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Eleições Artista transforma lixo eleitoral em arte subversiva Ana Lira subverte santinhos e cartazes de campanhas políticas na exposição Não-Dito, em cartaz no Recife

Por: Júlio Cavani - Diario de Pernambuco

Publicado em: 02/09/2015 07:45 Atualizado em: 01/09/2015 17:28

Imagens foram impressas em material translúcido que incorpora o público na obra. Fotos: Nando Chiapetta/ DP/ D.A.Press
Imagens foram impressas em material translúcido que incorpora o público na obra. Fotos: Nando Chiapetta/ DP/ D.A.Press
 
Lixo e comunicação confundem-se em dias de eleições. Não só porque panfletos são jogados nas ruas, mas também pela sujeira política presente na propaganda eleitoral em si. Ao desconstruir e recontextualizar materiais de divulgação dos candidatos, como cartazes e santinhos, a artista Ana Lira os transforma em peças subversivas, com efeito crítico e também poético, como pode ser visto na exposição Não-dito, que começa nesta quinta no Capibaribe Centro da Imagem.

Não-dito é uma nova versão do trabalho Voto, exibido pela primeira vez na Bienal Internacional de São Paulo em setembro de 2014, às vesperas das eleições. Em ambas as exposições, a artista basicamente apresenta fotografias que reproduzem detalhes de propagandas eleitorais depredadas ou deterioradas, como uma metáfora para a crise de representação política vivida pela sociedade.

"Minha ideia não era focar em uma campanha ou na crise gerada por um partido", esclarece Ana, que procurou fotografar cartazes de diferentes alianças políticas, sem identificar demais os candidatos. "Fazer reforma política no Brasil não é mudar apenas o legislativo e o executivo, mas também o poder judiciário e, principalmente, o poder econômico", defende.

Ana fotografou propagandas eleitorais depredadas e deterioradas
Ana fotografou propagandas eleitorais depredadas e deterioradas

Praticamente o único candidato que pode ser identificado nas imagens é Geraldo Júlio, que aparece com uma linha rasgada no meio do rosto, com a face rachada. Na Bienal, o público de São Paulo demonstrava não reconhecer a cara do atual prefeito e, segundo Ana, era comum que as pessoas o confundissem com Eduardo Campos. Ela resolveu trazer a obra para a exposição do Recife para exemplificar como esse tipo de retrato é padronizado a ponto de fazer os políticos ficarem fisicamente parecidos entre si.

"Os responsáveis pelas campanhas escolhem uma foto específica para usar em todos os materiais impressos. É pra fixar mesmo. A gente ainda não se livrou do efeito Collor, do candidato bonito e charmoso", observa a artista, que questiona por que o rosto do político é mais enfatizado do que qualquer outra informação, recurso visual repetido por praticamente todos os candidatos de todas as correntes políticas.

Outra discussão inevitável envolve o financiamento da produção das propagandas, que leva os políticos a governarem mais para atender a quem os patrocinou do que ao povo que os elegeu. "Eles representam aqueles que pagam as campanhas. No fundo, eles não têm rosto, já que as pessoas votam em quem elas não conhecem", provoca o espanhol Pablo Fuentes, curador da exposição (e um dos curadores da Bienal), com uma observação que também se refere ao título (Não-dito). Para ele, "essa crise de representação não é apenas brasileira. A ligação entre a população e a classe política quebrou em todo o mundo".

Projeto de Ana participou da Bienal de São Paulo
Projeto de Ana participou da Bienal de São Paulo

VÍDEO
Dentro da exposição Não-dito, serão mostrados vídeos do projeto coletivo Crise de representação, produzidos colaborativamente por 14 artistas que elaboraram imagens inspiradas pelo tema-título. Além disso, as paredes da galeria estão preenchidas por panfletos de protesto distribuídos por sindicatos e movimentos sociais nas ruas do Centro do Recife (quem quiser pode levar novos materiais para acrescentar ao conjunto).

Imagem integrante do projeto Crise de Representação. Foto: Júlio Cavani
Imagem integrante do projeto Crise de Representação. Foto: Júlio Cavani

SERVIÇO
Exposição Não-dito, de Ana Lira
Quando: Abertura nesta quarta, às 19h30. Em cartaz até 9 de outubro de terça a sexta, das 13h às 19h, e aos sábados, das 10h às 16h30
Onde: Capibaribe Centro da Imagem (Rua da Aurora, 533, Boa Vista)
Quanto: Entrada grátis
Informações: 3032-2500

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