Cinema

Crítica: Alfa erra ao fazer drama de cachorro com ambientação pré-histórica

Filme tem premissa interessante mas não desenvolve bem a trama

Publicado em: 05/09/2018 14:45 | Atualizado em: 05/09/2018 14:46

Filme chega às salas do estado apenas na versão dublada em português. Foto: Sony Pictures/Divulgação

O cinema tem um bom número de histórias sobre a relação entre homem e cachorro. Alfa, em cartaz a partir de quinta-feira, é mais uma desse filão. Mas se o mote não é original, o pano de fundo foge um bocado do convencional e traz uma ambientação, no geral, pouco vista nas telas: a pré-história. E o canino que dá título ao longa-metragem não é propriamente um cão, mas um lobo.

Ambientado no continente europeu por volta de 20 mil anos atrás, a produção tem como protagonista Keda (Kodi Smit-McPhee), adolescente de uma tribo que acaba por se perder do grupo durante uma caçada. Sozinho e ferido, ele é atacado por uma alcateia e consegue ferir um dos lobos. Após os animais se dispersarem, Keda decide cuidar do bicho machucado e o leva consigo. Juntos, os dois tentam sobreviver em um cenário inóspito, no rigoroso frio da Era do Gelo. Em suma, Alfa é uma espécie de fábula sobre como teria se dado o processo de domesticação de lobos, os ancestrais dos cachorros.

Marcada inicialmente pela rudeza e desconfiança de ambas as partes, a relação entre o homem e o bicho sai da estranheza mútua e passa a ter contornos de respeito, interdependência e afeto. Não acontece muita coisa além do que está descrito na sinopse. Há alguma ação na primeira meia hora do filme e uma ou outra situação de perigo ou drama mais intenso. É uma interessante narrativa de sobrevivência, em um cenário bonito e contexto pouco usual, mas que não chega, em nenhum momento, a se sobressair.

A versão dublada em português, único formato que chegará às salas do Recife, atrapalha. Em primeiro lugar, porque anula todo o trabalho de pesquisa feito na construção da linguagem ficcional utilizada para o filme. Para tornar mais crível a interação entre os integrantes da tribo, a produção contou com o suporte da linguista e antropóloga Christine Schreyer, da Universidade da Colúmbia Britânica, que desenvolveu, ao longo de dois anos, um vocabulário com inspiração no que poderiam ter sido as protolinguagens de 20 mil anos atrás. Além de representar a perda desse conteúdo, a versão nacional incomoda em diversos trechos, com entonações que não casam bem com as situações.

Fica a sensação de que os dubladores fizeram o trabalho apenas a partir do texto dos diálogos, sem ter acesso ao filme. Ou, simplesmente, faltou boa direção nesse processo. O problema fica mais evidente no primeiro terço do filme, que tem mais diálogos. Como boa parte da narrativa se dá entre o ator e o lobo, as falas são curtas e espaçadas.

Não é um filme particularmente brilhante, mas tem seus bons momentos e é plasticamente bonito. A performance do cão utilizado em tela é um aspecto que impressiona e, sem dúvida, um ponto positivo. Mas, considerando que o filme, inevitavelmente, toca em questões sobre compaixão para com animais e respeito a outras espécies, talvez fosse adequado o uso de um lobo feito em computação gráfica. Afinal, a rotina extenuante de treinos e filmagens parece uma exploração desnecessária, ainda mais considerando o estado atual da tecnologia.
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