Retrocesso Projeto de lei quer proibir arte com 'teor pornográfico' em Pernambuco Deputado mira 'os destruidores da sagrada instituição, chamada família, que vem a ser o bem maior, que Deus concedeu à humanidade'

Por: Viver/Diario - Diario de Pernambuco

Publicado em: 21/11/2017 20:32 Atualizado em: 21/11/2017 21:27

Proposta legislativa surge no rastro de protestos conservadores contra exposições e performances como La bête (foto). Foto: Instagram/Reprodução
Proposta legislativa surge no rastro de protestos conservadores contra exposições e performances como La bête (foto). Foto: Instagram/Reprodução
Um projeto de lei de autoria do deputado estadual Ricardo Costa (PMDB) quer proibir expressões artísticas e culturais com "teor pornográfico" nos espaços públicos de Pernambuco. A matéria foi publicada no Diário Oficial do Poder Legislativo desta terça-feira e ainda deve passar por comissões antes de ser levada a plenário. Em outubro passado, uma lei semelhante foi aprovada na Assembleia Legislativa do Espírito Santo.

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De acordo com o texto do deputado, o alvo do PL 1774/2017 são "as expressões artísticas ou culturais que contenham fotografias, textos, desenhos, pinturas, estátuas, modelos vivos nus ao vivo, filmes e vídeos que insinuem o ato sexual humano ou animal". O descumprimento da medida, segundo o deputado, implicaria em uma multa de 5 mil UFIRS, indexador extinto no ano 2000. O valor seria de aproximadamente R$ 5,3 mil. Caso houvesse reincidência, os mantenedores ou patrocinadores pagariam o valor em dobro.

No texto do PL, o deputado ainda cita moral e religião como justificativa para a punição. "Os envolvidos foram considerados destruidores da sagrada instituição, chamada família, que vem a ser o bem maior, que Deus concedeu à humanidade".

A atitude do deputado vem na esteira da polêmica causada a partir da exposição Queermuseu, que foi encerrada abruptamente pelo Santander Cultural de Porto Alegre após protestos pela presença de obras que, segundo grupos retrógrados, fariam apologia à pedofilia e à zoofilia.

O assunto manteve-se na ordem do dia com a repercussão da performance La bête, do artista Wagner Schwartz, na qual uma criança pequena tocou no artista nu. O curador da exposição, Gaudêncio Fidélis, teve a condução coercitiva autorizada pelo STF para depor na CPI dos Maus-Tratos em Crianças e Adolescentes no Senado.

Nas redes sociais, os artistas pernambucanos se manifestaram de forma contrária à medida e acusam o texto do deputado de querer censurar expressões artísticas. Outro que discorda totalmente do projeto de lei é o ator e dramaturgo Giordano Castro, integrante do Grupo Magiluth, que já viajou o Brasil inteiro e incluiu cenas de nudez em suas peças.

"Esse projeto é para chamar a atenção. Há uma série de questões mais importantes para resolver. Os índices de violência não estão diminuindo, estamos com problemas no trânsito, Pernambuco parou de crescer. No fim das contas, é um projeto eleitoreiro que busca votos de uma certa parcela da sociedade e não interfere na vida de ninguém. Depois nós artistas é que somos chamados de vagabundos", frisa.

REPÚDIO

A Secretaria de Cultura de Pernambuco, a Fundarpe e os integrantes da Pré-Conferência Setorial do Audiovisual de Pernambuco fizeram uma carta aberta conjunta para repudiar o projeto do deputado Ricardo Costa. Eles enxergam na proposta uma "censura explícita às artes", "uma violação às garantias fundamentais do cidadão".

Leia a íntegra:

CARTA ABERTA DE REPÚDIO AO PROJETO DE LEI DO DEPUTADO RICARDO COSTA, DE CENSURA ÀS ARTES EM PERNAMBUCO

Nós, artistas, produtores, fazedores de cultura e gestores públicos que participamos, neste momento, do processo de debates da IV Conferência Estadual de Cultura recebemos, com assombro e bastante preocupação, a notícia de um Projeto de Lei que passou na data de 21 de novembro de 2017 a tramitar na Assembleia Legislativa de Pernambuco.

Repudiamos veementemente o PL Nº 1774/2017, de autoria do deputado Ricardo Costa, que dispõe sobre a “proibição de exposições artísticas ou culturais com teor pornográfico em espaços públicos, no âmbito do Estado de Pernambuco”.

O deputado entende por “pornográfico” quaisquer “expressões artística ou cultural que contenham fotografias, textos, desenhos, pinturas, estátuas, modelos vivos nus ao vivo, filmes e vídeos que insinuem o ato sexual humano ou animal” (sic).

A censura explícita às artes que esse projeto de lei sugere é uma violação às garantias fundamentais do cidadão, expressas na Constituição, de liberdade de expressão; é parte de um movimento retrógrado, conservador, de forças reacionárias que tentam, em todo país, cercear o pleno exercício dos direitos culturais, que têm, como um de seus princípios, o questionamento do status quo, bem como a reflexão sobre a natureza do homem e das coisas.

Esse tipo de censura é próprio de regimes totalitários e fascistas, e não podemos permitir que encontre eco em nossa sociedade.

Ao longo da história, a pretexto de defesa de valores morais, livros foram queimados em praça pública ou proibidos de circular, artistas sofreram perseguição, censura, tortura e exílio. Para que essa história nunca mais se repita, dizemos: a marcha da insensatez precisa ser contida.

ASSINAM:

Secretaria de Cultura de Pernambuco
Fundarpe
Integrantes da Pré-Conferência Setorial do Audiovisual de Pernambuco

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