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Entrevista Banda portuguesa Deolinda lança quarto disco e anuncia show no Brasil "Outras histórias" é o quarto álbum de estúdio do grupo e é considerado um dos mais importantes da década para a música patrícia. Leia entrevista

Por: Raquel Lima - Diario de Pernambuco

Publicado em: 23/03/2016 09:56 Atualizado em: 24/03/2016 08:52

 

Ironia de qualidade: Luís José (violão), ao lado do irmão Pedro (violão), da prima Ana (voz), que é casada com Zé Pedro (baixo). Foto: Isabel Pinto/Divulgação
Ironia de qualidade: Luís José (violão), ao lado do irmão Pedro (violão), da prima Ana (voz), que é casada com Zé Pedro (baixo). Foto: Isabel Pinto/Divulgação

Uma das mais expressivas bandas da renovação musical portuguesa, a Deolinda escolheu Corzinha de verão para ser a primeira faixa do novo álbum, Outras histórias (Sons em Trânsto/Universal, R$ 28,95 no iTunes), a ganhar o mundo. A canção tem pegada de hit - é uma baladinha praieira -, mas chama a atenção por, principalmente, ser uma perfeita amostra de características bem próprias da Deolinda: a ironia e da habilidade de modernizar elementos arraigados na música de Portugal. O trabalho foi lançado neste mês e aclamado como um dos álbuns mais importantes da década para o país patrício.

"Corzinha é a música de estreia porque estamos no inverno em Portugal (risos). Tinha tudo para ser um clichê do verão, mas, ao contrário disto, está a falar do inverno", brincou Pedro da Silva, compositor de todas as canções da banda, em entrevista por telefone. Os Deolinda ousam não apenas na ironia, mas na estética - com estruturas e formas mais tortas e experimentais. Destaque para Nunca é tarde que brinca com os "timbres" da Orquestra Sinfonietta de Lisboa. "Tivemos a ajuda de um grande mestre que é o Frederico Mello, arranjador de cordas fantástico. Estas parcerias também foram encontrando ritmos diferentes. E, num piscar de olhos, há balanços africanos e brasileiros no disco", comenta Pedro.

E se Corzinha de verão ironiza a falta de Sol, foi em um inverno mais ameno do que o português, o pernambucano, que Ana Bacalhau (voz), Luís José Martins (violão) e Zé Pedro Leitão (contrabaixo), além do próprio Pedro (violão), fizeram o primeiro show no Brasil. Aliás, na América do Sul. Os quatro se apresentaram na Praça Guadalajara (hoje Praça Dominguinhos), durante o Festival de Inverno de Garanhuns, em julho de 2013. Ficaram hospedados em Olinda e tiveram "as melhores impressões", como contou Ana Bacalhau.

Três anos depois, os Deolinda voltarão ao Brasil com o quarto álbum de estúdio, que estreou em primeiro lugar no iTunes português. A turnê de Outras histórias tem mais de 25 datas confirmadas, incluindo palcos na Bélgica e Espanha, e será apresentada na Festa dos Santos Populares Portugueses, no Rio de Janeiro, em 10 de junho. Mais datas ainda estão em negociação.


Banda já se apresentou no Festival de Inverno de Garanhuns, em 2013. Foto: Isabel Pinto/Divulgação
Banda já se apresentou no Festival de Inverno de Garanhuns, em 2013. Foto: Isabel Pinto/Divulgação

3 perguntas // Ana Bacalhau (vocal)

Outras histórias é um disco independente?
O processo foi igual aos outros: quando sentimos que estava na hora. E, depois de termos as canções ensaiadas, obviamente, que mostramos as canções à nossa equipe, à gravadora - para eles também perceberem o que estava a acontecer. Mas, na verdade, é um processo muito centrado na banda.

Qual a diferença mais marcante entre a Deolinda que gravou Mundo pequenino e a que chegou ao estúdio para gravar Outras histórias?
A Deolinda de Mundo pequenino era uma banda que queria começar experimentar outros instrumentos, novas formas de apresentar uma canção. Em Outras histórias, a Deolinda é uma banda que já teve esta experiência e tem essa segurança de arriscar em coisas que nem pensávamos fazer. E avançar um bocadinho mais.

E as referências também mudaram?
As referências que mudaram foram as do cotidiano. Ou seja, a Lisboa de 2016 está diferente da Lisboa de 2013. Ou de 2008, quando nós começamos. E, portanto, a nossa música tenta refletir um pouquinho daquilo que observamos. Lisboa e Porto, as duas maiores cidades de Portugal, vivem uma multiculturalidade, um comospolitismo muito interessante. E depois nós viajamos o mundo inteiro, então, é natural que essas influências de outras culturas, de outros sons vão entrando na nossa música.


3 perguntas // Pedro da Silva Martins (violão)

Você é considerado o compositor mais prolífico de Portugal hoje e colabora com nomes como Ana Moura e António Zambujo. Como distribui o que compõe?
Em princípio, quando faço uma melodia, ainda sem ter letra, já sei para quem é. Não sei explicar muito bem, mas é que faço com uma voz na cabeça, uma ideia de voz que tenho. Também tento desenvolver um trabalho diferente para cada um. O próprio Desfado [disco de Ana Moura] é diferente da Deolinda, que é diferente do Zambujo. Tenho conseguido gerir essas diferentes vozes e tentar evoluir em caminhos diferentes.

O processo de compor Outras histórias ocorreu enquanto seu pai estava hospitalizado. Ainda assim, o disco é solar. Como você conseguiu?
Foi o disco mais difícil para mim, como compositor. Tinha meu pai muito doente e minha relação com ele sempre foi musical: ele era a primeira pessoa a quem mostrava as canções, o primeiro crítico. Como eu iria passar muito tempo com ele, fui aproveitando também para que acompanhasse tudo. Até o último momento, ele ouviu música - que era o que gostava, ouvir os filhos tocarem. E esse espírito que ele tinha, e também tenho, de olhar para vida de forma espirituosa, passou às canções. O disco tem a energia dele também.

A música portuguesa vive momento de popularização no Brasil. Por quê?
Talvez nós estejamos mais adocicados. Este movimento musical do fado com outros ritmos é menos ortodoxo, mais universal. Acho que a linguagem do fado mudou - falo fado porque é o mais conhecido, mas me refiro à música portuguesa. O António Zambujo tem um balanço que é fácil para quem ouve bossa nova. Carminho já tem canções com o tempo mais acima do fado e é mais familiar para quem ouve samba. Portanto, há aqui uma aproximação natural, que vai crescendo com tudo que se vai ouvindo. A kizomba , o kuduro, outros ritmos que vamos assimilando e vão tirando a música portuguesa da caixa.

 



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