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Legado Carnaval 2017: Sem Naná, abertura será feita de forma coletiva Pela primeira vez, mestres de 12 nações de maracatu vão reger cortejo até o Marco Zero

Por: Larissa Lins - Diario de Pernambuco

Publicado em: 03/01/2017 08:17 Atualizado em: 04/01/2017 10:14

Sem Naná Vasconcelos, nações de maracatu se reunirão em cortejo até o Marco Zero na abertura do carnaval. Foto: Diego Nigro/Divulgação
Sem Naná Vasconcelos, nações de maracatu se reunirão em cortejo até o Marco Zero na abertura do carnaval. Foto: Diego Nigro/Divulgação


O multi-instrumentista pernambucano Naná Vasconcelos falava, entre pessoas próximas, da preocupação quanto à “morte” dos maracatus. O ano era 2001, e ele decidiu articular cortejo de diferentes nações de baque virado na abertura do carnaval do Recife.

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Junto aos grupos, desfez rusgas entre as agremiações e estabeleceu uma nova tradição no calendário local, reconhecida internacionalmente. Seguido por 12 grupos folclóricos, Naná percorreu o trajeto entre a Rua da Moeda e o Marco Zero, no Bairro do Recife, todos os anos até sua morte, em março passado. Após 15 carnavais, o cortejo desfila sem o mestre pela primeira vez em fevereiro deste ano. Formato e percurso devem ser mantidos, mas cada mestre assumirá a regência de sua própria nação: a figura de Naná, eles concordam, não pode ser substituída.

Trinta prévias carnavalescas já confirmadas


Participações especiais serão mantidas - nos últimos anos, o percussionista recrutou nomes como Lenine, Sara Tavares, Elba Ramalho e Fafá de Belém para participar do cortejo -, mas ainda não foram definidas. A dinâmica da abertura do carnaval ganha contornos mais definidos amanhã, quando representantes da Prefeitura do Recife se reúnem com os mestres dos maracatus e a produtora Patrícia Vasconcelos, viúva de Naná. “Ele deixou claro que não queria um substituto. O cortejo é um legado que Naná deixou para os mestres, eles devem assumir sua função de modo colaborativo. Vão mostrar ao mundo a autonomia que Naná lhes ensinou”, avalia Patrícia, que procurou a prefeitura com o pedido de não escalarem outro músico para o lugar do companheiro.

Naná regeu o tradicional cortejo de maracatus por 15 carnavais. Foto: Roberto Ramos/DP
Naná regeu o tradicional cortejo de maracatus por 15 carnavais. Foto: Roberto Ramos/DP
A participação dos caboclinhos, recrutados para o cortejo pela primeira vez no ano passado, não foi confirmada. Já o grupo percussivo Voz Nagô, com quem Naná dividiu o palco por oito anos, terá papel fundamental nas mudanças. “Os caboclinhos estão desaparecendo. Ninguém os vê, ninguém presta atenção. Essa é uma maneira de mostrar sua riqueza, o valor da miscigenação cultural”, disse o regente ao Viver quando decidiu agregá-los ao desfile, em janeiro de 2016.

Para o Mestre Chacon, à frente do Maracatu Nação Porto Rico, a regência coletiva deve contribuir para que os grupos se mantenham unidos. “Cada mestre coordenará sua nação, e nós tentaremos unificá-las. Toda a abertura será dedicada a Naná, com projeções em telões e cantos do Voz Nagô”, revela Chacon, amigo pessoal do percussionista, engajado no cortejo desde a primeira edição.

A ideia de agregar as vozes femininas do grupo percussivo Voz Nagô, peça-chave do cortejo, aos maracatus partiu do próprio Naná, em 2009. “Visitávamos todas as comunidades onde nasceram as nações de maracatu, ensaiando semanalmente nas sedes deles e na Rua da Moeda, de onde seguíamos em cortejo na abertura do carnaval”, conta Nalva Silva, integrante do grupo formado por sete mulheres. Ela aguarda, agora, as definições oficiais da prefeitura para articular os primeiros ensaios com os mestres. Eles têm oito semanas para afinar os tambores: a abertura do carnaval do Recife está marcada para o dia 24 de fevereiro.

“Cada mestre comandará o ensaio na sede do seu maracatu. Os ensaios gerais devem ser comandados pelas meninas do Voz Nagô e devem ser mantidos na Rua da Moeda”, detalha Anderson dos Santos, presidente do Maracatu Nação Encanto da Alegria, outra das 12 agremiações envolvidas na festa. Ele vê a apresentação como vitrine para a tradição popular do estado: “É nossa forma de mostrar que, apesar da enorme perda, estamos ali, firmes e fortes.”

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2016

No último carnaval de Naná Vasconcelos, o pernambucano Lenine e a cantora portuguesa radicada em Cabo Verde Sara Tavares foram os convidados do percussionista. Eles acompanharam o cortejo de maracatus - acrescido, pela primeira vez, de grupos de caboclinhos. Sara foi apresentada aos grupos folclóricos na semana que antecedeu o carnaval, em ensaio geral na Rua da Moeda, no Bairro do Recife.

2015
A cantora cabo-verdiana Lura dividiu o palco com a paraense Fafá de Belém e a paraibana Elba Ramalho. As três artistas foram convidadas por Naná para seu décimo-quarto cortejo de abertura do carnaval. Juntas, elas subiram ao palco do Marco Zero e homenagearam a música africana, os ritmos paraenses e as raízes do maracatu.

2014
O rapper carioca Marcelo D2 e o pernambucano Zé Brown foram escalados por Naná para a abertura da festa. A ideia, ele anunciou à época, era misturar rap e maracatu. Os dois convidados cantaram juntos músicas como Desabafo e Qual é?.

Duas perguntas: Nalva Silva, integrante do Voz Nagô

Grupo Voz Nagô acompanhou Naná por oito anos. Foto: João Rogério Filho/Divulgação
Grupo Voz Nagô acompanhou Naná por oito anos. Foto: João Rogério Filho/Divulgação
Como era a relação de Naná Vasconcelos com o grupo? E com o cortejo de maracatus?

Era uma relação afetiva, de respeito, orgulho. Ele tinha muito carinho pela cultura pernambucana. Nos contava que o maracatu estava quase morrendo, sendo pouco reconhecido pelos pernambucanos, quando ele decidiu resgatá-lo. Em 2001, surgiu nele a vontade de reerguer os maracatus. A abertura era sua melhor alternativa para isso, por se tratar de uma grande vitrine, nacional e internacional. Ele tinha um carinho grande não somente pelos maracatus, mas pelos afoxés, caboclinhos... No último carnaval, os caboclinhos participaram, também com o intuito de que fossem mais valorizados pelos próprios pernambucanos. Eles estavam muito enfraquecidos.

Como era organizado o cortejo? Como ele vencia o desafio de reger 12 nações diferentes?
Esse formato da abertura com o cortejo existiu durante 15 anos, e o Voz Nagô participou durante oito. Havia todo um contato com os maracatus nas suas comunidades, o que era importantíssimo. Um mês antes do carnaval, já havíamos visitado todas as comunidades onde eles foram criados. Fazíamos ensaios nas próprias sedes. Ao fim de cada semana, uma parte dos maracatus, geralmente três deles, se reunia na Rua da Moeda e ensaiava. Na semana pré-carnavalesca, havia dois ensaios gerais no Marco Zero. Íamos construindo a apresentação conjunta, nos afinando. Até o cortejo oficial, quando saíamos da Rua da Moeda para o Marco Zero. O Voz Nagô entrou no projeto para dar voz às loas (cantos) tradicionais dos maracatus.

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