Cinema Suspense A garota no trem coloca em evidência o limite entre voyerismo e obsessão Adaptação cinematográfica do livro beste-seller escrito por Paula Hawkins estreia nos cinemas com Emily Blunt no papel principal

Por: Bárbara Valdez

Publicado em: 27/10/2016 17:05 Atualizado em: 27/10/2016 16:31

Em meio à multidão, cada um tem segredos a revelar. Foto: Universal/Divulgação
Em meio à multidão, cada um tem segredos a revelar. Foto: Universal/Divulgação


Por quantas pessoas você nutre curiosidade a ponto de parar para observá-las no dia a dia? E se o hábito vira um vício difícil de se desvencilhar? Em cartaz nos cinemas a partir de hoje, o filme A garota no trem usa o suspense para tratar do limite entre o interesse pelo outro, presente no voyeurismo, e a obsessão doentia. A trama, adaptada do best-seller homônimo da escritora Paula Hawkins, se desenvolve tomando como base três mulheres e o desaparecimento de uma delas - história narrada à base de tensão psicológica e reviravoltas.

Confira o roteiro de cinema no Divirta-se

Dirigida pelo norte-americano Tate Taylor (Histórias cruzadas, também baseado em um romance), a produção é uma das adaptações mais aguardadas de 2016. O livro original, antes mesmo de ser lançado, em janeiro de 2015, já estava com os direitos vendidos para a DreamWorks. O produtor Marc Platt leu o manuscrito e decidiu levar ao cinema a história de Rachel (interpretada no filme por Emily Blunt), Megan (Haley Bennett) e Anna (Rebecca Fergunson).

A história essencialmente feminina trabalha os medos, abusos e papéis de gênero na sociedade em meio ao clima de mistério. A força das mulheres, realçada nas cenas, torna a produção contemporânea do debate sobre protagonismo sexual na sociedade. O enredo retoma um artifício que não vinha aparecendo em longas: o olhar do voyeur. Com um orçamento em torno de US$ 45 milhões, A garota no trem já arrecadou mais da metade do investimento apenas no fim de semana de estreia nos Estados Unidos e no Canadá, faturando US$ 24,7 milhões.

O filme é narrado sob o olhar de Rachel, dependente de bebidas alcoólicas após um divórcio traumático. Ela observa diariamente, da janela do trem usado para ir ao trabalho, a antiga casa na qual o ex-marido Tom (Justin Theroux) vive com a nova mulher Anna. Ao mesmo tempo, passa a se fixar em Megan e Scott (Luke Evans), idealizando a relação perfeita do casal. Um dia, a protagonista vê algo diferente pela janela e logo depois descobre que Megan desapareceu. De espectadora, torna-se a principal suspeita de um crime.

A linha tênue que separa um observador de um obsessivo remonta ao clássico Janela indiscreta (1954), de Alfred Hitchcock. No filme, um homem que aprecia pessoas da janela do próprio apartamento acredita ter presenciado um crime e decide descobrir a verdade a todo custo. O conteúdo da cena, com leves alterações, pode ser transposto para A garota no trem. Erin Cressida Wilson (A pele), roteirista de A garota, define a história de Paula Hawkins como uma "Janela indiscreta em movimento".

A adaptação da versão literária para o cinema, feita por Erin e Jared Leboff, tem poucas alterações sobre o texto original. Duas das mais marcantes foram a mudança do cenário londrino para as ruas de Nova York e o enfoque narrativo no ponto de vista de Rachel - que, no livro, divide mais espaço com Megan e Anna. Na direção, Taylor trabalha movimentos de câmera que focam ou embaçam as imagens, com cortes abruptos - suporte para o espectador entrar na experiência nebulosa e fragmentada da trama.

A garota no trem tem boas interpretações e se propõe a fazer refletir sobre como a percepção da realidade pode ser distorcida por fatores como um relacionamento abusivo. Os pontos negativos ficam, em certa medida, por conta da aura de inércia das protagonistas, da artificialidade das reviravoltas e da ausência de aprofundamento das tramas. Análises à parte, é certo: no filme, todos têm segredos e só um olhar mais próximo revela detalhes que o voyeur, à distância, não consegue notar.

Confira o trailer do filme:



Emily em carreira ascendente na tela

Visibilidade internacional surgiu em O Diabo Veste Prada. Foto: John Phillips/Divulgação
Visibilidade internacional surgiu em O Diabo Veste Prada. Foto: John Phillips/Divulgação


Emily Blunt não deixa a desejar. De início, entorpecida e sem voz para o mundo, a personagem evolui em expressão e postura à medida que consegue enxergar com clareza os acontecimentos ao redor. De origem inglesa, a atriz tem passagem por filmes como A filha de Gideon (2005), produzido pela BBC e pelo qual conquistou o Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante. Com O diabo veste Prada (2006), ganhou reconhecimento internacional. Em 2009, interpretou a majestade da Inglaterra em A jovem rainha Vitória - filme lhe rendeu uma indicação ao Globo de Ouro e o prêmio do Critics Choice Awards. No início de 2016, estrelou com Chris Hemsworth e Charlize Theron a fantasia O caçador e a rainha do gelo, com interpretação consistente. Até 2018, Blunt está escalada para dublagens de três animações, além de ter recebido o papel de Mary Poppins, na continuação da história da Disney, A volta de Mary Poppins.

O livro

A garota no trem (Record, 378 páginas, R$ 37,90) é narrado sob a perspectiva de três mulheres cujo elo é Tom, ex-marido de Rachel, atualmente casado com Anna e que contratou Megan como babá. A obra de suspense se tornou sucesso e figurou na lista dos mais vendidos do The New York Times por um ano, com tiragem atual de aproximadamente 15 milhões de exemplares vendidos. A autora Paula Hawkins é jornalista e criou a história enquanto andava de trem por Londres, observando as pessoas pela janela na expectativa de ver cenas interessantes. Como nunca aconteceu nada que lhe chamasse a atenção, disse, criou a própria história. No Brasil, o livro chegou em 2015. 

Voyeurs no cinema

Janela indiscreta
(1954)
Obra-prima de Hitchcock, foi inspirada num conto do norte-americano Cornell Woolrich, autor e roteirista de cinema. Foi escrito em 1942 e tem narrativa com humor negro, que se complica a cada momento.

Invasão de privacidade (1993)
Com ares de erotismo, narra série de assassinatos em um prédio de luxo, onde os moradores são vigiados. Com Sharon Stone, se baseia no romance Sliver, de Ira Levin (O bebê de Rosemary).

The voyeur (2016)
Livro publicado neste ano pelo jornalista Gay Talese apresenta caso real de voyeurismo no qual o dono de um motel observou os hóspedes por anos via um buraco nos quartos. A DreamWorks comprou os direitos (a produção será de Steven Spielberg).



Acompanhe o Viver no Facebook:


MAIS NOTÍCIAS DO CANAL