Literatura Coleção de livros 'ensina' a amar Clarice Lispector e Graciliano Ramos Editora criou série de publicações com objetivo de aproximar as obras dos leitores

Por: Ana Clara Brant -

Publicado em: 26/09/2017 14:09 Atualizado em: 26/09/2017 14:18

Graciliano são rememorados em série de livros. Fotos: Cidade Verde/Reprodução e Arquivo Público de Alagoas/Divulgação
Graciliano são rememorados em série de livros. Fotos: Cidade Verde/Reprodução e Arquivo Público de Alagoas/Divulgação

O que é necessário para amar algo ou alguém? Antes de mais nada, conhecê-lo ou conhecê-la. Foi pensando nisso que o publisher da Faro Editorial, Pedro Almeida, criou a série literária Para amar... O objetivo da coleção é aproximar as obras de seus leitores. “Temos uma cultura de livros forte em dois campos - na aposta em obras de temas muito populares e no seu extremo oposto. Muitas pessoas do meio também estão descoladas da realidade do que ocorre nas escolas, pois lá os clássicos nem sempre são inseridos para ser lidos, mas na forma de resumos para passar em provas. Explicar sobre a importância desse tipo de publicação para editores, você pode não acreditar, foi sempre algo muito difícil. Tanto que tive de esperar ter minha própria editora para realizar o projeto”, afirma Almeida.

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Passaram-se 15 anos entre a ideia inicial e sua realização, com o recente lançamento dos dois primeiros volumes da coleção, dedicados a Clarice Lispector (1920-1977) e Graciliano Ramos (1892-1953). É objetivo da coleção, segundo Almeida, subsidiar o leitor com informações que lhe permitam conhecer os traços estilísticos de cada um, de modo que ele possa não apenas visualizá-los no texto, mas perceber o processo de criação. “A proposta da série é mostrar como a arte desses autores se dá no texto”, afirma.

O professor de literatura brasileira na Universidade de São Paulo (USP) Ivan Marques é o responsável pelo livro dedicado a Graciliano Ramos. Ele destaca que a obra do escritor alagoano, apesar de sua concisão (compreende apenas quatro romances, todos lançados na década de 1930), é um monumento da literatura brasileira. A intenção foi destacar e comentar as características particulares do estilo de Graciliano e também as qualidades inovadoras de sua prosa, em que o enredo é menos importante do que a pesquisa psicológica, por exemplo. “Em sua obra, também são importantes os aspectos éticos, o interesse em discutir criticamente os impasses da sociedade brasileira, a reflexão sobre o papel do intelectual, a preocupação com os novos papéis reservados à mulher. No que diz respeito ao estilo, procurei mostrar que, apesar do extremo domínio da língua, da secura e da concisão extraordinárias, há momentos em que a forma confessional, motivada pela irrupção violenta da subjetividade, corrói esses mesmos princípios tão associados ao escritor 'clássico' e totalmente consciente de suas ações”, frisa.

Para Marques, o autor de Vidas secas foi a principal revelação da década de 1930, considerada a era do romance no Brasil. O professor acredita que Graciliano foi o ponto de convergência das várias tendências da narrativa de ficção naquele período, realizando uma obra ao mesmo tempo regional e universal, social e psicológica, realista e introspectiva, clássica e moderna.

Já a professora Emília Amaral, doutora em literatura pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é autora do livro sobre Clarice Lispector. A pesquisadora defende que o Brasil precisa, mais do que nunca, se conhecer. “E a literatura é o maior manancial. Ampliar o público de literatura brasileira na escola e/ou fora dela, e conseguir um efetivo trabalho de leitura de nossos clássicos, é meio caminho andado para literalmente sairmos do buraco da falta de educação, cultura e, portanto, discernimento, em amplo sentido”, analisa.

Emília diz que procurou focar em como as obras de Clarice “conversam”, como se iluminam mutuamente e como essa percepção torna a leitura ao mesmo tempo mais prazerosa e produtiva. “Clarice Lispector nos ensina a humanidade, a humildade, a beleza de cada criatura, à qual muitas vezes somos cegos, por excesso de domesticação, alienação, falta de refinamento da sensibilidade. Acredito que seu principal legado foi mostrar que a linguagem não é um instrumento retórico que se preste à função de ornamento, persuasão barata e tantas outras falcatruas”, afirma.

SERVIÇO
Para amar Clarice, de Emilia Amaral

Editora: Faro
Páginas: 160
Preço: R$ 29,90

Para amar Graciliano, de Ivan Marques
Editora: Faro
Páginas: 179
Preço: R$ 29,90

DUAS PERGUNTAS: Pedro Almeida, publisher da Faro Editorial

Por que alguns autores se tornam clássicos? E por que continuam a ser lidos?
Se tornam clássicos quando criam algo universal e perene, que nem o tempo é capaz de reduzir o valor do que produziram. Esses autores criam marcas estilísticas próprias, de modo que seus leitores, mesmo sem ver o título do livro, são capazes de identificar o autor por trechos. O estilo próprio é a arte de suas literaturas.

Por que abrir a série com Graciliano e Clarice?
Clarice sempre foi uma primeira escolha. Ela é a autora brasileira que sempre me emociona quando leio. A ideia era lançar também um volume com Machado, mas o livro ficou para 2018. Estamos pensando em mais nomes.

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