Música Silvério Pessoa amplia time de artistas que se rendem a Jackson do Pandeiro com Cabeça feita Disco resgata essência estética de sucessos da carreira do paraibano

Por: Luiza Maia - Diario de Pernambuco

Publicado em: 21/04/2015 08:00 Atualizado em: 20/04/2015 21:16

Novo álbum tem 15 faixas. Ivanildo Machado/Divulgação
Novo álbum tem 15 faixas. Ivanildo Machado/Divulgação

Os Paralamas do Sucesso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Elba Ramalho e uma lista incontável de artistas imprimiram interpretação própria às canções eternizadas por Jackson do Pandeiro (1919-1982). Nascido na vizinha Paraíba, foi aqui no Recife, quando começou a carreira, em rádio, que José Gomes Filho substituiu o apelido Jack - inspirado em Jack Perry, mocinho de filmes de faroeste - e registrou as primeiras gravações.

A carreira despontou mesmo no Rio de Janeiro, onde ganhou a alcunha de Rei do Ritmo, mas a ligação com o estado e as raízes nordestinas fazem dele um nome revisitado e prestigiado na discografia pernambucana. De Bezerra da Silva, do qual foi parceiro em composições, à banda Fim de Feira, em cuja canção Aos mestre é reverenciado, o paraibano semianalfabeto é fonte de inspiração.

Lenine brincou com as palavras na canção Jack soul brasileiro, gravada também por Fernanda Abreu. Alceu Valença dividiu palcos Brasil afora com o ídolo no projeto Pixinguinha. Geraldo Azevedo gravou Na base da chinela para a coletânea Jackson do Pandeiro: Revisto e sampleado, na qual estavam também Zeca Pagodinho, Gal Costa e outros intérpretes. Fred Zeroquatro o inseriu entre os interesses dos mangueboys e manguegirls no texto do Manifesto mangue, publicado em 1992.

Hoje, Silvério Pessoa lança o disco Cabeça feita: Silvério Pessoa canta Jackson do Pandeiro. Como fez Zé Ramalho, em 2010 - e com quatro canções, Cabeça feita, Quadro negro, 1 x 1 e Casaca de couro, em comum - ele dá novas versões a composições de Jackson ou gravadas por ele.

"Você não consegue associar Jackson a um único ritmo. Esse lado cosmopolita dele traz muitas possibilidades quando os artistas querem se redescobrir, reinventar", analisa Climério de Oliveira, cuja pesquisa de doutorado se debruça sobre o forró. Ele reforça que, esteticamente, o paraibano surgiu como estilo alternativo ao hegemônico baião de Luiz Gonzaga. "Em vez de reiterar os traços e ritmo de Gonzaga, vai para o lado maroto, brincalhão, que não é o Nordeste da seca, do sofrimento e da perda, mas tem alegria e diversificação", compara.

O que torna a proposta de Cabeça feita quase inédita é a ausência de firulas, samplers ou modernismos. Quase paradoxalmente, o Rei do Ritmo, tão moderno e desvinculado de amarras rítmicas, é resgatado na crua essência por um artista cuja produção musical é desde a estreia da banda Cascabulho, em 1995, pautada pelo diálogo entre a contemporaneidade e a tradição, tão bem definida no título do disco Cabeça elétrica, coração acústico (2005).

Silvério tenta voltar à década de 1970, quando teve duas chances perdidas de ver um show do ídolo. A primeira, no projeto Seis e Meia, e a segunda, durante a turnê em conjunto com Alceu. "Optei por ressignificar a obra dele me aproximando o mais fielmente da obra. Não houve fusão, diálogo, modernidade, releitura", conta Silvério. Microfones que reproduzem a acústica da década de 1960, mínimo possível de mixagem e gravação ao vivo de acordeom, baixo, zabumba e percussão (geralmente cada instrumento é gravado em separado) foram algumas estratégias utilizadas.

Forró em Limoeiro
, Cabo Tenório e Na base da chinela foram algumas escolhidas. O show já está pronto, ensaiado e deve ser lançado no segundo semestre, após temporada na Itália para descanso e a conclusão do doutorado. Enquanto as datas da turnê não são confirmadas, nada mais apropriado do que ligar a vitrola e botar o disco para rodar no projeto Terça do Vinil.
 
Ouça o disco Cabeça feita:



SERVIÇO
Audição de Cabeça feita: Silvério Pessoa canta Jackson do Pandeiro e discotecagem do DJ 440, com participação de Bruno Lins (Fim de Feira)
Onde: Lisbela e Prisioneiros Bar (Largo de Santa Cruz, s/n, Boa Vista)
Quando: Hoje, às 19h
Preço: R$ 24,90 (versão física, na Passa Disco) US$ 9,99 (iTunes)

+ sobre Jackson

Alceu Valença e Jackson do Pandeiro, em 1972. Foto: Arquivo/CB/D.A. Press
Alceu Valença e Jackson do Pandeiro, em 1972. Foto: Arquivo/CB/D.A. Press
"Conheci Jackson do Pandeiro em 1972, quando, ao lado de Geraldo Azevedo, fui até a casa do rei do ritmo - com os errrres reforçados, como ele gostava de pronunciar -%u200B, no subúrbio de Olaria, no Rio, para convidá-lo a participar do Festival Internacional da Canção (FIC). Ele a princípio ficou invocado com nossos cabelos longos, aquele visual barbudo meio hippie setentista. Éramos totalmente desconhecidos na época e ele achou que fôssemos cantores de iê iê iê, que ele detestava. Quando mostrei o Papagaio do futuro, que eu havia recém composto, Jackson ficou exultante. Mandou chamar a família: 'venham conhecer dois cabeludos que não são cabras safados, não', ele disse (risos). Anos depois, eu e Jackson excursionamos juntos por várias capitais brasileiras pelo Projeto Pixinguinha. Ele ensinava: 'para cantar frevo, é preciso ter queixada', ou seja, uma dicção ligeira, firme, suingada. Jamais esqueci a lição. Em 1979, participamos em dupla de outro festival, na TV Tupi. Cantamos Coração bobo, que compus em Paris, em homenagem a ele. A música pipocou em todo o país. Foi meu primeiro grande hit nacional e me abriu o caminho para o sucesso". - Alceu Valença

Bruno Lins fez tributo ao Rei do Ritmo em canção da banda Fim de Feira. Foto:
Bruno Lins fez tributo ao Rei do Ritmo em canção da banda Fim de Feira. Foto:
"Eu vejo Jackson do Pandeiro como um sujeito visionário, musicalmente tão importante pra cultura brasileira quanto Luiz Gonzaga, Dorival Caymmi, João Gilberto e todo esse pessoal que construiu as pedras fundamentais da MPB. Um artista nato, com um senso de ritmo espetacular, cantor sensacional, que foi capaz de, no seu tempo, antecipar muita coisa que está presente até hoje na música brasileira. Jackson era coco, samba, rojão baião e forró, craque em tudo que fazia. Ele foi a minha primeira escola de canto. Eu lembro que quando comecei a minha carreira eu tentava sincopar "à la Jackson", e era inútil, porque ninguém brincava com o tempo na música como ele brincava, talvez somente ele e Jacinto Silva faziam aquilo com propriedade, e até hoje eu me esforço muito e não consigo". - Bruno Lins

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