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Cinema Com Rodrigo Santoro no lugar de Jesus, Ben-Hur não se equipara à clássico Confira entrevista com os atores Rodrigo Santoro e Jack Huston

Por: Mariana Peixoto - Estado de Minas

Por: Ricardo Daehn - Correio Braziliense

Publicado em: 18/08/2016 20:30 Atualizado em: 18/08/2016 18:40

Rodrigo Santoro é Jesus Cristo na nova versão de Ben-Hur. Foto: Paramount/Divulgação
Rodrigo Santoro é Jesus Cristo na nova versão de Ben-Hur. Foto: Paramount/Divulgação

São Paulo %u2013 Há duas semanas, a superprodução Ben-Hur, que estreia nesta quinta (18) em 1,1 mil salas brasileiras (sexta nos Estados Unidos), vem sendo promovida mundo afora. O ponto de partida da divulgação foi justamente o Brasil, com sessões abertas do filme apresentadas pelo intérprete do papel-título, o britânico Jack Huston, e o popularíssimo Rodrigo Santoro, aqui fazendo as vezes de Jesus Cristo.

Nas conversas com a imprensa, ambos buscaram reforçar a ideia de que o longa dirigido pelo russo Timur Bekmambetov (O procurado, Abraham Lincoln: O caçador de vampiros) é baseado no romance Ben-Hur: A tale of the Christ (1880), de Lew Wallace, e não na superprodução de William Wyler.

Apostam ainda que as plateias de hoje não viram o filme de 1959 que, durante 38 anos, reinou absoluto como o maior ganhador de Oscars da história %u2013 11 (somente Titanic, de 1997, e O senhor dos anéis: O retorno do rei, de 2003, igualaram o feito). Bem, a maior parte do público jovem que for aos cinemas para conhecer a história do nobre tornado escravo realmente não deve ter visto um épico de mais de três horas filmado 57 anos atrás. Mas esses espectadores certamente já ouviram falar, de alguma maneira, em Ben-Hur, tamanha a força que ele adquiriu.

O filme de Wyler, ele mesmo precedido de outro longa com a mesma história (a versão muda, de 1925), é ainda hoje considerado o épico dos épicos. Uma bem-acabada realização que soube dosar aventura e reflexão religiosa. E mais importante: não envelheceu, a despeito da passagem do tempo e de todas as inovações do cinema.

O novo longa-metragem cujo orçamento esbarrou em US$ 100 milhões tem que levar o maior número de pessoas aos cinemas para não se tornar um fracasso épico %u2013 projeções mais do que pessimistas dão conta de que o primeiro fim de semana não irá além dos US$ 15 milhões.

O Ben-Hur de hoje não tem muitas pretensões artísticas. A narrativa sobre vingança e redenção %u2013 o nobre Judah Ben-Hur (Huston), que viveu na época de Cristo, é traído e tornado escravo graças a seu irmão de criação, Messala (Toby Kebbell), um oficial do Exército romano %u2013 é ancorada unicamente pela ação. Conflitos religiosos, políticos, brigas familiares, tudo é resolvido muito facilmente, quase ao sabor de uma novela %u2013 o que é reforçado pela parte final, que traz um destino diferente para Messala.

São duas grandes sequências as que dão o sabor de hoje à narrativa. A primeira, num navio em que os escravos são o combustível para uma batalha, foi filmada de um modo bastante realista. Os anos de maus-tratos de Ben-Hur vêm à tona nesta longa sequência (Huston, neto do cineasta John Huston e sobrinho da atriz Anjelica Huston, emagreceu 15 quilos para o personagem).

A outra é uma recriação da já antológica cena do filme de 1959, a corrida de bigas. Assim como o longa de Wyler, o novo também foi filmado nos estúdios Cinecittà, em Roma. Três meses foram levados para construir o Circo Máximo de Roma, outros três para realizar as filmagens. Inteligentemente, Bekmambetov utilizou o mínimo de efeitos especiais. Ao todo, são 12 minutos de pura adrenalina, em que não se desgrudam os olhos da tela, ainda que já se saiba o nome do vencedor.

A pirotecnia visual impressiona. No entanto, a falta de estofo da narrativa decepciona, ainda mais diante de uma história tão cara ao cinema.

