Por: Alef Pontes
Publicado em: 09/02/2017 15:15 Atualizado em: 09/02/2017 17:56
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| Militante dos blocos líricos, Getúlio Cavalcanti tem grande importância para a manutenção desta tradição. Foto: Marlon Diego/Esp.DP |
Chegar a marca dos 75 anos de idade com uma intensa trajetória de 55 de carreira dedicadas à manutenção da cultura popular não é para qualquer um. Mas, sim, para quem ostenta o título de "Rei dos Artistas". Com um longo currículo - que se confunde com a própria história do carnaval de rua do Recife -, o cantor e compositor Getúlio Cavalcanti, guardião fiel da tradição do lirismo, celebra nesta sexta-feira (10) sete décadas e meia de vida com mais um marco: o lançamento do primeiro DVD dedicado aos Blocos Líricos do Recife.
Confira o roteiro de shows e prévias no Divirta-se
Em dezembro do ano passado, Getúlio Cavalcanti subiu ao palco do Teatro de Santa Isabel, acompanhado de representantes de 31 agremiações carnavalescas e orquestras de pau e corda, para registrar em DVD o legado de uma trajetória. Intitulado Acerto lírico - em referência aos acertos de marchas dos blocos -, o trabalho conta ainda com a participação dos corais Edgard Moraes, do Bloco Paraquedista Real e do Bloco da Saudade.
Para o DVD, Getúlio fez uma seleção de 18 músicas - todas premiadas em concursos ao longo de sua carreira. Nas letras, não faltam poesias em ode ao carnaval, garante: "O DVD é como um documentário, em que eu conto as histórias de como as músicas ocorreram, até culminarem com a elaboração deste projeto. A minha música surge como crônicas e tem como origem tudo o que eu faço e vivencio dentro dos blocos líricos". O lançamento está marcado para a da de seu aniversário de 75 anos, a partir das 19h, na ocasião mais apropriada possível: o acerto de marcha do Bloco da Saudade, agremiação da qual é membro desde 1979.
O início da relação de Getúlio com o frevo surgiu cedo, aos 9 anos de idade, quando ensaiava Capiba em um sax soprano na sua cidade natal, Camutanga, na Zona da Mata Norte de Pernambuco. Mas foi com a vinda ao Recife, em 1957, e o contato com o maestro Nelson Ferreira na TV e Rádio Clube que decidiu trocar o instrumento pelo violão e iniciou a trajetória como compositor e autor de frevos, aos 20 anos.
Do contato com o maestro Ferreira, nome por trás dos grandes estúdios e gravações da época, surgiu a música Você gostou de mim, estourada em 1963, fazendo Getúlio cair na boca do povo. Se ali ainda não tinha se entregado à paixão pelo carnaval, a declaração surgiu doze anos depois, com a composição de O bom Sebastião. "Eu fiz essa música em homenagem a outro grande nome do frevo, Sebastião Lopes, a música estourou e nunca mais eu larguei os blocos", relembra Getúlio.
Sobre a sua grande relevância para a cultura do frevo e do lirismo, os números não deixam mentir. Em seu vasto acervo de produções, o carnavalesco contabiliza dois LPs, 12 CDs e mais de 150 músicas já gravadas por intérpretes, de um montante de mais de 200 composições. Para ele, o segredo de tamanha produtividade é gostar do ofício: "Quanto mais a gente come poeira do carnaval, mais você tem vontade de estar nele".
Escute a música O último regresso, clássico de Getúlio Cavalcanti:
BLOQUISMO
Integrante devoto do que chama de Movimento Bloquista, Getúlio trava uma luta constante para garantir o espaço do lirismo no carnaval pernambucano. "O lirismo é o estado do sentimentalismo, não é piegas. Se ele é saudosista, é porque toca nos corações, o lirismo é para quem tem amor. E todo mundo ama", defende. O músico desmistifica ainda outro preconceito em relação aos blocos líricos: "eles não são apenas para a terceira idade".
Já honrado com o título de "Príncipe dos blocos", Getúlio recebeu, no último sábado (4), o título de "Rei dos artistas" durante cerimônia realizada no Baile dos Artistas: "É uma prova de que o trabalho ainda é, de alguma forma, reconhecido". Mas também não deixa de tecer duras críticas às gestões municipal e estadual pelo lugar destinado aos representantes da cultura popular no período de folia. "A gente sente que as autoridades não estão interessadas em frevo ou maracatu. Senão, o governo não contratava artistas de fora a preço de ouro pra tocar", questiona.
A forma como a celebração do maior festival da cultura pernambucana é estruturado hoje em dia também incomoda o autor. "Hoje as pessoas não saem no carnaval para brincar, elas saem para ver show. É por isso que eu não saio do chão, não deixo de pegar meu violão para comer poeira nos blocos. É na rua que o encanto acontece, quando encontramos os pierrôs, colombinas e palhaços", defende. "A beleza do carnaval é você ter todas as nuances do frevo e do maracatu. É ver a troça saindo e todo mundo pulando junto, cada um do seu jeito. E, pra isso, não é preciso cordão de isolamento nem abadá", emenda.
Para ele, o ponto alto do carnaval é o Encontro dos Blocos Líricos no Marco Zero do Recife, tradicionalmente realizado na segunda-feira de folia, que neste ano cai no dia 27 de fevereiro. Porém, mantém ressalvas em relação à curadoria da programação oficial do Recife: "O que eles querem fazer com a nossa cultura? A segunda deveria ser sagrada aos blocos", argumenta. O ideal, segundo conta, é que o dia fosse dedicado exclusivamente às agremiações e que, após o desfile, a noite encerrasse com shows de artistas relacionados à tradição.
Com números tão relevantes e uma longa trajetória, é de se esperar que o compositor tenha dificuldade em elencar grandes momentos em sua carreira, mas ele não titubeia: "A grande realização da minha vida é a gravação deste DVD, junto do povo". E não pretende parar com as realizações: em breve, deve iniciar a apresentação de um programa dedicado à cultura pernambucana, ao lado da filha e jornalista Alessandra Cavalcanti, em uma rádio local. "Vamos fazer um resgate da cultura pernambucana", arremata.
SERVIÇO
Lançamento do DVD Acerto lírico, de Getúlio Cavalcanti
Quando: sexta-feira (10), às 19h
Onde: Acerto de Marchas do Bloco da Saudade, na sede da AABB (Av. Doutor Malaquias, 204, Graças)
Quanto: DVD Acerto lírico, R$ 20, à venda na entrada do clube.
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