Cinema Comissão que escolherá representante do Brasil no Oscar tem opositor do filme Aquarius Crítico paulista Marcos Petrucelli tem atacado o cineasta Kleber Mendonça Filho com ironias por causa de discordâncias políticas, antes mesmo de ver o longa-metragem. Ele foi indicado pelo secretário do audiovisual, Alfredo Bertini, que é pernambucano. Aquarius entra em cartaz nos cinemas em setembro

Por: Júlio Cavani - Diario de Pernambuco

Publicado em: 11/08/2016 18:05 Atualizado em: 12/08/2016 13:24

Participação de Sonia Braga no papel da protagonista pode favorecer o filme no Oscar. Foto: Victor Jucá/ Divulgação
Participação de Sonia Braga no papel da protagonista pode favorecer o filme no Oscar. Foto: Victor Jucá/ Divulgação
 
Por causa da repercussão internacional já conquistada, o longa-metragem pernambucano Aquarius, que concorreu à Palma de Ouro no Festival de Cannes, é o mais forte candidato para ser indicado como representante brasileiro na disputa por uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2017. A presença do crítico Marcos Petrucelli na comissão que fará a escolha, entetanto, demonstra que empecilhos podem surgir para o longa-metragem pernambucano, dirigido por Kleber Mendonça Filho, que tem Sonia Braga como atriz principal.

A comissão é indicada pelo Ministério da Cultura por meio da Secretaria do Audiovisual, que atualmente é comandada pelo pernambucano Alfredo Bertini, conhecido por ser um dos responsáveis pela realização do festival Cine PE nos últimos 20 anos. Os nomes dos integrantes do grupo foram anunciados no dia 3 de agosto.

Membro da comissão, Petrucelli, que ainda não viu Aquarius, tem usado as redes sociais, nos últimos meses, para atacar Kleber Mendonça Filho. Pelo twitter, por exemplo, ele disse que a equipe do filme expôs o Brasil "ao ridículo" no Festival de Cannes ao protestar contra o governo de Michel Temer. No facebook, o jornalista afirmou que o longa-metragem será exibido no Festival de Gramado fora de competição porque "bateu aquele medão de não ser premiado no Brasil".

Em maio, em outro comentário público, Petrucelli chegou a insinuar que o governo federal "provavelmente" financiou a ida de 30 pessoas do filme a Cannes com dinheiro público, uma especulação inverídica, já que apenas três representantes receberam passagens aéreas garantidas por um edital da Agência Nacional do Cinema (Ancine), além de um assistente de direção que por coincidência foi ao evento para apresentar um curta-metragem. Os demais foram ao festival com o próprio dinheiro, sem patrocínios ou apoios governamentais. Alguns chegaram a dormir no chão durante a estadia em apartamentos alugados por meio do Air BNB divididos entre até nove pessoas da equipe. Ele também escreveu que os artistas que trabalharam em Aquarius foram "tirar férias na Riviera Francesa", sem levar em conta o caráter profissional da presença deles no evento.

Nesta quinta, pelo Facebook, Kleber Mendonça Filho prometeu que divulgará um texto com comentários sobre a escolha da comissão por causa da presença do crítico.

Além de Petrucelli, os componentes da Comissão Especial são Adriana Rattes, Beto Rodrigues, George Torquato Firmeza, Guilherme Fiuza Zenha, Ingra Liberato, Silvia Maria Sachs Rabello, Sylvia Regina Bahiense Naves e Paulo Menelau (pernambucano e dono dos cinemas Moviemax Eldorado, Royal e Rosa e Silva).

Por meio de um texto publicado pelo jornal Folha de São Paulo, Marcos Petrucelli alegou que a preocupação não tem fundamento, pois a comissão é formada por nove pessoas. Ele disse que só vai julgar Aquarius depois de assistir e também afirmou que a participação em Cannes não necessariamente faz do filme um candidato natural à indicação, pois os finalistas do Oscar não costumam coincidir com os consagrados em Cannes.

Durante o Festival, em maio, Aquarius ficou entre os cinco filmes que tiveram melhor avaliação entre os críticos presentes em Cannes, apesar de não ter sido premiado. Alguns até cogitaram que Sonia Braga merece concorrer ao Oscar de Melhor Atriz. Ela é uma das atrizes brasileiras mais conhecidas nos Estados Unidos, onde mora, e interpretou a personagem do título de O beijo da Mulher-Aranha, que recebeu quatro indicações ao Oscar (venceu a estatueta de melhor ator, entregue a William Hurt).

Nos últimos anos, entre os filmes brasileiros, apenas Que horas ela volta? (premiado em Berlim e Sundance) e O menino e o mundo (indicado ao Oscar de melhor animação e vencedor de Annecy) tiveram uma repercussão internacional equivalente. Em 2013, O som ao redor, também dirigido por Kleber Mendonça Filho, foi o representante do Brasil na pré-seleção do Oscar e chegou a ser citado como um dos favoritos por críticos norte-americanos.

Petrucelli também afirmou que não tem nada contra Kleber Mendonça Filho enquanto cineasta. A "contrariedade" dele em relação ao diretor seria relativa especificamente à questão do protesto contra Temer. Para o crítico, "a esquerda cinematográfica, a turma do realismo lulista no cinema nacional, busca incessantemente patrulhar e se vitimizar".

Feita por Bertini, a escolha de Petrucelli, contudo, tem sido interpretada como uma punição do governo federal contra Kleber por causa do protesto em Cannes, como uma forma de censura à liberdade de expressão dos artistas comparável a práticas da época da ditadura militar, quando Glauber Rocha, Dom Hélder, Josué de Castro e os irmãos Villas-Boas foram impedidos de concorrer a prêmios internacionais por causa de posições políticas contrárias ao regime.

O atual ministro da cultura, Marcelo Calero, criticou a equipe de Aquarius por causa da manifestação, que considerou "quase infantil" por causa "prejuízos à reputação e à imagem do Brasil".

Marcos Petrucelli, que já integrou o júri do Cine PE, também afirmou publicamente, no Facebook, que o "cinema de autor" produzido no Brasil "não passa de uma tremenda bosta".

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