* A repórter viajou a convite da Paramount

ENTREVISTA // JACK HUSTON
Você se imaginava como Ben-Hur?
Eu esperava fazer um filme como este. A versão de William Wyler me é muito familiar, pois todo ano ela é exibida na TV inglesa durante a Páscoa. E acho que agora é realmente a época de se fazer este filme. Antes da versão de Wyler, houve a versão muda (de 1925, Ben-Hur: A tale of the Christ). Wyler chegou e deu uma outra proporção. Era um set imenso, com uma quantidade enorme de figurantes. De certa maneira, a beleza deste novo filme está em sua redescoberta, reimaginar a história de Lew Wallace. Hoje, a maneira de atuar é bem diferente do que era em 1959. Mas a história, 130 anos depois, consegue refletir sobre o mundo em que estamos vivendo. Há muito ódio, brigas religiosas, políticas. Estamos chegando a um ponto perigoso no mundo, e a trajetória de Ben-Hur é exatamente isso. Ela mostra como é possível encontrar redenção, bondade. Tem uma mensagem poderosa.

O que mais se fala é sobre a sequência das bigas. Como foi fazê-la?
Quando comecei a conversar com Timur, ele me disse: %u201CO público de hoje já viu de tudo. Qualquer coisa é possível com os efeitos especiais, então, para que a sequência funcione, temos que voltar ao básico%u201D. Foram três meses, quase quatro, de preparação. Eu e Toby começamos os ensaios numa charrete com dois cavalos. Depois passamos para quatro. Mais tarde, fomos para a biga com dois e novamente quatro cavalos. A força está toda nas pernas, mas a primeira vez em que tive que parar os cavalos, coloquei meu pé em frente da biga e fiquei totalmente na vertical. Eu tinha que ficar assim para que os cavalos sentissem que eu ia pará-los. Já no primeiro dia de filmagem (de um total de 32) fizemos isso tudo. Só que ficávamos parados o tempo todo na biga e o Timur dizendo: %u201CVocês têm que atuar!%u201D. No final, filmamos com 32 cavalos e oito bigas. Era uma coreografia incrível que os cavalos faziam, quase uma dança. E nada poderia sair do lugar, pois alguma biga poderia bater. Tivemos alguns machucados, mas os cavalos saíram ilesos.

O fim do filme, depois do ápice com a corrida de bigas, é quase um anticlímax. Qual a sua opinião sobre o desfecho novelesco?
Isto é um debate grande em vários filmes. Uma produção como esta envolve produtores, diretor, elenco e estúdio. Há escolhas difíceis a fazer. Um dos produtores queria que houvesse uma continuação, como um Ben-Hur 2. Isso é meio louco. E como queríamos fazer um novo filme, diferente do de Wyler, foi definida essa mensagem positiva.

ENTREVISTA // RODRIGO SANTORO

O papel


Eu tinha a minha própria relação com o mítico, o icônico. Cresci ouvindo histórias do menino Jesus pelas minhas avós, uma, italiana católica, e a outra, espírita. Sempre tive muita referência e tive que me distanciar das imagens, para não esquecer que faria um personagem encarnado: um homem, o mais especial na face da Terra. Com a preparação, fui para vários lados: assisti a filmes, vi pinturas, li os Evangelhos.

Duas facetas

Temos o Jesus bíblico e tem um outro, histórico. Li o livro Zelota, de Reza Aslan. Nele, se tenta identificar como Jesus era, fisicamente. Há a imagem renascentista, o Jesus louro, alvo, mas, como ele era não é o mais importante: no filme, falamos de uma luz, de amor, de um coração, de valores, de ensinamentos %u2014 este foi meu foco. A ideia foi humanizar, ao máximo possível, trazer um Jesus mais próximo das pessoas, mais misturado.

Descontruindo o papel

Buscamos Ele mais como exemplo e menos como pregador. O diretor quis fazer com a câmera na mão, quase um documental, com várias fases. Como aquela através de ações e menos dos discursos, num tom mais coloquial de falar. Uma coisa é ler %u201Camar seus inimigos%u201D, falar, e acreditar, e, bem outra, é colocar na prática. É como, numa fechada de trânsito, o cara despertar teu instinto natural, humano, na linha do %u201Cpô, por que você fez isso comigo?%u201D. Vão te machucar, você se defende. Como dar a outra face? Como se trabalhar uma argumentação interna e transmutar, exalando amor para essa pessoa? Convido vocês a tentarem.

