Cinema Em Cannes, Sonia Braga e Kleber Mendonça revelam segredos do Recife em entrevista coletiva O cineasta pernambucano e a atriz cederam entrevista coletiva sobre o filme Aquarius, que concorre à Palma de Ouro do Festival de Cannes

Por: Viver/Diario - Diario de Pernambuco

Publicado em: 18/05/2016 08:33 Atualizado em: 18/05/2016 16:38

Equipe de Aquarius posa para fotos antes da entrevista coletiva. Crédito: © M. Petit / FDC
Equipe de Aquarius posa para fotos antes da entrevista coletiva. Crédito: © M. Petit / FDC


A atriz Sonia Braga, o cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho e parte do elenco e da equipe de produção do filme Aquarius cederam entrevista coletiva sobre o longa-metragem nesta quarta no Festival de Cannes. Eles falaram sobre a obra e também sobre o protesto político que fizeram no tapete vermelho.

No filme, Sonia interpreta Clara, moradora de um antigo prédio na Avenida Boa Viagem, o Edifício Aquarius, no bairro do Pina. Uma construtora quer comprar o apartamento dela para demolir o imóvel e construir um novo empreendimento no local.

Assista à coletiva na íntegra:


Leia alguns trechos dos depoimentos cedidos na coletiva:

SONIA:

"Pra mim, é como se o prédio não fosse só um prédio. É um país, o Brasil. Há uma bonita vizinhança e existe uma mulher dentro daquele apartamento. A vida dela está  naquele prédio. Acho que todo mundo viveu alguma situação parecida com aquela. No Brasil, as pessoas são desencorajadas para lutarem. Clara é uma pessoa que percebe que tem direitos como cidadã e como mulher."

"Adoro televisão. Gosto de fazer. Pra mim, a televisão no Brasil é muito importante. O povo não tem tempo e nem dinheiro para ir ao cinema com frequência. Não é porque não gostam. Não é porque são pessoas simples que devem ser subestimadas. Elas são sofisticadas e muito inteligentes. Alguns filmes não ficam populares no Brasil porque as pessoas precisariam gastar o dinheiro do mês para comprar um ingresso."

"Sinto como se Kleber tivesse me dado as palavras para expressar algo que estava me sufocando a respeito do meu país. Não há nada de errado com as pessoas pobres. O problema do Brasil são as pessoas ricas. Na música Sampa, da década de 1970, Caetano diz que Narciso acha feio o que não é espelho. Hoje em dia, as cidades estão ficando cada vez mais feias. As construtoras e as cidades de hoje não favorecem o surgimento e o aprofundamento da amizade entre as pessoas."

"Eu concordo totalmente com a ideia de usar a plataforma internacional do Festival de Cannes para expor o que está acontecendo no Brasil. Estamos falando disso no Facebook o tempo inteiro. O Brasil está dividido agora. Essa divisão não havia acontecido desde que o Brasil voltou a ser uma democracia após a ditadura."

"Vivemos em um mundo em que mulheres de 65 anos vivem como se tivessem 20 anos. Temos órgãos e os carregamos. A sexualidade anda com a gente. As noções de beleza valem para todas as idades. Metade do que se diz sobre as mulheres e os hormônios é mito."

KLEBER:

"É um filme sobre resistência, um pouco sobre sobrevivência e, acima de tudo, sobre a energia e a adrenalina que você ganha quando tenta sobreviver. A luta pela sobrevivência te dá energia para ir mais além e lutar. Sonia entendeu isso muito bem. É tentar defender a si mesma e ao mesmo tempo reagir."

"O filme é bastante centrado na personagem de Sonia, mas o prédio também é um personagem. Às vezes ele parece triste, às vezes ele parece sério. Ele e Clara têm mais ou menos a mesma idade."

"Conheço segredos do Recife. Eu poderia ter feito o filme em São Paulo ou Barcelona, mas seria um filme totalmente diferente porque é como se eu revelasse alguns segredos do Recife. É fascinante fazer as pessoas descobrirem uma cidade por meio do cinema. Não gosto de retratos apocalípticos das coisas, de dizer que algo é terrível ou horrível. Prefiro criticar as coisas e ao mesmo tempo mostrar que existe normalidade e beleza nas coisas. Os segredos dos lugares funcionam muito bem dramaticamente. Alguns diretores são associados a cidades. Assim como Woody Allen, Martin Scorsese e Spike Lee são sempre associados a Nova York, eu quero ser associado ao Recife."

"A ideia do protesto veio dos vários artistas, diretores e produtores brasileiros que estão aqui em Cannes. Decidimos fazer algo. Não seria algo barulhento ou inadequado. Basicamente, pegamos pequenos pedaços de papel e escrevemos pequenas mensagens sobre o que está acontecendo no Brasil. Cannes tem muitas câmeras com lentes potentes. Achei muito bonita a repercussão que vi na mídia no Brasil quando saí da sessão. A mídia brasileira me pareceu enlouquecida com nosso pequeno gesto de tirar do bolso um pedaço de papel. O Brasil vive uma divisão dramática. No lado da direita, existem traços de facismo, inclusive no Congresso Nacional, com ideias chocantes. O Ministério da Cultura foi extinto na semana passada. Acho que foi o momento errado, até porque o Brasil está neste momento da competição do Festival de Cannes com um filme feito com recursos públicos honestos."

Veja como foram os aplausos para Aquarius:



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