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'Quem polariza a política é imaturo', diz Pondé, que faz palestra no Recife. Confira a entrevista

Filósofo pernambucano aborda os malefícios da 'felicidade a qualquer custo' no Teatro RioMar

Publicado em: 07/11/2018 16:24 | Atualizado em: 03/05/2020 13:53

O intelectual já escreveu 15 livros, com destaque para o best seller Guia politicamente incorreto da Filosofia (2012). (Foto: Facebook/Reprodução)
O intelectual já escreveu 15 livros, com destaque para o best seller Guia politicamente incorreto da Filosofia (2012). (Foto: Facebook/Reprodução)

Se o senso comum afirma que a busca interminável pela felicidade é a saída para se ter uma vida satisfatória, Luiz Felipe Pondé argumenta que não é bem por aí. Para o filósofo, doutor e professor recifense, a obsessão por ser feliz seria, na verdade, uma das maiores razões para a infelicidade. Esse é a principal premissa da palestra inédita Felicidade a qualquer custo, realizada nesta quarta-feira (7) no Teatro RioMar, Zona Sul do Recife, às 20h30.

"Não se trata de uma palestra motivacional, mas sim uma crítica à obsessão pela felicidade. Já tratei desse tema em livros e na coluna na Folha de São Paulo. É um assunto que dá muito entorno, pois as pessoas costumam se posicionar durante a palestra", explica Pondé, em entrevista ao Viver.

Durante sua carreira, o intelectual já escreveu 15 livros, com destaque para o best seller Guia politicamente incorreto da Filosofia (2012). A obra foi o pontapé para uma série de publicações de sucesso, como A era do ressentimento (2014) e Filosofia para corajosos (2016). Neste ano, lançou Espiritualidade para corajosos (2018), que também traz certo panorama pela busca do sentido da vida. 

No âmbito acadêmico, Pondé é conhecido por se basear em um certo tipo de pessimismo e no combate ao pensamento politicamente correto nos meios universitários. Formado em filosofia pela Universidade de São Paulo (USP), atualmente é professor de Ciências da Religião na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e de filosofia na FAAP. Também mantém uma coluna na Folha de São Paulo e um canal no YouTube que agrega 500 mil inscritos.

Entrevista - Luiz Felipe Pondé, filósofo

Por que acredita que a obsessão pela felicidade pode trazer a infelicidade?
Esse é o fio condutor geral da palestra. Trato do ponto de vista histórico da ideia de felicidade e mostro que, hoje, ela é basicamente associada a três coisas: ao consumo, busca de autoestima e de saúde. Se a gente for buscar na filosofia algumas compressões de felicidade ao longo do tempo, você vai encontrar várias compreensões. Entrando nesse mérito, me parece que no mundo contemporâneo a felicidade está associada ao desejo. Aquilo é normal ou banal se torna um imperativo. Você tem que realizar seu desejo o tempo todo. Ser feliz não se trata de fazer um culto da felicidade e esse imperativo de que você tem que ser feliz o tempo todo nos atinge sociologicamente e biologicamente. 

Nesse ano você lançou o livro Espiritualidade para corajosos. A palestra sobre felicidade em algum momento aborda sobre esse tema?
Sempre entro no assunto da espiritualidade, sobretudo na contemporânea, que é uma das áreas em que a felicidade está mais presente. A espiritualidade contemporânea é muito narcisista. Existem uma desconstrução do que a sociedade sempre pregou muito. Você olha a história e vê que a espiritualidade sempre teve o objetivo de expurgar demônios. Hoje em dia ela nega que os demônios existem e foca nessas três instâncias que citei anteriormente. É como se elas tivessem responsabilidade com tudo o que existe.

Hoje temos o fator das redes sociais, ambientes em que as pessoas parecem mostrar felicidade o tempo todo. Acha que isso seja um obstáculo?
A mídia social é uma variável que causa ansiedade entre os jovens que nasceram a partir de 1995. Isso está inscrito em pesquisas cientificas de comportamento. Antes, você tinha que agradar 30 pessoas. Agora, você precisa de 30 mil para sentir que existe. Essa disposição de projetar a si mesmo através da mídia social tem relação direta com felicidade e ansiedade, principalmente no Facebook e Instagram, em que você acaba tendo que ser alguém que gostaria de ser.

Saímos de uma eleição bastante conturbada. Independente de qual fosse o resultado, uma parcela da sociedade iria se mostrar inconformada. Concorda que esse ambiente político intenso pode influenciar na sensação de felicidade? 
Sim. Essa relação de expectativa entre salvação e política é uma constante que existe desde o final da Revolução Francesa. Grande parte da filosofia política é quase que uma busca por autoestima. Sendo mais preciso, eu não tenho dúvidas de que a polarização aumenta a tendência de que a felicidade só existe se o seu candidato ganhar. No caso, ganhou o Bolsonaro e o grupo associado ao Haddad está em uma viagem mental quase que apocalíptica. Aconteceria o mesmo com o outro grupo se fosse o contrário. Os resultados finais da polarização são assim, trazem sensações de felicidade e infelicidade. A turma do Bolsonaro comemora hoje, mas pode entrar em um processo emocional negativo na medida em que a lua de mel com o candidato for acabando. E sempre acaba.

A melhora desse quadro seria apenas com o fim da polarização?
O fim da polarização seria ideal para amenizar essas discussões emocionais, mas isso demanda uma maturidade que não temos. Normalmente quem polariza a política é imaturo. No ambiente das redes sociais, as discussões políticas são praticamente para destruir a persona do outro. Isso explicitou que quase todo mundo é militante político, com comportamentos de fundo já identificados. Se tornou epidêmico, ainda mais na situação em que o Brasil se encontra: desencantado com o PT, que já foi o partido da salvação nacional. Foi essa orfandade que fez surgir essa parte conservadora que encontrou um candidato que conseguiu ganhar a eleição.

Então podemos dizer que as mídias sociais conseguiram, de certa forma, fragilizar a democracia?
A mídia institucional sempre teve filtros, mas as mídias sociais fizeram as pessoas “chutarem o balde” nesse sentido. Trouxeram à tona o risco de uma “bossalidade” de soberania popular, mas com um certo pensamento mítico. As redes sociais estão causando um transtorno, todo mundo sabe disso. Se vai destruir a democracia, ainda não. Existe um processo de acomodação. Agora, são poucos os que estão sabendo lidar com isso. É a mesma coisa que o transtorno que está havendo com a forma de negócio da mídia, por exemplo. Mas em algum momento a democracia vai ter de se acomodar com essa situação. 

SERVIÇO
Luiz Felipe Pondé na palestra Felicidade a qualquer custo
Onde: Teatro RioMar (Avenida República do Líbano, 251, 4º piso, RioMar Shopping)
Quando: nesta quarta-feira (7), às 20h30
Quanto: R$ 120 (plateia), R$ 60 (meia), R$ 100 (balcão) e R$ 50 (meia), à venda na Ticketfolia, na bilheteria do Teatro Guararapes e no site www.eventim.com.br.
Informações: www.teatroriomarrecife.com.br 
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