Belém-Recife Carimbó paraense se renova e influencia músicos pernambucanos Mestres Pinduca e Dona Onete lançam novos discos e são referência para cantores e bandas de Pernambuco

Por: Júlio Cavani - Diario de Pernambuco

Publicado em: 08/08/2016 20:46 Atualizado em: 09/08/2016 11:51

Novos discos de Pinduca e Dona Onete também podem ser ouvidos na internet no site do Natura Musical
Novos discos de Pinduca e Dona Onete também podem ser ouvidos na internet no site do Natura Musical
 
Assim como Recife, Belém é uma cidade conhecida como um dos maiores centros de criatividade musical do Brasil. O Pará, inclusive, exerce forte influência sobre a música pernambucana, talvez mais do que o inverso. Artistas como DJ Dolores e Zé Cafofinho e bandas como Academia da Berlinda, Labaredas, Superlage e Dirimbó, baseadas em Pernambuco, assumem o carimbó e a guitarrada como referências essenciais na construção de canções feitas para dançar.

Gênero tipicamente paraense, o carimbó tem Pinduca (79 anos) e Dona Onete (77 anos) entre os principais representantes. Ambos acabaram de lançar novos discos, patrocinados pelo projeto Natura Musical e pelo edital Semear, do governo do Pará. No recém-lançado CD Nada sem ela, da Academia da Berlinda, o gênero também aparece como uma herança bastante perceptível em diversas faixas. Da nova geração do Recife, a banda Dirimbó dá continuidade a esse intercâmbio e prepara-se para lançar o primeiro álbum ainda em 2016.

No final da década de 1990, a Songo foi a primeira banda do Recife a assumir explicitamente a influência do carimbó. O vocalista do grupo era Tiago Andrade, que atualmente segue em carreira solo com o nome artístico Zé Cafofinho. Daquela época até hoje, ele sempre manteve clássicos de Pinduca, como Sinhá Pureza e Vamos farrear, no repertório dos shows, além de compor canções diretamente relacionadas ao estilo.

Geograficamente, o Pará é o estado brasileiro que tem mais contato com o Caribe. "O carimbó faz a ligação do Brasil com a música da América Latina", aponta Cafofinho, que revigorou essa aproximação no disco Casulo, lançado em 2015. "Eu escutava muito desde a infância e a adolescência, mas comecei a me aprofundar mais por causa do movimento mangue, quando passei frequentar sebos de discos de vinil para pesquisar a música brasileira fora dessa coisa da MPB", lembra o cantor.


No primeiro disco da Academia da Berlinda, lançado em 2007, há uma música em homenagem a Pinduca, chamada Comandante. O título é uma referência à capa de um antigo álbum do mestre paraense, em que ele aparece vestido com uma farda de soldado. A banda pernambucana chegou a trazer o ídolo para fazer uma participação especial em um show na Rua da Moeda em 2010.

"É um comandante da dança e da música", justifica Tiné, autor da letra e vocalista da Berlinda. "Desde o início da banda, em festinhas de Olinda, a gente ouvia e tocava músicas de Pinduca e de mestres da guitarrada. É algo que sai naturalmente no nosso trabalho. Fazemos com um estilo próprio", define o artista, que também cita a música angolana como um ingrediente importante: "Tem a mesma pegada".


Outro elo que une Pernambuco e o Pará é o brega (outra referência do trabalho da Academia da Berlinda). A banda Labaredas, por exemplo, já gravou Cavalo velho, um dos maiores sucessos da carreira de Pinduca, que é uma versão em português para uma composição do venezuelano Simon Diaz.

"Belém sempre foi referência pra mim", assume Hélder Aragão, o DJ Dolores. Foi inspirado nos sistemas de equipamentos de som das festas do Pará que ele escolheu o nome do seu segundo disco, chamado Aparelhagem. Não por acaso, o guitarrista Gabriel Melo, da Academia da Berlinda, tornou-se um dos principais colaboradores do DJ, que também costuma trabalhar com o cantor Júnior Black, que já cantava músicas com influência de carimbó na extinta banda Negroove.

