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Artes visuais
Livro sobre história das artes visuais recifenses nos anos 1990 é lançado neste sábado
Publicação também marca o início das atividades da Zanzar Editora, fundada pela pesquisadora Maria Alice Amorim
Publicado: 28/01/2017 às 09:30

Jane Pinheir (à esq.), autora do livro, e Maria Alice Amorim, fundadora da Zanzar Editora. Crédito: Gabriel Garcia/Divulgação/
Os anos 1990 foram especialmente prolíficos para as artes na capital pernambucana. A época marca a existência de uma autoestima maior por parte dos artistas com o sucesso do movimento mangue, a busca por uma profissionalização maior dos espaços expositivos e, ao mesmo tempo, a liberdade encontrada para realizar obras de teor mais conceitual e experimental. A tudo isso, se somou a vocação local para a formação de coletivos artísticos, exercitada desde meados do século 20. A riqueza desse período é documentada no livro Arte contemporânea no Recife dos anos 1990, de Jane Pinheiro, cujo lançamento acontece às 16h deste sábado, no Museu da Cidade do Recife.
A publicação é, na verdade, produto da dissertação de mestrado em Antropologia da professora de audiovisual e artes visuais do Colégio de Aplicação da UFPE. O evento marca também o início das atividades da Zanzar Edições, capitaneada pela escritora e pesquisadora Maria Alice Amorim. O livro tem 316 páginas e recebeu o prêmio de melhor ensaio no 45° Salão de Artes Plásticas de Pernambuco 2002/2003. No entanto, o trabalho acadêmico não foi publicado no período e a opção de Jane foi deixar a obra em compasso de espera até agora. “Essa pesquisa foi feita ainda nos anos 90, e eu tinha a preocupação inicial de saber como as pessoas recebiam a arte contemporânea. Comecei acompanhando exposições, mas percebi que estava imersa em um momento histórico muito importante. A produção de arte local estava entrando no cenário nacional de uma outra forma. Este é o livro de uma pessoa que testemunhou tudo isso”.
A obra mostra o quanto a união entre artistas produtivos e instituições fortes preparou o terreno para catapultar a produção posterior em Pernambuco, a partir dos anos 2000, ao contrário da conjuntura atual, na qual se vê um enfraquecimento ou extinção dos locais que antes recebiam mostras. “Tínhamos o Movimento Mangue, a criação do Museu de Arte Moderna Aloisio Magalhães, em 1997, o Instituto de Arte Contemporânea e o Instituto de Cultura da Fundação Joaquim Nabuco, que promoveu muitos cursos. Os críticos de fora vinham ao Recife e visitavam os ateliês dos artistas, e isso foi muito importante para mostrar a consistência do trabalho deles”, recorda Jane.
O livro tem edição bilíngue, com projeto editorial bem cuidado, financiado pelo Funcultura, e seu conteúdo traz, inclusive experimentações formais. Um dos capítulos é totalmente formado por imagens. Esta será uma das marcas das próximas obras lançadas pela editora, segundo Maria Alice Amorim. “A autora concebeu o livro inteiro dentro de uma perspectiva antropológica e as fotografias presentes nele foram registros ela mesma. Isso tem a ver com nossa proposta de lançar livros artísticos e sobre arte de maneira artesanal”.
Ao longo da obra, também estão depoimentos e análises sobre três objetos de estudo: o Grupo Camelo, formado na época por Ismael Portela, Marcelo Coutinho, Paulo Meira, Jobalo, Oriana Duarte e Renata Pinheiro, a artista visual Betânia Correia de Araújo, atual diretora do Museu da Cidade do Recife, e o Grupo Carga e Descarga, composto por Flávio Emanuel, Maurício Silva, Márcio Almeida e Dantas Suassuna. “Publicamos o liro como se fosse um documento histórico. Optamos por deixá-lo como foi entregue em 1999, somente com alguns ajustes. A lacuna é imensa, pois não estamos em um centro de poder. Não há muito material sobre arte contemporânea, especialmente nesse viés. Paulo Bruscky, por exemplo, cria desde os anos 60, mas os primeiros livros críticos sobre ele só saem nos anos 2000”.