%u201CEscola minha%u201D

Li que William Wyler (diretor do Ben-Hur clássico) não quis correr o risco de expôr mais o Jesus, pela imagem no inconsciente coletivo muito forte. Daí, ele ter optado por tocar uma música e colocar poucas imagens, sendo emocionante, do mesmo jeito. Já tinha sido convidado para fazer o personagem, na Paixão de Cristo, e não pude fazer. É um personagem absolutamente incomparável. Com o novo convite, fiquei mexido, fiquei em dúvida, e até receoso. Mas fiz, conscientemente, uma escolha por mim.

Religiosidade

Se fiquei mais religioso? Não. Sempre estive em contato com a minha espiritualidade. Cresci escutando histórias do menino Jesus, dos lados católicos e espíritas: sempre trabalhei minha espiritualidade. A experiência sempre te transforma. No caso de Jesus Cristo, se eu puder ter o vislumbre de uma, sei lá, uma mínima fração do que foi o coração dele, do que foram os valores, eu já poderei reescrever a minha vida, a minha sensibilidade, eu já posso plantar essa semente. Quando você sente, fica marcado, fica uma memória.

Mudanças

Tento ser uma pessoa melhor, a cada dia; quero evoluir e eu acho que a chave para isso são as pessoas que estão a nossa volta, no dia a dia. São as interações, e as aceitações; é isso que te ensina. O próprio Dalai Lama já declarou que tem constante trabalho. Não é que ele acorde zen, que ele encontrou a iluminação. É um trabalho constante. Ficou em mim, um %u201Cvamos à luta, vamos arregaçar as mangas%u201D, para uma transformação interna, em busca de uma pessoa melhor. Quero evoluir, ficar melhor para os outros e para mim. Durante o tempo que filmei em Matera (Itália), nunca me senti tão bem na minha vida, nunca me senti tão em paz.

300, o filme

Tive um choque com o 300 (dirigido por Zack Snyder), mas o choque foi porque, quando eu filmei, eu vivi com paredes azuis e verdes, não havia nada. Eu falava com uma fita crepe (risos), eu não com pessoas. Foi uma experiência extremamente solitária, um desafio assim de outro planeta. Eu estava digerindo. Foi uma feijoada das pesadas que eu fiquei com aquilo remoendo (risos).

Na Sessão da tarde

Se há deslumbre e expectativas, com Hollywood? Sinceramente, eu sempre olho para o que eu estou fazendo. Alguém me perguntou: como é fazer um longa com o Schwarzenegger? Houve, sim, a sensação de que eu estava na Sessão da tarde. É uma coisa estranha você falar, caramba: %u201CÉ o Conan, é o Exterminador!%u201D. Ele fez parte do meu imaginário: ele era o Conan, numa época em que nem todo mundo era saradão. Na época, ele era sobre-humano, ele era uma entidade gigante (risos). Contracenar com ele, eu não chamaria de deslumbre, chamaria de meu erê falando (risos): %u201CUau, que coisa doida, é o Conan!%u201D. Mas procuro focar mesmo, me conectar com o que eu tô fazendo, porque há muita distração à sua volta. Aplico algo do budismo, tipo %u201Cvocê foi promovido; mas não fique nisso, não se perca naquilo%u201D. Procuro me equilibrar. Pratico ioga, para isso. É saúde, para mim.

J.J. Abrams

Ele (produtor da série Westworld, ainda por estrear, com Santoro) é um cara genial, um visionário extremamente inteligente. Você sente que ele realmente está num lugar diferente. É um dos caras mais impressionantes com quem já trabalhei ou conheci. Estive, rapidamente, com ele, quando fiz Lost, e ele era produtor. Ele não é hermético: enxerga as coisas de uma forma muito particular e interessante. Eu, que já era fã, agora tô muito mais, porque eu tive contato. No Westworld, tive uma experiência pra lá de incrível. Se eu puder, quero trabalhar muito ainda com o J.J. Ele é muito tranquilo, está ali no set, falando com todo mundo. É um cara jovem, simples, humilde. Só tenho coisas boas pra falar dele.

 

 



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