Literatura Cinema transforma capas de livros: editoras investem, mas fãs nem sempre aprovam Obras são relançadas com capas repaginadas e conteúdos extras após estreias no cinema, mas a tentativa de aquecer as vendas não agrada a todos os leitores

Por: Larissa Lins - Diario de Pernambuco

Publicado em: 02/07/2015 10:40 Atualizado em: 02/07/2015 11:05


Se aquele livro clássico, com lugar cativo na sua estante, fosse relançado com nova capa, motivado pela estreia do filme homônimo, como você reagiria? Compraria o exemplar repaginado ou o rejeitaria em defesa do original, já tão familiar? Fãs de obras como O Grande Gatsby (Leya Brasil, R$ 29,90), O planeta dos macacos (Editora Aleph, R$ 36), Memórias de uma gueixa (Arqueiro, R$ 49,90) e os mais recentes A culpa é das estrelas (Editora Intrínseca, R$ 34,90) e Cidades de papel (Editora Intrínseca, R$ 19,90) se depararam com esse dilema nos últimos anos.



Esses títulos integram uma lista de livros reformulados - alguns com nova capa, outros com acréscimo de conteúdo - e devolvidos ao mercado. Em junho deste ano, a editora Aleph - selo tradicional em relançamentos - apresentou nova versão de Jurassic Park, originalmente lançado em 1990, aproveitando como gancho a estreia do longa Jurassic World - O mundo dos dinossauros, no último dia 11. A estratégia, defendida pelo setor editorial, parece funcionar como manobra publicitária, mas não agrada a todos os fãs.

“Me parece uma estratégia de marketing. Não desaprovo, mas também não compro um novo exemplar do livro motivada pela mudança de capa”, conta a bailarina e jornalista Bárbara Pires. Ela é membro de grupo virtual dedicado ao romance A culpa é das estrelas, de John Green, no Facebook, e acredita que as reedições conquistem novos leitores, atraídos primeiramente através dos filmes. Mas, como leitora das obras que precedem os longas, prefere se manter fiel às capas originais. A estudante Climeidy Carvalho, também frequentadora de grupos literários virtuais, concorda: “Prefiro não relacionar os livros a referências que já existem, pois sinto que ‘castra’ minha imaginação.”



Para a jurista Taciana Guedes, colecionadora de livros, as obras com capas baseadas em filme só valem a pena quando as edições originais estão esgotadas nas livrarias ou quando o produto “nasce” a partir das telas. “É o caso de O diário secreto de Lizzie Bennet (Verus Editora, R$ 30), que surgiu da série, já transmidiático”, exemplifica. O contexto se repete, nacionalmente, em Meu passado me condena (Editora Paralela, R$ 24,90), publicado em livro com texto de Tati Bernardi, em junho, após dois títulos lançados no cinema, protagonizados por Fábio Porchat e Miá Mello. Meu passado me condena 2 chega hoje aos cinemas de todo o país.



O orçamento às vezes limitado das editoras para a divulgação das obras é um dos motivos para a repaginação, vista como uma tentativa de aquecer as vendas, segundo o editor Daniel Lameira, ligado à Aleph. Propagandas e reportagens em torno do filme geram curiosidade também sobre o livro, que as aproveita e é mais facilmente reconhecido se ilustrado com cenas ou cartazes “pinçados” das telonas. “Ao relançar, acrescentamos conteúdo, como posfácios, entrevistas ou artigos opinativos”, explica Lameira.

A medida foi adotada em O planeta dos macacos - com resenha crítica do filme assinada pelo próprio Pierre Boulle, autor da obra original - e será aplicada em Alien - o oitavo passageiro, próximo título na lista de relançamentos da casa, com diálogos estendidos e perfil aprofundado dos personagens. A nova edição de Jurassic Park, a mais recente do grupo, foi acrescida de matéria sobre o autor Michael Crichton, comentários dele sobre o filme Jurasic Park - Parque dos dinossauros, lançado em 1993, e um posfácio do crítico Marcelo Hessel, do site Omelete, sobre livro e filme.



Segundo o jornalista e consultor Carlo Carrenho, fundador da plataforma Publish News, é difícil, entretanto, estimar em números a comparação sobre qual versão desperta maior empatia no público leitor. “Isso porque, na maioria dos casos, o ISBN (International Standard Book Number, Número Padrão Internacional de Livro) sequer é alterado”, explica. O código é considerado uma espécie de certidão de nascimento das obras e usado, entre outras coisas, para contabilizar a tiragem de exemplares.

Michelle Doherty acredita que as vantagens publicitárias guiam a manobra editorial. Foto: Arquivo pessoal/Divulgação
Michelle Doherty acredita que as vantagens publicitárias guiam a manobra editorial. Foto: Arquivo pessoal/Divulgação
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Michelle Doherty, publicitária

Qual o intuito desse tipo de estratégia, de relançar as obras aproveitando o ensejo do lançamento dos filmes?

O momento em que o autor assina o contrato para que sua publicação, seja livro ou quadrinhos, vire filme é o ponto inicial de uma verdadeira maratona. É a partir desse momento que são lançadas notícias para os fãs da franquia, o que gera uma comoção inicial. Só esse fato já é suficiente para aumentar o número de vendas do título em questão. Cada notícia relacionada ao novo filme é motivo de celebração também por parte da editora. A época de lançamento do filme vem carregada de artigos relacionados à franquia, desde camisas, maquiagem, passando por artigos de decoração, esportes e até eletrônicos. Surgem também as novas edições do livro em questão, com páginas inéditas, capas especiais e até versões luxuosas. É uma estratégia que desperta curiosidade em cadeia, gera lucro a todos os envolvidos e entrega aos fãs uma extensa gama de produtos novos.

Cinema e literatura se combinam nessa manobra. Quem se envolve no processo?
Isso envolve toda a indústria do entretenimento, mas tanto para os fãs quanto para as editoras, autores e estúdios é uma situação de ganha – ganha. Quantos artigos de filmes cada um de nós tem em casa? Seja um personagem de animação obtido como brinde de uma rede de fast food, que fica na mesa do seu escritório, até um box com todos os filmes da franquia James Bond ou mesmo aquele celular de última geração na versão estampada com Os vingadores? O céu, como se diz, e a imaginação são os limites.













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