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Cinema Filme que investiga método de atuação de Irandhir Santos estreia no Festival do Rio Impressionado com a performance do pernambucano, o cineasta Walter Carvalho decidiu acompanhar o ator antes de entrar em cena

Por: Breno Pessoa

Publicado em: 08/10/2017 17:00 Atualizado em: 08/10/2017 16:44

Irandhir Santos antes de entrar em cena no filme Redemoinho. Foto: Walter Carvalho/Divulgação
Irandhir Santos antes de entrar em cena no filme Redemoinho. Foto: Walter Carvalho/Divulgação

Para quem só acompanha pela TV, talvez a carreira do pernambucano Irandhir Santos, 39, pareça recente. A primeira participação de destaque veio em 2007, com o papel de Quaderna, em A pedra do reino, mas a presença só tornou-se mais constante a partir de 2014, na novela Amores roubados. A experiência no audiovisual, no entanto, vem do início dos anos 2000. E, neste ano, após participação em cerca de 20 longas-metragens, o ator é protagonista de mais um filme: Iran, de Walter Carvalho, que será exibido neste domingo, no Festival do Rio.


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A produção registra o ator no processo de composição de personagens. "Não é um filme sobre Irandhir nem um filme com Irandhir. É um filme de Irandhir", diz o cineasta, reforçando o caráter subjetivo da obra. Diretor de fotografia do longa Redemoinho (2017), de José Luiz Villamarim, Carvalho observava o preparo do ator antes de entrar em cena e decidiu filmar alguns desses momentos. O interesse do diretor veterano não é de agora. "Fui apresentado ao Irandhir pelo Cláudio (Assis) em O baixio das bestas (2006)", recorda Carvalho, responsável pela fotografia do longa.

"No primeiro dia, quando nós começamos a preparação, o Lula Carvalho, que estava fazendo a câmera do filme, chamou a atenção para a maneira de ele se preparar e entrar em cena", lembra o cineasta. “Tanto o Lula quanto eu ficamos impressionados com a maneira como ele se concentra para o trabalho". O papel rendeu o Candango de Melhor Ator Coadjuvante no Festival de Brasília daquele ano. O filme de Cláudio Assis também foi marcante para Irandhir. "Ele considera que foi em Baixio que encarou um set para valer, com um papel grande", diz Carvalho sobre o ator, cujo debute na tela grande foi em Cinema, aspirinas e urubus, de Marcelo Gomes, em 2004.

"Depois, nos encontramos em diversos filmes, inclusive Febre do rato (2011). Fiquei cada vez mais impressionado como ele se preparava pra trabalhar, para construir outros personagens", acrescenta o diretor. O assombro de Walter se repetiu em diversas ocasiões. "Assim foi em outros filmes e na TV, em Amores roubados”. O cineasta diz ter ficado estimulado com a performance do ator, de "deixar se possuir por um personagem na construção dele". Quando resolveu filmar o preparo de Irandhir fora de cena, nas gravações de Redemoinho, Carvalho não pensava em transformar o material em filme. De acordo com ele, o registro foi feito como o de um apreciador.

O diretor também diz que as gravações foram feitas sem articulação prévia com o ator. "Não falei e ele também não perguntou. Não queria contrariá-lo na sua concentração", revela. "Quando o filme [Redemoinho] acabou, eu pensei comigo: 'O material que registrei tem uma substância que ainda desconheço'. E um dia percebi que tinha diante dele a possibilidade de fazer um filme". Procurado pelo Viver, Irandhir Santos não comentou o filme. "Acho que ele não vai falar", antecipou Walter Carvalho. "Ele está a fim de dividir comigo a emoção das pessoas ao verem o filme", conta.

[Entrevista - Walter Carvalho // cineasta 


Semanas atrás você disse que ainda não estava pronto para falar sobre o filme, que ainda estava assimilando o material. Esse ciclo se fechou?
Um filme não se completa quando ele termina, mas quando ele é exibido. Ele se completa quando deixa de ser seu e passa a ser dos outros, ele não se fecha quando termina tecnicamente na edição e finalização. Ele termina quando começa a se relacionar com público.

O filme tem 70 minutos de duração. Muito material ficou de fora?
Usei dois terços do que filmei. Talvez tenha sido o filme em que filmei menos, o mais econômico do ponto de vista da linguagem, do conteúdo, de gestos, de gastos, de produção.

Como definir Iran?
A melhor maneira de eu definir é que esse é um filme a partir das anotações da minha câmera. Eu sempre começo meus filmes anotando em cadernos, papéis e folhas. Este é um filme feito a partir das anotações de uma câmera pequena. Não tive assistente. Sou eu sozinho, com uma câmera no meu pescoço.

Você classificaria o filme como um documentário?
Ele vai ser enquadrado como documentário porque não tem outra coisa mais próxima. As coisas evoluíram para um lugar onde há uma classificação para todos os filmes: documentários, ficção, histórico, de arquivo. Mas esse é um filme sem definição, um filme de sentimentos, de sensações.

Por essas diferenças e subjetividades, considera que foi um filme mais difícil de se fazer?
Cada filme não repete a experiência anterior. O próximo filme é o mais difícil, porque ainda não sei qual é. Não é que ele seja diferente, ele tem uma radicalidade que não tenha utilizado ainda. Estou muito curioso para saber como as pessoas vão entender ou receber o filme.

As facetas de Irandhir
A carreira do ator pernambucano, nascido na cidade de Barreiros, na Zona da Mata do estado, é conhecida pela diversidade de papéis. Versátil, ele já interpretou de cangaceiro a líder de uma trupe teatral.

A pedra do reino (2007)
A microssérie inspirada no Romance d’A Pedra do Reino, de Ariano Suassuna, foi o primeiro grande papel na TV. Como Quaderna, personagem central da obra de Luiz Fernando Carvalho, Irandhir mostrou talento tragicômico na interpretação, algo menos visto em produções mais recentes, marcadas sobretudo por performances dramáticas.

A luneta do tempo (2014)
O mítico Lampião ganhou nova vida em interpretação delicada. O filme de Alceu Valença foi lançado em um dos períodos mais profícuos do ator, em outras quatro produções no ano, incluindo outros títulos pernambucanos: História da eternidade, de Camilo Cavalcanti, e Permanência, de Leonardo Lacca.

Meu pedacinho de chão (2014)
Na estreia em novelas, ele inaugurou a parceria com o autor Benedito Ruy Barbosa e com o diretor Luiz Fernando Carvalho, trio que se reuniria novamente em Velho Chico. Como o jagunço Zelão, mostrou um homem rude sendo pouco a pouco amaciado por uma paixão pela professora Julia (Bruna Linzmeyer).

Velho Chico (2016)
No set da novela, chegava a ignorar os atores da família Sá Ribeiro, rival do clã Dos Anjos, núcleo do seu personagem, Bento, irmão do protagonista, Santo (Domingos Montagner). Em uma interpretação expressiva, Santos desempenhou figura atormentada, que oscilava entre a natureza bruta e a fragilidade emocional.

Tatuagem (2013)
O filme de Hilton Lacerda garantiu a Irandhir o prêmio de Melhor Contribuição Artística na Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano, em Cuba, e o de Melhor Ator, no Festival do Rio. Na ficção, é Clécio Wanderley, líder da trupe Chão de Estrelas, grupo de artistas que faz espetáculos de resistência na ditadura brasileira.


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