Transexualidade A vida além dos rótulos: série de João Jardim discute questões de gênero 'Liberdade de gênero' estreia hoje no GNT com histórias reais de transgêneros, com ênfase nos relatos de superação

Por: Rebeca Oliveira - Estado de Minas

Publicado em: 19/10/2016 10:02 Atualizado em:

Amanda Guimarães, João Jardim e irmã da youtuber Melissa: família como rede de apoio surpreende na abordagem da série Liberdade de gênero. Foto GNT/Divulgação
Amanda Guimarães, João Jardim e irmã da youtuber Melissa: família como rede de apoio surpreende na abordagem da série Liberdade de gênero. Foto GNT/Divulgação


"Às vezes, eu fazia xixi só uma vez por dia para evitar ir ao banheiro e tocar meu pênis". A sentença dolorosa diz muito sobre como é, hoje, a vida de uma pessoa transgênero no Brasil. Amanda Guimarães, uma transexual de 28 anos de Gravataí, no Rio Grande do Sul, abria mão das necessidades básicas para não confrontar-se com o sexo em que nasceu, mas que não se identificava. Até fazer a cirurgia de redesignação sexual, a jovem youtuber passou por momentos traumáticos e de tomada de decisões. Vivências que agora, se tornam públicos na série Liberdade de gênero, com estreia hoje no GNT.

Amanda é uma das 10 personagens escolhidas pelo documentarista João Jardim, que percorreu de Norte a Sul do país em busca de boas histórias. No primeiro episódio, percebe-se que o vigor presente em projetos anteriores - como a série Amores livres, sobre relações poliamorosas - se repete. No entanto, dessa vez o fator social vai além do preconceito. Trata-se de um registro urgente em uma sociedade marcada pela violência contra transgêneros. Mais que causar medo, o obscurantismo com que o tema é tratado oprime. O ódio também mata.

"A gente sempre notou que ela era diferente", diz o relato da irmã de Amanda. A descontração com que a família da primeira personagem encarou o assunto em frente às câmeras difere da ideia de que a descoberta é, necessariamente, traumática e dolorosa. Como, de fato, ainda acontece na maioria das famílias. "Normalmente, temos a imagem dos trans como pessoas que não têm relações afetivas sólidas. Fomos pelo lado oposto, mostramos trans que têm família, parceiro, boa relação com pais e irmãos", explica o diretor.

Ninguém precisa aceitar, só respeitar. A mensagem prevalecerá nos episódios, que vão ao encontro do debate que prega: não são os órgãos sexuais que definirão quem você é. Sexo, orientação sexual e gênero são coisas diferentes e ficam evidentes na atração, exibida sempre às quartas, às 21h30. "Há uma questão específica porque elas não se identificam com o gênero pelo qual elas foram designadas biologicamente. Elas são iguais a gente, e estão mais próximas do que se imagina. A visão estereotipada é que a pessoa muda de gênero para poder se relacionar com pessoas de outro gênero. Não tem nada a ver", conta.

Entenda

Em dicionariodegeneros.com.br, parceria do Afroreggae com a agência Artplan, foi montado um conteúdo multimídia e colaborativo que difere questões de gênero e de sexualidade. Os verbetes foram escritos por quem se define fora do padrão, como uma maneira de dar voz a quem, até então, era marginalizado socialmente por não se encaixar em um estereótipo preconcebido pela sociedade.

Duas perguntas // João Jardim  
Os trans enfrentam preconceito até mesmo no meio LGBT. Como trabalhar com temática tão sensível e urgente?

Precisei estudar e me preparar para fazer a série. Esse patrulhamento que existe dentro do próprio meio trans e LGBT é muito forte, de dizer que você não é trans porque não mudou o corpo. O que a tentamos mostrar, por isso o nome da série, é que as pessoas precisam de liberdade de se identificar com aquilo que elas mais se apropriam e são, não precisam seguir nenhum rótulo.

Qual recorte que fez nos casos escolhidos para a produção?

Temos casos que são mais duros, mas procuramos por um olhar diferenciado, trazer pessoas que conseguiram superar as dificuldades e serem aceitas. Uma questão grave é a da empregabilidade dos transgêneros, ainda muito baixa. Amanda fala, no episódio, que só poderia trabalhar em telemarketing. Elas têm pouca oportunidade de trabalho. Tentemos mostrar que é possível ter uma vida normal. Não escolhi, por exemplo, personagens que tenha sofrido violência física, pelo contrário. Elas têm orgulho e falam que foi difícil, sofreram muitas humilhações, mas que isso as fizeram mais fortes.

Acompanhe o Viver no Facebook:


MAIS NOTÍCIAS DO CANAL