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Livro de Gustavo Maia Gomes mescla relatos familiares e fatos históricos para mostrar transição do engenho à usina

Obra que transita entre história, registro socioeconômico e memórias familiares será lançado nesta terça-feira na Livraria Jaqueira

Publicado em: 03/06/2018 14:16 | Atualizado em: 03/06/2018 15:34

Escritor planeja produzir outra obra abrangendo um período posterior, dos anos 1960 à atualidade. Foto: Thalyta Tavares/Esp DP


Inevitavelmente, os engenhos e usinas de açúcar fazem parte da formação do Nordeste de hoje. Parte dessa história é resgatada pelo economista Gustavo Maia Gomes no livro O trem para Branquinha – Dos engenhos às usinas de açúcar no Nordeste Oriental: histórias familiares (1796-1966) (Cepe, 564 páginas, R$ 60). No livro, que será lançado na terça-feira (5), na Livraria Jaqueira (Rua Antenor Navarro, 138, Jaqueira), o autor mescla narrativas familiares e fatos históricos a respeito do passado açucareiro da região.

A proposta de produzir um livro que transita entre história, registro socioeconômico e memórias familiares tem relação com o achado de dois registros antigos da família. O primeiro, um documento com informações sobre os primeiros anos de funcionamento da Usina Campo Verde, em Branquinha, Alagoas. “Era o relatório de um dos proprietários para seus irmãos, por ocasião da morte da mãe deles”, diz sobre as anotações, que fazem o inventário das propriedades da família, do lado paterno do escritor.

“Em adição a isso, consegui acesso a uma memória familiar com enfoque intimista”, diz sobre as anotações da sua tia, Heloísa Pedrosa, que fez uma série de registros sobre histórias que ela ouvia sobre parentes. “Esse documento é pessoal, das impressões dela sobre o mundo ao seu redor”, explica. Esses e outros documentos históricos, como jornais da época, fizeram parte da pesquisa para a produção do livro, que durou cerca de dois anos e incluiu, ainda, visitas de campo aos locais onde funcionavam os engenhos e usinas.  

“É uma tentativa de ver a história da cana-de-açúcar, sobretudo das cidades do Nordeste, sendo contada, vivida e produzida por pessoas que fizeram essa história”, sintetiza o economista a respeito da obra, que traz como protagonistas seus antepassados, proprietários de engenhos, fazendas de cana e usinas. A jornada abarcada pelo livro tem início em 1796, a data de nascimento estimada do parente mais remoto localizado pelo autor. Mas o principal ponto de partida é o nascimento da trisavó materna, Maria Madalena da Silva (1811-1899).

O período analisado no volume encerra-se em 1966, ano da morte de Nonimando Maia Gomes, avô paterno. “É extremamente difícil precisar datas para períodos”, ressalta destacando que os anos citados servem mais como marcos de referência. Esse período complexo de estimar, no caso, é a transição do modelo adotado nos engenhos para o baseado nas usinas. Essa mudança, explica o economista, tem impacto além da escala da produção. “Houve, sobretudo, uma mudança em toda sociedade, em todo o aparato social, nos costumes, nas relações sociais, um ponto que Gilberto Freyre enfatizou à larga em vários de seus livros”, afirma. Na avaliação dele, O trem para Branquinha tem “um certo sabor gilbertiano”. Sônia Freyre Pimentel, filha do autor de Casa-grande & senzala e presidente da Fundação Gilberto Freyre, aliás, assina o prefácio do livro.   

Uma dos aspectos mais evidentes dessa transição tem relação com o fim da escravidão, medida que encontrou opositores. “Havia uma resistência, sim, e a abolição da escravidão, da forma como ocorreu, constituiu um choque para os engenhos”, explica, fazendo a ressalva de que esse não é um tópico aprofundado no livro. “Do ponto de vista estritamente econômico”, diz o estudioso, essa mudança foi abrupta pela falta de medidas compensatórias.“Tanto os produtores de cana quanto a mão de obra se viram lançados em uma nova situação, sem que tivessem tido as condições de se adaptar adequadamente a elas”, opina.  “Os ex-escravos foram lançados na rua, sem nenhum projeto, por exemplo, de fornecimento de terras ou de qualificação para que começassem a ocupar postos de trabalho urbanos”, acrescenta.

Mais do que um produto, a cana-de-açúcar era a base da economia desta faixa do Nordeste. “Ainda hoje, a cana e os seus derivados, açúcar e álcool, têm importância para Alagoas. Para Pernambuco, menos. Na fase que o livro se concentra, a cana era praticamente tudo da economia; se ela parasse, tudo desmoronava junto. Mais ou menos como agora, quando os caminhões param, afetam a economia toda”, compara.   

O autor considera positivo o fato de, hoje, a cana-de-açúcar já não ter mais a mesma importância para a economia. “Perdeu relevância, ainda bem, isso significa que a economia foi se diversificando, se tornando mais complexa, produzindo mais riqueza, tem uma base produtiva muito mais diversificada”. Em tempo: Gustavo Maia Gomes planeja fazer uma outra obra abordando o tema, mas abrangendo o período posterior, dos anos 1960 até a atualidade.
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