Música Carnaval 2017: 'Eu mereço esse tributo', diz Almir Rouche sobre homenagem Em entrevista, músico fala sobre ser reverenciado pelo Carnaval do Recife deste ano, junto com os Caboclinhos Carijós

Por: Larissa Lins - Diario de Pernambuco

Publicado em: 05/02/2017 15:21 Atualizado em: 05/02/2017 17:26

Almir Rouche planeja show de cerca de duas horas de duração para a abertura do carnaval e se considera merecedor da homenagem. Foto: Peu Ricardo/DP
Almir Rouche planeja show de cerca de duas horas de duração para a abertura do carnaval e se considera merecedor da homenagem. Foto: Peu Ricardo/DP

Almir Rouche tinha 16 anos quando subiu ao palco pela primeira vez. Ficou mais incrédulo do que nervoso, ele recorda, dada a reviravolta que aquilo provocou em sua vida. Alguns anos antes, matando tempo num barzinho próximo à sua casa, se arriscou a dividir o microfone com um amigo que animava as noites do local: nascia ali a relação dele com a música. Inclinação jamais incentivada pela mãe ou pela avó, com quem cresceu em Igarassu, na Região Metropolitana do Recife, onde nasceu, a atividade ganhou contornos profissionais naquela tarde. Foi se desenvolvendo durante bailes, festas, jantares em churrascarias da região.

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Almir se punha a cantar por divertimento. Depois, para contribuir com a avó, Josefa dos Santos, nas despesas de casa. A família era pobre, música parecia supérfluo, aventura. Mas ajudava a quitar as dívidas.
Esse é o começo de que Almir Rouche, hoje com 30 anos de trajetória artística e homenageado do Carnaval do Recife deste ano, se lembra ao tentar refazer os próprios passos.

Não teve referências, nem incentivo para dar início à carreira musical. “Foi dom. Não teve explicação”, ele diz. Conheceu as primeiras marchinhas de carnaval com a banda amadora Status, ainda na adolescência. O Galo da Madrugada lhe foi apresentado somente em 1987: até então, não havia dinheiro sobrando para a família viajar ao Recife e conhecer o bloco. Aquele era outro mundo, provocou nele encantamento imediato. “É uma honra ser homenageado quando comemoro três décadas de estrada. Passa tudo pela minha cabeça. Dos anos 1980 até hoje, lutei muito pelo frevo. Eu mereço esse tributo, e digo isso sem vaidade. Estou preparado para recebê-lo”, diz o músico.

Almir Rouche ingressou no ramo da música ainda na adolescência, em Igarassu. Foto: Peu Ricardo/DP
Almir Rouche ingressou no ramo da música ainda na adolescência, em Igarassu. Foto: Peu Ricardo/DP
A celebração dele, estendida para além da folia de Momo, será marcada pelo lançamento do álbum Rouche 30, previsto para a segunda semana de fevereiro. O disco reúne hits de antigos carnavais e inéditas de compositores que marcaram sua carreira como intérprete, como Jota Michilles e Rogério Rangel. O hino da cidade do Recife também foi repaginado por Almir. Está no novo projeto e no repertório da abertura do Carnaval do Recife, no dia 24 de fevereiro, no Marco Zero, Centro da cidade. Para o espetáculo, ele tranca de chave os detalhes: adianta somente que haverá participações especiais de nomes que marcaram sua atuação, com destaque para o Brasílica do Balé Popular do Recife, durante duas horas de show. Além da abertura, sobe a palcos descentralizados e anima prévias e blocos até o fim do mês.

Ele se diz honrado, mas sobretudo seguro, diante da homenagem anunciada em dezembro pela Prefeitura do Recife - compartilhada com os Caboclinhos Carijós, também celebrados na festa deste ano. “Quando pus 80 passistas de frevo sobre um trio elétrico no Recifolia, será que ninguém viu? O público entendeu o meu incentivo ao frevo, a minha luta por valorizar manistações da cultura popular local. Nós éramos pernambucanos defendendo o estado naquele trio. Sempre tentei fortalecer o frevo, os caboclinhos, maracatus... A homenagem não é minha, mas nossa. Represento toda uma geração formada por nomes como Marrom Brasileiro, André Rio, Gustavo Travassos. Vou representá-los”, avalia o intérprete.

>> NOVO DISCO
Rouche 30 revisita sucessos de carnavais passados e inclui as inéditas A máscara caiu, de Jota Michilles, e Além da quarta-feira, de Rogério Rangel. As faixas são variações do frevo de rua e de bloco. O disco também registra nova versão do hino da cidade do Recife, sugerido a Almir pelo ex-secretário de Turismo e Lazer do Recife, Camilo Simões, morto em outubro do ano passado.

