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Estreia Depois homenagear cinema mudo com O Artista, diretor oscarizado faz filme sobre Godard Bastião da nouvelle vague francesa ganha retrato cômico nas mãos de Michel Hazanavicius

Por: Breno Pessoa

Publicado em: 26/10/2017 19:20 Atualizado em: 26/10/2017 19:43

Louis Garrel (Godard) e Stacy Martin (Anne Wiazemsky) fazem par no filme. Foto: Imovision/Divulgação
Louis Garrel (Godard) e Stacy Martin (Anne Wiazemsky) fazem par no filme. Foto: Imovision/Divulgação

Rio de Janeiro - Nome sagrado para muitos, o cineasta francês Jean-Luc Godard ganhou um retrato bastante mundano em O formidável, filme do conterrâneo Michel Hazanavicius (O artista), estreia de hoje. Com Louis Garrel no papel principal, a comédia dramática resgata o período entre 1967 e 1970, quando o ícone da nouvelle vague passou a assumir veia política na sua obra e participação nos protestos de maio de 1968.

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Mal-humorado, mesquinho e arrogante são predicados que podem ser utilizados para a representação de Godard no filme. E isso parece um grande acerto. Excelente no papel, Garrel representa o cineasta de forma inevitavelmente cômica mas nunca caricata. A rabugice e pretensiosismo vislumbrados no longa parecem condizentes com imaginário perpetuado pelo prolífico e revolucionário diretor, provavelmente tachado, em igual medida, como genial ou difícil.

"Realmente, não ligo para Godard, no geral", diz Michel Hazanavicius, mais conhecido por O artista (2012), obra-sensação que abocanhou cinco Oscars, incluindo o de Melhor Diretor e Filme. "Digo, não é que, de fato, eu não me importe, mas não pensaria em fazer um filme sobre ele", se corrige, embora reconheça não ter o cineasta entre os seus realizadores favoritos. "Gosto dos trabalhos iniciais, mas depois, a partir de 1967, 1968, acho que ele se perdeu", conta.

O formidável é baseado no livro de memórias Un an après (Um ano depois), escrito por Anne Wiazemsky (no filme, interpretada por Stacy Martin), ex-companheira de Godard. O casal se conheceu quando ela participou de A chinesa (1967), ela então com 18 anos e, ele, 37. A atriz e escritora morreu em outubro deste ano, em decorrência de um câncer. "Quando li o livro, vi que esse período da vida dele era muito interessante e intenso para um roteiro: a história de um cara que mudou radicalmente. A maneira como ele mudou é impressionante", afirma Hazanavicius.

Após comprar os direitos de adaptação, o Hazanavicius entrou em contato com Godard, por carta, para avisar da produção do filme. "Ele respondeu me pedindo para ver o roteiro. Eu enviei o script, mas não tive retorno”, relembra. Além de resgatar parte da história do cineasta, incluindo aí problemas conjugais dele, o realizador homenageia o diretor ao emular, na direção, a estética e estilo godardiano dos anos 1960. "Não tentei mimetizar Godard, tentei utilizar algumas de suas características e colocar na minha história. Não é um filme de Jean-Luc Godard, é o meu filme", enfatiza.

De fato, a identidade de Hazanavicius é fácil de ser notada. Para além de uma tentativa de homenagem, assim como ocorreu em O artista, o diretor utiliza as aspectos técnicos do seu objeto de trabalho (aqui, no caso, Godard) juntamente ao olhar irreverente. Embora o alvo neste novo filme pareça ainda mais hermético, o resultado final é uma comédia acessível e leve, capaz de agradar não apenas os cinéfilos.

Entrevista // Michel Hazanavicius - diretor

Pretende sempre explorar, de alguma maneira, a história do cinema dentro dos seus filmes?

Eu acho que cinema está sempre visível em todos os meus filmes pela maneira como conto minhas histórias. Mas, embora esses dois títulos sejam sobre pessoas que fazem cinema, não é exatamente um tema que eu tenha buscado. Eu acho que para O artista, foi porque eu queria trabalhar de forma muito específica, o cinema mudo e em preto e branco. E como não queria que as pessoas se perguntassem o motivo de eu ter escolhido esse formato, fiz a história de maneira que se encaixasse nesse contexto e, assim, seria mais fácil de ser assimilado. E para este (O formidável), eu li o livro me veio a ideia de fazer um filme com os trejeitos de Jean-Luc Godard.

Você tentou algum contato com Godard? Acha que ele viu o filme?
Eu acho que ele não viu. E, sim, eu mandei uma carta para ele informando que estava fazendo o filme e ele respondeu me pedindo para ver o roteiro. Eu enviei o script, mas não tive retorno. Mas tudo bem. Digo, eu realmente não preciso saber o que ele pensa a respeito. Eu fiz o filme para pessoas comuns e não para que elas vissem, de fato, ele (Godard), mas uma representação. Quando eu penso sobre a respeito, parece razoável não querer ver alguém fazendo uma imitação de você. Principalmente quando é sobre sua vida, com fatos que aconteceram 50 anos atrás. Eu entendo.

Ao mesmo tempo que essa representação é bem-humorada, ela parece respeitosa.

Sim. Eu tentei ser muito balanceado. Para começar, o formato do filme é uma homenagem ao trabalho de Jean-Luc Godard. Então, há algo no filme que diz 'eu te amo'. A história é levemente diferente, há mais distanciamento. Ele agia como um babaca, podia ser muito maldoso. Mas ele não fazia isso por ser uma pessoa má; ele era a primeira vítima de si mesmo, destruía as coisas ao redor. Ele é um antagonista.

Os fãs de Godard odiaram o filme?
Não sei se odiaram, mas algumas pessoas certamente rejeitaram, não o filme em si, mas o fato de eu ousar fazê-lo. Mas não foram muitas. Eu esperava mais. Porque Godard é algo intocável pelos críticos. Se você aceitar o princípio do filme, você vai gostar dele, porque é muito simples, engraçado. Mas se alguém não me permite que eu faça o filme simplesmente por amar Godard como um deus, com certeza irá rejeitar tudo. Mas, reforço, foram poucas pessoas.

O repórter viajou a convite da organização do Festival do Rio


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