Balanço Big Jato mereceu vencer, mas o Festival de Brasília mostrou-se desconectado do cinema brasileiro contemporâneo Enquanto a competição de curtas contemplou novos caminhos cinematográficos, a seleção de longas-metragens foi anacrônica em 2015

Por: Júlio Cavani - Diario de Pernambuco

Publicado em: 24/09/2015 07:23 Atualizado em: 24/09/2015 04:57

Trupe de Big Jato subiu ao palco para receber cinco troféus. Fotos: Junior Aragão/ Divulgação
Trupe de Big Jato subiu ao palco para receber cinco troféus. Fotos: Junior Aragão/ Divulgação
 
Com cinco troféus candangos, Big Jato, do pernambucano Cláudio Assis, foi o grande vencedor do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, encerrado na noite de terça. Além de ganhar na categoria de melhor longa-metragem, o filme venceu também os prêmios de melhor atriz (Marcélia Cartaxo), ator (Matheus Nachtergaele), trilha sonora (DJ Dolores) e roteiro (Ana Carolina Francisco e Hilton Lacerda, inspirados no livro de Xico Sá).

A notícia é boa para o cinema pernambucano e para os artistas que trabalham com Assis, mas pode ser um mau sinal para o cinema brasileiro e especialmente para o Festival de Brasília. Afinal, o cineasta já havia vencido os candangos de melhor filme com Amarelo Manga (2002) e Baixio das bestas (2006). O estilo dele amadureceu no novo trabalho, mas não necessariamente sofreu grandes mudanças. As suas contribuições cinematográficas permanecem as mesmas. Um prêmio não é algo relativo apenas à qualidade de uma obra, mas funciona também como um discurso político, uma identificação de sintomas culturais ou uma constatação sobre alguma tendência estética. Será mesmo que nada mudou nos últimos 15 anos? Ou o problema está na seleção de filmes feita pelo Festival? A segunda opção é mais provável.

Big Jato ainda não tem data de estreia confirmada nos cinemas, mas a previsão é para março. Antes, o filme ainda tem chances de ser selecionado para grandes festivais europeus, como Berlim e Roterdã, que podem interferir diretamente na estratégia de lançamento no circuito de exibição. No Recife, está impedido de estrear nas salas da Fundação Joaquim Nabuco (até setembro, como punição pelo comportamento do cineasta), mas poderá entrar em cartaz no São Luiz e nos shoppings.

Entre os curtas-metragens do festival de Brasília, o mais premiado foi o mineiro Quintal (melhor filme, roteiro e atriz), de André Novais. Nas demais categorias, houve uma distribuição de um prêmio por filme, o que demonstra o alto nível dos concorrentes (como se todos merecessem algum troféu), mais ousados e bem escolhidos do que os longas-metragens. A mostra de curtas estava conectada com a produção atual.

Para minha amada morta, filmado no Paraná, ganhou ainda mais prêmios do que Big Jato, seis no total (inclusive melhor diretor para o baiano Aly Muritiba). É um longa-metragem tão bom quanto o de Cláudio Assis, mais organizado e correto, menos caótico, mas completamente diferente, com mais chances de agradar a um público maior sem dividir tanto as opiniões. Em Brasília, portanto, o júri seguiu a lógica de que um filme mais controverso, visceral e arriscado tem uma importância maior. A obra de Cláudio Assis explodiu cinematograficamente na tela com fortes cargas de sensorialidade, provocações e riqueza cultural. Para minha amada morta, tanto na técnica quanto nos elementos humanos, é simplesmente correto e bem feito (isso é o bastante, mas não é transformador).

Metade dos longas-metragens exibidos não representam o cinema brasileiro que tem sido reinventado e tem chamado atenção para o país nas principais mostras internacionais. Foi um problema específico de 2015, que contraria o caminho desbravador seguido pelo evento nos últimos anos. Espera-se que em 2016 o festival de Brasília volte a ser o mais importante do país.

Vaias não atrapalharam a consagração de Cláudio Assis
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