>> ENTREVISTA: Almir Rouche, músico

A que atribui a escolha do seu nome como homenageado?

Modéstia à parte, se você analisar meus trabalhos do fim da década de 1980 até o ano 2000, verá que eu sempre luto muito pelo frevo, pelo coco de roda, pelos caboclinhos... Eu mereço, sim. Tenho certeza disso. E isso não me envaidece. Quando falo que mereço, é porque a minha geração merece. Fizemos um movimento pela cultura popular.

Conhecia os Caboclinhos Carijós? Qual sua relação com os outros homenageados?
Minha relação, não somente com os Carijós, mas todas as manifestações culturais de caboclinhos e outras agremiações tradicionais, é de muito respeito. É nosso dever lutar para que essas agremiações tenham mais valor junto à iniciativa privada do que têm hoje. Eles, na verdade, são os donos da festa. São os donos do carnaval. Se não tiver um incentivo do governo, esse pessoal se extingue. E nossas tradições morrem, viram folclore. Não podemos deixar isso acontecer. O governo incentiva, a prefeitura incentiva.mas falta apoio das grandes marcas. A iniciativa privada não valoriza esses grupos, insiste numa visão arcaica. E ninguém pode viver de incentivo do governo o tempo todo.

Como começou sua relação com a música? E com o carnaval?
Com 10 anos de idade, participei de um festival na escola onde estudava, a Beatriz Lopes, em Igarassu. Voltei no ano seguinte para o mesmo festival, foi quando tirei primeiro lugar cantando Clara Nunes. Comecei a cantar em barzinhos, churrascarias. Um dia, um cara me descobriu numa churrascaria e falou que haveria testes para fundar um grupo chamado Turma do Pinguim. Fiz o teste, eu tinha 16 anos. Passei 13 anos com a Turma do Pinguim, foi como descobri o carnaval e me apaixonei pela festa. Até que, no ano 2000, saí do grupo para me dedicar à carreira solo. Chega um momento em que todo mundo sente necessidade de deixar a zona de conforto, assumir novos desafios.

Como foi seu processo de formação profissional? Como “se fez” cantor?
Minha grande escola foram os bailes. Quando comecei a me entender por gente, já no meio musical, fui estudar técnica vocal, me aperfeiçoar. Mas eu nunca tive nenhum músico na família para me orientar, me incentivar. Comecei intuitivamente, espontaneamente. Os bailes me moldaram.

Você foi bastante associado à micareta Recifolia e, por isso, houve quem comentasse achar injusta a homenagem no carnaval deste ano. O que pensa sobre isso?
A polêmica que houve foi criada por pessoas desinformadas. O Recifolia era um evento baiano onde um pernambucano oriundo do Ballet Brasílica, que é a escola do Ballet Popular do Recife, que por acaso é também cantor, representou o estado naquele evento. Fui eu. Eu tive a ideia de colocar 200 bailarinos sobre o nosso trio elétrico, o trio da Turma do Pinguim, da qual eu fazia parte. Criei, com esses bailarinos, o grupo Acertando o Passo. Colocamos todos eles na frente do trio. Não conseguimos colocar 200, mas colocamos 80. Fizemos o Bloco do Pinguim, tocamos frevo, caboclinho, maracatu. Nós representávamos Pernambuco num evento baiano. Fizemos um sucesso tão grande que, nos anos seguintes, vieram outros pernambucanos e começamos a dar caldo. Quando falei que apoiava a volta do Recifolia, há alguns anos, as pessoas me condenaram. Mas elas não leram o que eu disse. Eu disse que, caso voltasse, o Recifolia deveria ter 80% da grade dedicada à música pernambucana. Quem faz esse tipo de polêmica comigo é mal informado.

O que achou da convocatória do governo do estado para o carnaval, na qual brega, forró eletrônico, pagode e funk não foram considerados aptos à grade oficial da programação?
Achei importante. Não é uma proibição. Quem quiser contratar, pode contratar, eles só deixam claro que a contratação não caberá ao governo. Acho justo. O brega, por exemplo, toca o ano todo. E se não tomarmos cuidado, o frevo, o maracatu e o caboclinho vão virar folclore. Isso é uma defesa das nossas tradições. Carnaval são só quatro dias, sabe? O que são quatro dias diante dos outros 360? Eu acredito que é proibido proibir. Mas o governo não proibiu, ele deu preferência. Então tudo bem.

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