Literatura Após mais de quatro décadas sem publicar, Marcelo Peixoto lança livro de contos Nova obra do escritor recifense, Cemitérios Canários, traz construção textual particular, sem preposições e sintaxe livre

Por: Breno Pessoa

Publicado em: 14/06/2017 08:00 Atualizado em: 13/06/2017 12:05

Disléxico, autor confessa ter sentido insegurança sobre o texto por muito tempo. Foto: Cepe/Reprodução
Disléxico, autor confessa ter sentido insegurança sobre o texto por muito tempo. Foto: Cepe/Reprodução

 
Estranhamento é uma sensação natural na leitura inicial de Cemitérios canários (Cepe, 178 páginas, R$ 30) livro de contos que Marcelo Peixoto lança nesta quarta-feira, às 19h, no Museu do Estado de Pernambuco (Avenida Rui Barbosa, 960, Graças). Essencialmente sem preposições ou pronomes e com sintaxe atípica, o texto se aproxima de uma linguagem poética. "A minha linguagem é muito simples", defende o autor recifense, "à medida que se vai lendo, você se habitua", acrescenta.

Apesar de estar no segundo volume de contos da carreira, Peixoto não é um iniciante. A estreia foi nos anos 1970, com Ai quem me dera beijar os lábios de Dorothy Lamour. De lá até aqui, publicou ainda um livro de poemas (Pastor da solidão) e se dedicou a campos variados: artes plásticas, cênicas e audiovisual. A produção literária nunca foi deixada de lado, mas os escritos ficaram restritos a poucos leitores: apenas amigos íntimos.

"Sempre assumi minha afetividade, minha sexualidade", conta escritor, que compara o processo de publicação da obra ao de afirmação sexual. "Tem muita coisa que não saiu do armário", diz sobre os escritos. "Eu tive muito mais problemas em assumir a minha criação literária, foi muito mais conflituado do que qualquer coisa", revela.

A relação por muito tempo traumática com o próprio texto vem da infância, quando uma professora sugeriu aos pais dele que o garoto tivesse uma educação especial. "Esse menino é burro, não aprende a escrever, tem dislexia", rememora Marcelo Peixoto sobre algumas frases ouvidas no período escolar. O escritor diz ter enfrentado anos de terapia até aceitar a inevitabilidade do transtorno. "Não sei se meu estilo foi para a dislexia, ou se ela veio para meu estilo", brinca.

Com forte carga biográfica, as pequenas histórias reunidas no em Cemitérios canários têm inspiração em acontecimentos reais vividos por ele e por pessoas próximas. "Não me poupo nem poupo ninguém", ressalta, acrescentando que a literatura precisa ser verdadeira, com "suor e sangue". O autor também pretende lançar em breve um outro livro de "contos gays", que estava pronto antes de Cemitérios canários mas foi postergado. Marcelo diz que poderiam, erroneamente, acreditar que a temática é uma novidade relacionada ao seu retorno. "Sempre escrevi, mas não sou um escritor de contos gay. Não tenho rótulos", afirma.

Trecho
"Estava virando tradição. Amigos reuniam regado birita tirar medidas fantasias. Maneira conhecer novos participantes. Ingressar grupo espécie batismo. Têca organizava tudo durante ano. Quando achava tinha esgotado formas cores vinha novidade. Ficava lindo final. Pluralidade listra bolas pretas brancas. Diferentes modelos. Metade cor metade outra. Até todo preto corações grandes coloridos aplicados altura bunda macacão folgado. Tênis diverso modelos marcas".
Do conto Palhaço entalado


Acompanhe o Viver no Facebook




MAIS NOTÍCIAS DO CANAL