Música

'Falo para o jovem, tenha ele 8 ou 80 anos', diz Elza Soares ao lançar Deus é Mulher

Cantora aborda machismo, negritude, apropriação cultural e empoderamento feminino em novo disco

Publicado em: 28/05/2018 14:50

Elza afirma que álbum não é uma continuação do trabalho anterior. Foto: Daryan Dornelles/Divulgação

"Acredito tanto em Deus, que acho que ele é uma mulher", disparou a cantora Elza Soares, durante as gravações de Deus é mulher, 33º álbum de sua carreira, lançado há dez dias pela gravadora Deck. Com 11 faixas inéditas que provocam reflexões acerca do momento político e social do Brasil, o disco tem direção musical de Guilherme Kastrup e coprodução de Romulo Fróes, Marcelo Cabral (baixo e bass synth), Rodrigo Campos (cavaquinho e guitarra) e Kiko Dinucci (guitarra, sintetizador e sampler), que também foram responsáveis pelo trabalho anterior da artista, A mulher do fim do mundo (2015). 

Em Deus é mulher, a presença feminina tem mais força do que no álbum lançado há três anos. A carioca convidou Mariá Portugal (que compôs Um olho aberto e assumiu bateria, percussão e MPC), Maria Beraldo (clarinete e clarone), o bloco afro de mulheres Ilú Obá De Min (na faixa Banho, escrita por Tulipa Ruiz) e Alice Coutinho (que assina as composições de Eu quero comer você e Língua solta, ao lado de Fróes). Douglas Germano, Kiko Dinucci, Edgar, Clima, Rodrigo Campos, Pedro Loureiro, Luciano Mello e Pedro Luiz completam o time de compositores. 

Em entrevista ao Viver, Elza afirma que o álbum passa uma mensagem de que "Deus é uma energia feminina que gera a vida e exala o amor". "Eu falo sobre essa energia vital que sofreu tanto abuso, tanta opressão, tanto preconceito e, no fim das contas, é responsável pelo amor e por carregar cada um de nós no ventre. No disco, eu extrapolo esse assunto ao gritar que já passou da hora de renovarmos esse mundo cão em que vivemos", explica. Machismo, negritude, apropriação cultural e empoderamento feminino são alguns dos assuntos explorados nos dois últimos álbuns da cantora, que não considera esses temas tabus. "Ninguém tem que dosar o que sente, o que pensa e o que fala. Calar é forma de controlar. Dizer que é tabu é só uma maneira de embalar a censura", declara. 

Ao ser questionada se o disco Deus é mulher pode ser considerado uma continuação de A mulher do fim do mundo, Elza é categórica: "Não continua nada. Cada um faz o seu papel. São temas urgentes, mensagens importantes, mas cada um em seu momento". Além das plataformas digitais, o lançamento ocorreu em mais três formatos: CD, vinil e fita cassete.

Entrevista Elza Soares // cantora

Você acredita que seu público rejuvenesceu com o último trabalho?
Sim. Quem se sentia velho também rejuvenesceu. O Brasil tem essa coisa de idade e faixa etária, mas eu nem penso nisso. Falo para o jovem, tenha ele 8 ou 80 anos. Esse jovem que não depende da idade, que está antenado ao novo e de novidade meus dois últimos discos entendem bem.

No início da carreira, você foi vítima de preconceito por ser uma mulher apostando na música?
Muito, cara, muito. Mas não quero falar de passado. Já chega. My name is now e agora quem vier com preconceito velado para o meu lado sairá com o rabo entre as pernas. Aliás, quem sabe assim esses preconceituosos não sentirão algum tipo de prazer também.

Na música Banho você faz metáforas com a sexualidade feminina. Recentemente, uma cantora pernambucana teve seu videoclipe bloqueado no YouTube por abordar o mesmo tema e mostrar, sem nudez, imagens de mulheres se masturbando. Qual o seu posicionamento diante das censuras das redes sociais?
Censura mata, oprime e cala em qualquer meio de comunicação. As mulheres não se masturbam? Quanta incoerência. Se todos temos o direito ao prazer e podemos explorar nosso corpo como bem quisermos, por que isso deve ser censurado? Por que não podemos falar disso abertamente? Coisa velada, chata, sem sentido. O prazer é fisiológico e ninguém escapa dele, nem mesmo esses que denunciaram o vídeo dela.

A nova versão do clipe A carne abordou a questão racial no Brasil e foi totalmente protagonizada por negros. Há duas semanas, a Rede Globo lançou uma novela ambientada na Bahia (onde 80% da população é afrodescendente), mas que não possui atores negros no núcleo principal. Você tem algo a dizer sobre este assunto que tanto repercutiu na internet?
Eu não posso julgar o trabalho ou os critérios de ninguém. No meu sempre vai ter negro, mulher, homem, gay, trans, pardo, amarelo, loiro, branco e toda sorte de diversidade que o brasileiro carrega no DNA. Gosto de ver nossos negros na sinfônica, nas novelas, nos filmes, nas faculdades, nos cargos de poder... Posso dizer que eu, mulher, negra, consegui estar presente nesses lugares.

Ouça o disco Deus é mulher:

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