SERVIÇO
Lançamento do livro Arte contemporânea no Recife dos anos 1990, de Jane Pinheiro
Quando: Sábado (28), às 16h
Onde: Museu da Cidade do Recife - Forte das Cinco Pontas, s/n, Bairro de São José
Entrada Gratuita
Preço do livro: R$ 40
Informações: 3355-9558
MAIS LIVROS SOBRE A HISTÓRIA DA ARTE PERNAMBUCANA
UTOPIA DO OLHAR, DE RAUL CÓRDULA
A publicação, lançada em 2013, mostra como surgiu a vocação plástica em Olinda, que passou a receber artistas das mais variadas correntes a partir dos anos 50. A obra, cuja tiragem é de mil exemplares, faz uma linha do tempo informal e recapitula nomes importantes na história recente da Cidade Patrimônio, como o ex-prefeito Eufrásio Barbosa. Além disso, cita locais, como o Museu de Arte Contemporânea de Pernambuco (MAC), que fomentavam esse circuito local. Os nomes de vários artistas citados estão dispostos em eixos temáticos, que englobam, por exemplo, a pintura de paisagem e o olhar feminino.
CARTOGRAFIA DAS ARTES PLÁSTICAS NO RECIFE DOS ANOS 80 - DESLOCAMENTOS POÉTICOS E EXPERIMENTAIS, DE JOANA D'ARC DE SOUZA LIMA
Publicado em 2014, o livro é o desdobramento de uma tese de doutorado e faz uma análise de como os artistas mais jovens em atividade no Recife trouxeram uma oxigenação no modo de fazer e compreender a arte na cidade, além de um mapeamento de lugares onde se fazia e exibia esse trabalho. As brigadas de pintura que tomavam as ruas, a apreciação teórica e crítica dessa produção e a relação dela com os artistas já estabelecidos estão entre os temas abordados.
DEPOIMENTOS
RENATA PINHEIRO, cineasta e artista visual
Fui convidada para entrar no Grupo Camelo logo após chegar da Inglaterra, onde fiz uma especialização. Essa foi uma forma de me atualizar com relação à produção local, que era pequena, mas intensa. A troca entre quem participava era muito frutífera e o mérito dessa interação é aprender com o outro. Eu vi com muitas referências de fora, da arte britânica que estava em grande evidência na época. Trabalhei no primeiro ano do Instituto de Arte Contemporânea e ajudava na programação de workshops e exposições. Foi uma porta que se abriu no Bairro do Recife e havia uma esperança geral de que esta fosse uma parte da cidade aberta ao convívio entre turistas, artistas e público.
BETÂNIA CORREIA DE ARAÚJO, diretora do Museu da Cidade do Recife
A ideia de publicar esse trabalho é muito importante por documentar o surgimento de ateliês coletivos como a Quarta Zona e citas a instalação de vários artistas na Rua Alfredo Lisboa, no Bairro do Recife. Tive ateliê lá e o frequentava na hora do almoço, no intervalo do meu trabalho em uma construtora. Foi um momento bastante intenso. Depois, comecei a trabalhar no poder público como curadora e sou gestora do Museu da Cidade do Recife há 12 anos. Não houve uma continuidade na minha produção artística e esse momento me faz pensar em uma reaproximação minha disso. Por outro lado, o trabalho que faço no museu tem muito do olhar de uma artista. Essa faceta sempre está presente em mim, mas talvez esteja esperando renascer. Fico feliz em que ele seja lançado no museu onde trabalho e espero que esse livro possa estimular a produção de outras obras.
MÁRCIO ALMEIDA, artista visual
Os anos 90 foram uma das melhores épocas para a produção artística local. Em primeiro lugar, pelo experimentalismo. Antes, éramos ratos de ateliê, explorando as possibilidades do fazer artístico e para os artistas dos anos 80 e 90, esse momento foi muito importante. Por outro lado, há cerca de 20 anos, houve um início de profissionalização do setor, com a vinda de curadores de fora, então este foi um momento um pouco contraditório. O livro fala de dois grupos, o Carga e o Descarga, do qual fiz parte e o Grupo Camelo e a representação dos dois mostra as diferenças de abordagem. Enquanto o primeiro trazia uma questão prática e material muito forte, o segundo tinha o lastro da academia. A aproximação entre os dois foi responsável por despertar em mim essa questão mais conceitual dentro do meu trabalho.
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