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Museu resgata memória abolicionista de Pernambuco em exposição

Sobrado Grande da Madalena foi local de resistência no século dezessete durante invasões holandesas

Publicado em: 05/06/2018 11:28 | Atualizado em: 05/06/2018 12:03

Casarão ladeado de azulejos tricentenários era referência para quem ia para o interior da capitania pernambucana. Foto: Thalyta Tavares/Esp DP

Local de resistência no século 17 durante as invasões holandesas, o Sobrado Grande da Madalena ainda conserva seus valores históricos. Ali, onde foi instalada estância fortificada, resiste o espírito da luta negra, com a transformação do espaço no Museu da Abolição. Ao ressignificar a memória daqueles que há 130 anos foram vendidos como mercadoria por conta da cor da pele, o Sobrado mantem a herança deixada pelo seu antigo dono, o abolicionista João Alfredo Corrêa de Oliveira.

No trecho antes chamado de "Passagem da Madalena", onde hoje fica a rua Benfica, o casarão ladeado de azulejos tricentenários servia de referência para quem seguia pela estrada Real com destino ao interior da capitania pernambucana. Museu que lá funciona desde 1983 propõe uma volta ao passado e uma pausa para reflexão em meio à frenética movimentação do trânsito intenso da região.

Embora a proposta de criação do MAB tenha surgido na década de 50, somente mais de 30 anos depois a inauguração ocorreu oficialmente. O objetivo era justamente honrar os abolicionistas João Alfredo e Joaquim Nabuco. Em 1957 o então presidente Juscelino Kubitschek criou o Museu da Abolição. Somente na década de 60 que a Câmara de Vereadores do Recife aprovou o Projeto de Lei determinando a desapropriação do Palacete da Madalena. A partir de então, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Ipahn) passou a manter o espaço. Seis anos depois, o prédio foi tombado pelo órgão.

As obras estruturais para abrigar o Museu se arrastaram por sete anos, sendo concluídas somente em 1975. A inauguração oficial só aconteceu no dia 13 de maio de 1983. Por falta de orçamento, as visitações ao MAB foram suspensas duas vezes. A primeira aconteceu em 1990 e a segunda em 2005, esta última vez por falta de condições de trabalho. Até hoje, os funcionários lamentam que as obras que preveem a instalação de iluminação e climatização adequadas para preservação das peças não tenham sido concluídas.

“A gente aguarda a reforma e o restauro para que possamos oferecer espaços mais adequados, inclusive para fazer a proteção do patrimônio que está guardado, porque sem uma infraestrutura adequada a instituição sofre para realizar tudo aquilo que está definido no plano museológico”, defende a museóloga que trabalha no MAB, Daiane Carvalho.

O térreo do prédio tem 13 ambientes e um amplo jardim interno nos fundos. O primeiro andar é dividido em 12 ambientes. Já na área externa da sede do MAB fica um teatro de arena, onde acontecem atividades artísticas e culturais. O Museu mantém uma média de visitação de 8 mil pessoas ao ano. O principal público são grupos escolares. A maior parte das 230 peças à mostra e das 400 fotografias que compõem o acervo foram doação da Receita Federal, após apreensões feitas nos aeroportos de várias cidades do Brasil. 

Atualmente o MAB é administrado pelo Instituto Brasileiro de Museus, vinculado ao Ministério da Cultura, o que faz dele um museu federal. “A importância do Museu da Abolição também se dá em virtude de ser o único museu público/federal a tratar da temática e fazer esse resgate da memória, da história, da contribuição dos valores artísticos, culturais, sociais, políticos do povo afrodescendente para a formação da cultura nacional”, destaca a diretora do Museu da Abolição, Maria Elisabete Arruda.

Três exposições ocupam os dois andares do prédio. Logo na entrada, o público encontra reproduções holográficas de peças que foram confiscadas dos povos de terreiro durante as perseguições às religiões de matriz africana ocorridas em 1930. A experiência ainda conta com um museu afrodigital, em que é possível ver detalhes de cada peça através de um totem instalado na primeira sala. Durante a visita à exposição “Repatriação Digital do Acervo Confiscado de Terreiros”, é possível ouvir áudios originais gravados em vinil nos terreiros de Xambá e Pai Adão, no século passado.

Um acervo fotográfico e 14 reproduções das gravuras de Jean-Baptiste Debret do livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil estão expostas no primeiro andar do MAB levantando a discussão: “130 Anos: Abolição?”. As gravuras comparam a situação em que os escravos estavam submetidos com os registros atuais de negros em situação de pobreza.

Além das imagens, o visitante ainda encontra objetos de tortura, utilizados no período da escravidão, que fazem parte da coleção inicial do Museu, como o Vira Mundo, que prendia as mãos e pernas dos escravos castigados. “Esta exposição cumpre o seu papel social e institucional de levar à reflexão e ao pensamento crítico quanto ao tema abolição, fortalecendo a identidade do povo afro-brasileiro”, afirma Maria Elisabete. 

A visitação ao Museu da Abolição pode ser feita de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h, e aos sábados, das 13h às 17h. O visitante pode conhecer o museu por conta própria ou solicitar o acompanhamento de um dos nossos mediadores. A entrada no Museu (Rua Benfica, 1150) é gratuita.
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