Fundada em 2013 no Recife, a Dirimbó desenvolve um carimbó com características bem particulares. "Digamos que é um carimbó-guitarrada com traços mais nordestinos. A gente dialoga com o coco e outros ritmos. Até o próprio sotaque do nosso vocalista, que é recifense, já mostra a proposta da nossa roupagem", diferencia o baixista Mário Zappa, único integrante do grupo que nasceu no Pará.


"Eu, como paraense, tenho consciência que a Dirimbó não vai fazer algo totalmente raiz, primeiro porque não estamos lá. Segundo porque quem compõe a banda também não é de lá", explica Zappa. "O que fazemos é uma homenagem a esse ritmo com a nossa vivência aqui", define o músico.

NOVOS DISCOS COM SONS DO PARÁ
As músicas podem ser ouvidas no site do projeto Natura Musical:

Banzeiro, de Dona Onete
Aos 77 anos de idade, Dona Onete está para o carimbó assim como Lia de Itamaracá está para a ciranda. O novo disco, chamado Banzeiro (nome das ondas formadas nas águas pelos barcos), é repleto de referências à cultura paraense, com letras ilustradas por um vocabulário típico, formado por palavras como tipiti, tucupi, miriti, aumã, queimoso, tremoso, terruá, pitiú, cupijó, siriá, lundum e jaci, entre outras. Do início ao fim, o repertório é capaz de incendiar as pistas de dança com uma infalível sensualidade, para dançar a dois ou soltinho. Sonhos de adolescente, a última faixa, é um bolero mais lento, com citações a Elvis Presley, Cauby Peixoto, Angela Maria e Bienvenido Granda.

Cine Ruptura, de Saulo Duarte e a Unidade
Saulo Duarte, com 27 anos de idade, chega ao terceiro disco, intitulado Cine Rutpura, com um estilo que foge dos estereótipos do Pará, acompanhado pela banda A Unidade. O carimbó está presente explicitamente apenas na faixa Mandarins (Pavelagem), com um arranjo essencialmente percussivo, que resgata a fase pré-elétrica e mais folclórica do tradicional gênero musical. Elementos de jazz e rock, de foma suave, sobressaem-se na maioria das faixas, em canções modernas que podem ser facilmente enquadradas no rótulo "MPB". Ava Rocha e Russo Passapusso (Baiana System) fazem participações. A produção é do músico paulista Curumim (conhecido pelo trabalho solo e pelas colaborações com nomes como Arnaldo Antunes, Vanessa da Mata e Céu).

No embalo do Pinduca, de Pinduca
Depois de nove anos sem gravar, o rei está de volta com o disco No embalo do Pinduca, que resgata canções clássicas, agora regravadas com as novas tecnologias e com uma banda de alto nível técnico e artístico. A produção é do consagrado guitarrista e tecladista paraense Manoel Cordeiro (o filho dele, Felipe Cordeiro, também participa), que criou adaptações a partir dos arranjos originais. Além do carimbó, ele pratica estilos como guitarrada (também conhecido como lambada), siriá, cúmbia e comachera. Sinhá Pureza, Vamos farrear e Cavalo velho (já gravada pela banda pernambucana Labaredas) estão no repertório. É o 36º álbum da carreira de Pinduca, um patrimônio vivo da música brasileira que chegará aos 80 anos em 2017.

SERVIÇO
Show de lançamento do disco Nada sem ela, da Academia da Berlinda
Quando: Sexta, dia 19 de agosto, às 22h
Onde: Clube Bela Vista (Avenida Aníbal Benévolo, 636, Beberibe)
Quanto: Ingressos antecipados por R$ 30, R$ 15 (meia) e R$ 20 (com um quilo de alimento); Ingressos na hora por R$ 50 e R$ 25 (meia ou com quilo de alimento)
Pontos de venda: Bike Fit Café, Robot Rock, Passadisco, Ramon Bar


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