Artes Cênicas Juiz derruba liminar e peça com Jesus travesti voltará a ser encenada O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu havia sido cancelado por liminar do Tribunal de Justiça

Por: Viver/Diario - Diario de Pernambuco

Por: Estado de Minas

Publicado em: 05/10/2017 16:00 Atualizado em: 05/10/2017 20:43

Espetáculo é estrelado por Renata Carvalho, atriz, travesti e ativista dos direitos da população transgênero. Foto: Lígia Jardim/Divulgação
Espetáculo é estrelado por Renata Carvalho, atriz, travesti e ativista dos direitos da população transgênero. Foto: Lígia Jardim/Divulgação


O Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu, nesta terça-feira (3), a liminar concedida pelo juiz Luiz Antônio de Campos Júnior que impedia a exibição do espetáculo O Evangelho segundo Jesus, Rainha do Céu na cidade de Jundiaí, no interior de São Paulo. Protagonizada por uma mulher transgênero no papel de Jesus, a peça havia sido proibida no dia 16 de setembro pelo magistrado, que descreveu a performance como de "indiscutível mau gosto" e "desrespeitosa ao extremo".

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"Informamos que o recurso à liminar transfóbica e fundamentalista que cancelou nosso espetáculo em Jundiaí no último dia 15 foi deferido! A liminar foi derrubada. Estaremos em breve em Jundiaí, dando o recado da Rainha Jesus. Amém!", comunicou o grupo responsável pela encenação, em publicação no Facebook. Segundo a produção da montagem, o pedido que deu origem a liminar foi articulado por associações religiosas pelo movimento Tradição, Família e Propriedade (TFP).

Escrito pela dramaturga transexual escocesa Jo Clifford e traduzido, montado e dirigido por Natalia Mallo, argentina radicada no Brasil, o monólogo traz uma releitura de Jesus, que vive como travesti nos dias atuais. A personagem é interpretada por Renata Carvalho, atriz, travesti e ativista dos direitos da população transgênero. Aos 35 anos, 20 deles dedicados às artes cênicas, Renata encena texto que resgata parábolas bíblicas, como a do filho pródigo, porém reconstruídas e recontextualizadas.

Polêmica ao propor um diálogo pouco usual com a religião cristã, o espetáculo soma cerca de 70 apresentações e é alvo de reações desde que estreou, em agosto do ano passado. A peça tem nova estreia prevista para esta quinta-feira (5), em Belo Horizonte, o que já motivou reação e abre possibilidade de que o assunto vire nova batalha judicial na capital mineira. Em Minas, a peça entrou na mira do deputado João Leite (PSDB), um dos líderes da bancada evangélica na Assembleia Legislativa.

Classificando a obra como "desmoralização da vida de Jesus e preconceito contra a fé da maioria das pessoas no Brasil", o parlamentar disse que, com outros parlamentares, não só da bancada evangélica, se prepara para questionar o uso de dinheiro público, por meio de incentivos fiscais, no patrocínio da peça. "Com base no artigo 208 do Código Penal, pelo escárnio da fé cristã, iríamos representar judicialmente, mas a sociedade civil já havia entrado com um pedido de liminar contra a peça. Porém, vamos ao MP questionar esse vilipêndio à fé cristã", afirmou o deputado.

ESTIGMA
Já a diretora Natália Mallo sustenta que sua proposta é justamente a reflexão sobre tolerância e respeito à diversidade. "Esse julgamento, sem conhecer a peça, revela muito da transfobia e do preconceito presentes na sociedade. É um julgamento baseado no fato de termos uma travesti em cena. A identidade travesti é tão estigmatizada que, mesmo sem conhecer o trabalho, conclui-se que é uma difamação, uma ofensa, uma chacota, ou que é sexualizado. Porém, o trabalho não tem nada disso, vem de um estudo profundo dos evangelhos na tentativa ficcional de resgatar uma essência do questionamento sobre a nossa capacidade de dar a mão, de amar o próximo, de ser solidário e de olhar para o diferente com empatia e disposição para o diálogo", explica.

Natália Mallo rechaça as acusações de tentativa de desmoralizar a religião. "Perguntam-nos por que achamos que Jesus era travesti. Mas não é isso, nós apenas imaginamos como seria. Pior é a agenda política, que cria um fato por semana. Primeiro, o Queermuseu, depois a nossa peça e a performance no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Inventam uma narrativa sobre um fato para criar o inimigo que deve ser combatido como ameaça às nossas crianças, tentando arrebanhar adeptos por meio desse discurso, impulsionado pelas mídias sociais”, diz ela.

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