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Apesar da falta de oportunidades, mulheres mostram resistência e talento na discotecagem

Oficina gratuita para garotas que querem ser DJs ocorre neste sábado com atração internacional

Publicado em: 07/04/2018 09:30

As DJs Nat P., Pax e Nadejda mostram como lutam e vencem as barreiras na música. Foto: Shilton Araujo/Esp.DP


Dados da Brazil Music Conference (BRMC) - conferência que reúne o mercado da música eletrônica e entretenimento da América Latina - revelam que somente 1,7% das DJs atuantes são mulheres, enquanto 98,3% são homens. Ao traduzir essas porcentagens em números, um ranking da revista britânica DJ Mag mostra que de cem artistas comandando as pickups, apenas quatro representam o time feminino. Apesar desses números alarmantes, cada vez mais as mulheres estão conquistando espaço em um cenário composto majoritariamente por homens: a música. A DJ brasileira ANNA é um bom exemplo disso. Ela foi a primeira mulher a levar o prêmio de Melhor DJ Underground da Rio Music Conference e tem se firmado com consistência dentre os grandes expoentes da música eletrônica mundial. Além dela, nomes nacionais como Mara Bruiser, Eli Iwasa e Ingrid já chegaram a integrar a lista publicada pelo site SheJay, que nomeou as “melhores DJs do mundo”.

DJ Pax: 'É fundamental que conheçamos a história da música eletrônica em nosso estado e que saibamos que aqui existem mulheres que estão na resistência, que atuam no mercado há muitos anos e que merecem apoio e oportunidades'. Foto: Shilton Araujo/Esp.DP


Na noite pernambucana não é diferente. Profissionais femininas estão mostrando que o talento com a discotecagem não pertence somente aos homens. A DJ Pax, residente do Clube Metrópole, começou no mundo da mixagem há 14 anos e sempre observou uma preferência pelos artistas do sexo masculino. “A discriminação é sentida na vivência, nas contratações, nas tentativas, nas conversas, nas negociações, nas articulações e, notoriamente, como resultado óbvio: nos line-ups”, conta. Para Pax, o nível de dificuldade para as mulheres terem acesso ao mercado da música continua. “Não ocupamos nossos espaços porque nossas oportunidades não são proporcionais ao nosso talento. E, na maioria dos casos, quando estamos na cena é porque nossa competência é maior que o desdém”, diz. Ela ainda salienta a desvalorização profissional, sobretudo, para as mulheres. “Temos que criar festas 'de mulheres' para curtir 'na paz' o som que garotas fazem e por isso somos desqualificadas. A maioria nem cachê ganha. E, quando ganha, é quase sempre menor ao de uma estrela da sua relevância midiática”, completa.

DJ Nat P.: 'Não existe mais profissão de homem e profissão de mulher. Se é isso que você curte, vá em frente, porque é de meninas assim que precisamos para evoluir e conquistar nosso lugar'. Foto: Shilton Araujo/Esp.DP


Nat P. é outra DJ do estado que luta para mostrar o seu trabalho sem distinção. “Cresci vendo apenas DJs homens fazerem sucesso. Entretanto, nos dias de hoje já é mais comum vermos mulheres nesse cenário. Acredito que ainda há um grande caminho a ser percorrido, mas isso não me desanima. Conheço várias meninas que são muito boas, e sei que juntas podemos mostrar para a sociedade que existem mulheres igualmente capazes de comandar as pickups”, conta Nat.

Conhecida por tocar ritmos como o funk e o brega - com algumas letras de cunho machista -, Natália conta que a discriminação parte dos colegas de carreira e, até mesmo, do público das casas noturnas. “Além de existir o preconceito por achar que uma DJ mulher pode não ser tão boa quanto um DJ homem, existe uma anormalidade em ter uma mulher comandando a pista de uma festa. E ainda existem os julgamentos machistas para quem trabalha com o mesmo estilo musical que eu”, finaliza.

DJ Nadejda: 'Muitas mulheres são convidadas para tocar em horários com pouco público ou recebem menos do que os demais no mesmo evento. Há um desequilíbrio que precisa ser superado'. Foto: Shilton Araujo/Esp.DP


Foi da dificuldade em encontrar espaço para as mulheres nas cabines que a recifense Nadejda Maciel teve o ímpeto de criar um selo para mulheres, a MaddaM. “Realizamos eventos só com mulheres atuando em todas as áreas. Desde a designer que cria as artes, as DJs, a fotógrafa... Em todo o evento, tentamos empregar mulheres. O projeto nasceu do desejo por mudança e todas as envolvidas têm recebido mais convites para tocar, e também a resposta do público é bastante incentivadora”, explica.

Nadejda acredita que as discussões que envolvem questões de gênero e inclusão têm feito com que os produtores repensem a formatação dos seus eventos. “Há uma certa expectativa e fantasia em torno da mulher DJ. O que acaba atingindo sua apresentação. Desde a vestimenta ao repertório. E na ânsia de ser bem recebida pelo público, pode se perder a identidade artística e profissional. Infelizmente, muitas ainda atuam no amadorismo, o que faz com que as críticas ao trabalho das mulheres neste cenário sejam fortes e muitas vezes cruéis”, diz. Nadejda finaliza contando que a maior dificuldade que encontra em exercer a profissão é a aparência ofuscando o conhecimento técnico da profissional. “Ninguém pergunta se estamos discotecando porque nós amamos a música, ou onde encontramos aquela seleção musical fruto de uma pesquisa diferenciada. Mas muitos comentam sobre a roupa, o cabelo e a maquiagem. Me pergunto muito: Quando isso vai acabar?”, indaga.

Incentivo internacional

A DJ francesa Carie ministra oficina no Paço do Frevo. Foto: Carie/Divulgação


Com o propósito de fazer com que as mulheres atuem mais fortemente no comando das pickups, a DJ francesa Carie vem a Pernambuco para ministrar a primeira edição da oficina Mulheres e mixagem. O evento é gratuito e vale reforçar que é exclusivo para o público feminino. O minicurso vai promover uma troca de experiências entre profissionais que já ingressaram neste segmento e as que ainda não começaram a discotecar. Atualmente morando em Lisboa, Portugal, Carie começou a espalhar seu som pelo mundo, em 2000, tocando drum and bass, funky and bass britânico e um hip hop mais pesado.

Nascida nos Alpes Franceses, ela conta que está animada em poder contribuir com a oficina. “Vejo que as mulheres têm menos acesso a aprender e poder tocar. É legal encontrar alguém que explique esse percurso”, diz. A artista repudia o machismo na profissão e diz já ter escutado frases, como “para uma mulher, até que você toca bem”. “As pessoas pensam logo no gênero, mas eu só quero valorizar a importância da música”, finaliza.

SERVIÇO

Oficina Mulheres e mixagem
Quando: 07 de abril (sábado), a partir das 13h
Onde: Paço do Frevo (Praça do Arsenal da Marinha, s/n, Bairro do Recife)
Quanto: Gratuito
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