De ladin. "Me sinto muito grato por estar fazendo parte desse evento, por estar representando o brega-funk, que tem rompido muitas barreiras", disse.

O público vibrou com sucessos como Revoltada e Menina da quadrilha, mas não correspondeu tanto quando o artista tentou cantar músicas mais acústicas de seu novo repertório (será lançado antes do carnaval de 2019). Quando notava que não havia comoção, ele partia para sucessos de outros MCs, como Shevchenko e Elloco e Vitinho Polêmico - sensações do atual fenômeno “passinho dos malokas”. No geral, o público pareceu satisfeito, com exceção para uma faixa de trap que, além de não agradar, soou bastante desconexa do contexto do show.

Cordel do Fogo Encantado subiu no palco Naná por volta das 23h20, trazendo seus traços artísticos de sempre: teatralidade, poesia e cosmopolitismo estético entre rock e manifestações populares locais. O grupo tocou músicas de Viagem ao Coração do sol (2018), mas não deixou de lado as antigas Oim do meu amor, Pedrinha e Chover (Ou invocação para um dia líquido), cantada por Lirinha exatamente no momento em que uma chuva começou a cair na fazenda, como se o vocalista brincasse com a mística na natureza. A cantora Isadora Melo também participou do show. 

Cordel do Fogo Encantado. Foto: Marlon Diego/Divulgação

Uma das atrações mais aguardadas, Baco Exu do Blues certamente teve o show com o maior número de pessoas. Sua entrada foi triunfal, com um impactante monólogo do álbum Bluesman (2018), recitado junto com imagens de negros reconhecidos pelo ativismo contra o racismo. Ele pediu desculpas por não ter conseguido cantar no show do ano anterior. "Após usar umas substâncias ‘muito loucas’, subi no palco dando um grito e a minha corda vocal estourou. Não foi culpa minha", explicou, sendo ovacionado.

De fato, o baiano conseguiu sua redenção. Apresentou êxitos de Esú (2017), como Te amo disgraça, além dos atuais sucessos de Bluesman, com destaque para Me desculpa Jay-Z e Flamingos. Apesar de “estar com voz” dessa vez, era comum que Baco dispensse as rimas (não tão entendíveis quanto nas versões de estúdio) para deixar o público cantar. No mérito dos "vocais", o destaque ficou mesmo para a cantora 1LUM3, que faz parte da Facção Carinhosa (nome da produtora do rapper).

Mc Carol. Foto: Marlon Diego/Divulgação

Muita gente foi em direção aos "transfers" locados pelo evento logo após o show de Baco, mas também houve quem ficou para ver MC Carol de Niterói. A carioca começou o show com Não foi Cabral e seguiu com sucessos como Liga pra SAMU e Bateu uma onda forte. A ideia da curadoria certamente foi encerrar a programação dos palcos com uma atração dançante que colocasse o público “para cima”, mas não foi bem o que aconteceu. Em um certo momento, a funkeira interrompeu o show devido ao desmaio de um rapaz na plateia. No entanto, prolongou a pausa por cerca de cinco minutos, causando um certo estranhamento no ambiente.

O estilo de show de Carol, sucesso na periferia do Rio de Janeiro, pareceu não causar tanta comoção em um público formado majoritariamente por pessoas da classe média pernambucana. Por cerca de 30 minutos, a artista foi contemplada como uma figura "exótica”. Os menos conhecedores do repertório também não esperavam canções de sonoridades pesadas, a exemplo de Delação premiada.

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