Música

'O Brasil precisa urgentemente redescobrir sua trilha sonora', diz Alceu Valença

Cantor retorna ao estado para mais uma apresentação do projeto O Grande Encontro, ao lado de Elba Ramalho e Geraldo Azevedo

Publicado em: 08/03/2018 21:08 | Atualizado em: 24/05/2020 17:55

Recentemente, pernambucano fez apresentação histórica na Rede Globo (Foto: Shilton Araujo/Esp.DP)
Recentemente, pernambucano fez apresentação histórica na Rede Globo (Foto: Shilton Araujo/Esp.DP)

Um artista são-bentense, agrestino, pernambucano, nordestino e brasileiro, exatamente nesta ordem, é como o cantor e compositor Alceu Valença gosta de referir-se a si mesmo. Há dois anos de volta aos palcos junto com os companheiros de estrada Elba Ramalho e Geraldo Azevedo, ele retorna ao estado nesta quinta-feira (8), com mais uma apresentação do projeto O Grande Encontro. O show será no Teatro Guararapes (Centro de Convenções de Pernambuco - Avenida Professor Andrade Bezerra, s/n, Salgadinho, Olinda). Ingressos custam R$ 200 (plateia), R$ 100 (meia), R$ 160 (balcão), R$ 80 (meia), à venda na bilheteria do teatro e no site www.compreingressos.com.

De sonoridade elétrica, com mais vigor e energia se comparado aos shows de 20 anos atrás, o espetáculo atual é definido por Alceu como mais maduro. "Nosso entrosamento no palco é cada vez maior. E há uma diferença fundamental entre O Grande Encontro atual e o de 20 anos atrás. Antes, o show era basicamente acústico, nós e nossos violões. Hoje, é um show totalmente pra cima”, explica o cantor, compositor e cineasta. 

No repertório, canções interpretadas em formato solo, duetos ou em trio: Anunciação, Banho de cheiro, Dia branco, Frevo mulher, Tropicana, Moça bonita, Caravana, Chão de giz, Belle de jour, Canção da despedida, Coração bobo, Táxi lunar, Bicho de sete cabeças, Papagaio do futuro e Me dá um beijo.

Entrevista - Alceu Valença, cantor 

Você, Elba e Geraldo retomaram O grande encontro há quase dois anos, passando duas vezes por Pernambuco. De lá para cá, acha que algo amadureceu na execução do show?
É natural que voltemos sempre a Pernambuco, uma vez que nossa expressão está profundamente ligada à cultura e à identidade nordestina, sobretudo à pernambucana. Somos artistas populares que construímos nossas carreiras com os alicerces do frevo, do xote, do baião, do coco, da toada, dialogando sempre com sonoridades contemporâneas, mas sem jamais deixar nossas raízes de lado. Hoje o show está mais maduro, nosso entrosamento no palco é cada vez maior. E há uma diferença fundamental entre O grande encontro atual e o de 20 anos atrás. Antes, o show era basicamente acústico, nós e nossos violões. Agora apostamos numa sonoridade elétrica, com mais vigor e energia. É um show totalmente pra cima.

Você costuma comentar que foi um ávido contestador da ditadura militar. Hoje, ainda faz questão abordar temas políticos?
Costumo dizer que a política é a arte do possível e a arte é a política do impossível. Minha geração possuía um inimigo definido, que era a ditadura militar. Tínhamos que encontrar soluções metafóricas em nossas letras para driblar a censura e passar nossa mensagem. Quando me entrevistaram pela primeira vez num jornal norte-americano, eu disse que fazia protest song e o jornal me chamou de o Bob Dylan brasileiro (risos). Eu mal conhecia Bob Dylan, mas sabia perfeitamente qual era o sentido da minha contestação. Passada a ditadura, nos engajamos na campanha pelas Diretas Já, vimos o Brasil se decepcionar com alguns governos, sonhar alto com outros. O mais importante é que hoje temos liberdade de expressão e uma democracia consolidada. No mais, continuo sonhando com “uma nação solidária, sem preconceitos” como canto na minha música Tomara. 

