Teatro Pernambuco foi experiência fundamental para ator Nelson Xavier, morto nesta quarta Ator paulistano viveu no estado nos anos 1960 e foi ícone do teatro engajado, participando do Movimento de Cultura Popular e dirigindo o espetáculo Julgamento em Novo Sol

Por: Matheus Rangel

Publicado em: 10/05/2017 17:04 Atualizado em: 10/05/2017 20:33

Artista morou no Recife entre entre 1961 e 1963. Foto: Globo/Divulgação
Artista morou no Recife entre entre 1961 e 1963. Foto: Globo/Divulgação

No longo caminho trilhado por Nelson Xavier (1941-2017) na arte, entre memoráveis contribuições para a teledramaturgia e o cinema brasileiros, há um espaço considerável dedicado a Pernambuco, pano de fundo para um trecho importante da sua trajetória no teatro. Membro do grupo Teatro de Arena e filiado ao Partido Comunista do Brasil na época que antecedeu o golpe militar de 1964, o ator, ao lado de Milton Gonçalves e Augusto Boal, veio ao Recife em 1961 para uma espécie de intercâmbio com o Movimento de Cultura Popular (MCP), capitaneado no estado por nomes como Hermilo Borba Filho, Ariano Suassuna, Luiz Mendonça e Paulo Freire.

"Ele se apaixonou pela forma do movimento. Nelson, Milton e Boal viram um movimento político formado aqui. O Teatro de Arena tinha a técnica e eles poderiam realizar uma troca de conhecimentos com o MCP, tinham muito a aprender com a nossa força política e estética", acredita Rudimar Constâncio, diretor do departamento de teatro do Sesc Piedade e autor da dissertação Teatro de Cultura Popular: Uma prática teatral como inovação pedagógica e cultural no Recife. "Nelson passou a residir na cidade, dando aulas de interpretação. Uma novidade que trouxe consigo foi a experiência do teatro de laboratório, em que todos viviam juntos para compreender as técnicas", relata Rudimar.

Outra colaboração do ator para arte no estado foi a introdução do teatro épico de Bertolt Brecht, corrente que viabiliza a produção de conteúdo com maior engajamento político. "Ele instaurou um teatro mais político aqui, em que era quebrada a quarta parede, isto é, o público era trazido para dentro do espetáculo", define ele. O ápice da colaboração entre o Movimento de Cultura Popular e o Teatro de Arena ocorreu com a montagem, em 1962, da peça Julgamento em novo sol, cujo enredo tratava de movimentos sociais e temas como a reforma agrária. O espetáculo estreou no Teatro de Santa Isabel com uma temporada que reuniu cerca de 5 mil pessoas e um elenco de cerca de 50 atores, incluindo o ator José Wilker. A peça foi responsável por abrir "muito as mentes para a interpretação e para o contexto político" da época, como argumenta o ator e pesquisador Leidson Ferraz.

A presença de Nelson na produção abriu portas para o MCP, levando a peça para o interior de Pernambuco, a Paraíba, Bahia e ao Distrito Federal, a convite do então presidente João Goulart. Julgamento em novo sol acabou junto com a democracia: após a instauração do golpe, militares destruíram cenários e prenderam atores, desfazendo o movimento. Nelson Xavier resolveu permanecer no Rio de Janeiro, onde fazia uma palestra. "Se o golpe não tivesse prendido todo mundo e acabado com aquilo, hoje o Brasil seria um exemplo educacional planetário. Tenho plena convicção", disse o ator em entrevista ao jornal O povo em 2013. "Foi uma época áurea da minha vida", definiu ele nana conversa, sobre a experiência.

Morte
Nelson Xavier morreu, aos 75 anos, na noite desta terça-feira (9), em Uberlândia, Minas Gerais. Ele estava na cidade por conta de um tratamento em uma clínica de geriatria, prestadora de serviço do Hospital Santa Genoveva. Nos últimos quatro meses, Nelson estava sendo acompanhado por uma médica para tratamento de uma doença pulmonar. O velório do corpo será realizado no Rio de Janeiro, a partir das 8h, no Cemitério do Caju. A cerimônia de cremação será às 16h. 

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