No ano passado, O grande encontro passou por eventos como Rock in Rio e Réveillon de Copacabana. Acha importante que a cultura nordestina esteja em evidência nesses eventos de grande porte do Sudeste do país?
Sim, e este ano faremos Lisboa e Porto, em julho. Nosso show no Rock in Rio foi considerado o melhor do palco Sunset e o Réveillon de Copacabana foi possivelmente o nosso maior público nessa volta. Enquanto houver fronteiras, posso dizer que sou são-bentense, agrestino, pernambucano, nordestino e brasileiro, nesta ordem. O grande manancial da cultura brasileira está no Nordeste.

Recentemente, você fez uma apresentação designada como "histórica" no Domingão do Faustão. Como se sente ao causar tanta repercussão após tantas décadas de carreira?
Realmente, foi uma apresentação histórica. Faustão ficou impressionado com a força do meu bloco Bicho Maluco Beleza, que desfilou pelo quarto ano consecutivo pelas ruas de São Paulo, atraindo cerca de meio milhão de pessoas. Como estávamos saindo do carnaval, privilegiei alguns elementos da festa pernambucana, cantei músicas como Maracatu e Pagode russo. A repercussão foi grande. Até hoje o pessoal vem comentar comigo nas ruas. É a tal coisa: sou como um espelho do meu público. Eu me reconheço nele e ele se reconhece em mim.

Como avalia o atual momento da música nacional?
Escuto muito pouca música de uma maneira geral. Mas tenho conhecido ótimos artistas da nova geração surgida em Pernambuco, como Almério, Juliano Hollanda, a turma da Orquestra Contemporânea de Olinda. Além disso, posso citar os trabalhos de Mariana Aydar e da banda Os Gonzagas, entre alguns dos que mais me chamaram a atenção atualmente. Tem muita gente fazendo coisa boa por aí, mas chegar na grande mídia é outra coisa. O Brasil precisa urgentemente redescobrir sua trilha sonora. 

Quais os próximos passos de sua carreira solo? Algum lançamento inédito?
Atualmente tenho cerca de oito tipos diferentes de shows. Tenho show de sucessos, acústico, com orquestra de câmara (Valencianas, vencedor do Prêmio da Música Brasileira em 2015), show de carnaval, de São João. Tenho um show mais próximo ao rock (Vivo! Revivo!), que saiu em DVD no ano passado. Recentemente criei um show chamado Anjo de fogo, que é um apanhado das diversas vertentes que possuo e que já apresentei em João Pessoa, Natal, São Paulo, Salvador, Porto Alegre... e tem O Grande Encontro. Neste ano pretendo gravar um DVD de forró. Fui homenageado pelo Forró de Lisboa em dezembro, uma festa emocionante. O forró vem ganhando cada vez mais adeptos na Europa. São vários festivais dedicados ao gênero em diversos países. Até em São Petsburgo tem festival de forró!

Com tanta experiência de vida e carreira, nunca considerou escrever uma autobiografia?
Há poucos anos comecei a escrever uma espécie de autobiografia que iria se chamar Inacreditáveis histórias verdadeiras. Infelizmente, o texto estava dentro de um computador que foi esquecido num táxi. Não conseguimos localizar o motorista e o livro se perdeu. No momento, sou tema de dois documentários em andamento e ainda gravei um minidoc sobre minha relação com Portugal para uma equipe de brasileiros que vive em Lisboa. Estou escrevendo o roteiro de um novo filme, com uma história ambientada em Olinda. Depois de A luneta do tempo (lançado em 2016), cujo roteiro escrevi durante mais de dez anos e, depois, dirigi, editei, cantei e atuei, fiquei com vontade de fazer cinema novamente. Dirigir um filme foi uma das experiências mais ricas e prazerosas da minha vida.
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