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Arte Point da cena alternativa, Galeria Joana D'Arc comemora 25 anos Espaço no Pina se tornou referência ao aliar a vocação diurna de espaço comercial com o funcionamento de bares, restaurantes, boates e a realização de festas e shows

Por: Isabelle Barros

Publicado em: 30/04/2015 10:00 Atualizado em: 30/04/2015 17:29


Galeria Joana D'Arc. Crédito: Marcelo Pinheiro/Divulgação
Galeria Joana D'Arc. Crédito: Marcelo Pinheiro/Divulgação

“Vamos à Galeria?” Há exatamente 25 anos, o teor dessa pergunta envolve noite, diversão e parte da história cultural do Recife. A Galeria Joana D’Arc, localizada na Avenida Herculano Bandeira, no Pina, se tornou referência ao aliar sua vocação diurna de espaço comercial com o funcionamento de bares, restaurantes, boates e da realização de festas e shows que se tornaram emblemáticos. A boate Boato, o bar Pin Up, o Bar Boratcho e o Anjo Solto são alguns dos nomes que ajudaram a formar gerações de notívagos.

O prédio onde funciona o espaço tinha uma função bem diferente da atual. A família da administradora da galeria, Liliana Pinheiro, manteve lá, durante quase cinco décadas, a Escola Joana D’Arc. As salas de aula foram redivididas e transformadas nas lojas, nos bares e nos restaurantes de hoje. “Nasci nesse prédio e estudei aqui a vida inteira. Meu pai, quando começou a galeria, não pensava em um perfil mais alternativo para ela. Dois anos depois, passei a trabalhar aqui e comecei a abrir espaço para amigos, pessoas nas quais acreditávamos. As lojas abertas aqui são muito conectadas aos nossos gostos e interesses. Eu como nos restaurantes da galeria, uso os produtos das lojas”.

A mística da Galeria começou ainda no início dos anos 90, ao congregar artistas e gente que gostava de tudo o que englobasse o termo “alternativo”. Comida, bebida e música se tornou a tríade que sustentava o local à noite.  Nomes como Chico Science & Nação Zumbi e Mundo Livre eram presenças certas. Um exemplo foi o show Mangue feliz, no dia 24 de dezembro de 1992, com as duas bandas. “Foi  um momento muito marcante da galeria. Lembro até hoje da primeira música: um cover de Taxman, dos Beatles. Conhecia Chico muito pouco, mas o show foi incrível”, lembra Liliana.

A partir dos anos 2000, as festas passaram a conviver cada vez mais com o aumento do número de restaurantes e o público se ampliou. Hoje, também funcionam lá salões de beleza, escritórios de arquitetura, lojas de roupas, de sapatos e de aluguel de fantasias. "Mantivemos o perfil da Galeria, mas há um profissionalismo maior. As coisas não duravam muito, algumas das pessoas que se instalavam aqui não tinham um lado empresarial forte. Tivemos de olhar a galeria como empresa, senão não sobreviveríamos", pontua Liliana.

Outro exemplo de como a galeria se consolidou é a longevidade de alguns de seus estabelecimentos. O restaurante Anjo Solto, dos sócios Ângela dos Anjos e Sérgio Souto, há 19 anos no local, é um deles. Ângela explica que a proposta inicial era a de abrirmos um bar, para aproveitar o movimento das festas. “Os crepes foram escolhidos por acaso, pois nossa ideia era servir uma comida leve e simples. A cidade não tinha muita diversidade de bebidas, de drinques e também focamos nisso. Ao longo do tempo, ampliamos a cozinha. Ao longo do tempo, houve uma renovação na galeria. Hoje, nosso público não é de festa, são pessoas que querem comer bem, e o Anjo Solto ajudou nessa mudança de perfil".

Curiosidades

O prédio tem administração familiar e começou a funcionar em 1931 como escola, que fechou no fim dos anos 1980.

A galeria está dividida em 23 lojas e 18 operações, já que alguns dos estabelecimentos ocupam mais de uma loja.

O primeiro bar aberto na galeria, com um ano de funcionamento, se chamava Satchmo. “Nele aconteceu show do disco Olho de peixe, de Lenine”, diz Liliana Pinheiro.

A banda Querosene Jacaré, referência dos anos 90 no Recife, foi fundada na Galeria por Cinval Cadena e Ortinho. Também era lá, em um espaço minúsculo, que os músicos ensaiavam.

A loja mais antiga a funcionar na galeria está no local há 23 anos e vende materiais de dança.

Relíquia

Panfleto da festa de natal Mangue Feliz, com Chico Science e Nação Zumbi. Crédito: Liliana Pinheiro/Reprodução da Internet
Panfleto da festa de natal Mangue Feliz, com Chico Science e Nação Zumbi. Crédito: Liliana Pinheiro/Reprodução da Internet


Cartaz convoca para a festa Mangue Feliz, com shows de “Chico Science / Nação Zumbi & Mundo Livre S/A”, no dia 24 de dezembro de 1992, no Satchmo Bar

Depoimentos

Glatt Fairy, DJ, performer e artista visual

“Trabalhei na Galeria Joana D’Arc de 2006 até 2013, no Boratcho, no Anjo Solto e em outros bares e restaurantes de lá. Frequentar esse lugar foi um divisor de águas na minha vida. Foi ali que encontrei acesso ao mundo exterior. Lá, fiz várias das minhas performances, expus minhas obras de arte. Minha primeira mostra aconteceu lá, ainda no ano 2000. Hoje, vou à galeria para me divertir, comer, beber alguma coisa, tocar em alguma festa. A Galeria é a minha segunda casa”.

Cinval Cadena, músico e um dos fundadores da banda Querosene Jacaré
“Tive um bar lá, o Guitarras, de 1993 a 1997. Queria abrir um local onde se pudesse conversar, beber alguma coisa e ouvir blues, já que, na época, o Recife estava infestado de axé e sertanejo. Comecei bem acanhado, ocupava uma sala muito pequena, mas o sucesso foi muito grande. Na época, a galeria era muito agitada, estourava de gente. Chico Science e Lenine passavam por lá. Ano retrasado, fiz um disco chamado Guitarras Blues Bar”.

Valdélio Carvalho, dono do Bar Boratcho, que funcionou de 1999 a 2014
“Quando o bar foi aberto, não havia comida mexicana no Recife. Sou tatuador e, nesse meio, conhecia muitas pessoas ligadas à música e à arte. De repente, o Boratcho se tornou um lugar de festa. No decorrer do funcionamento dele, tivemos mais intimidade com eventos culturais do que com a culinária. Tivemos lançamentos de livros, projetos como o Sem Noção, às quintas. Teve o lançamento do disco de Ortinho e artistas como Pupillo e Jorge du Peixe iam lá. Hoje, a identidade da galeria mudou bastante. Antes, era muito mais underground. Com o tempo, houve uma sofisticação, as referências são outras”.

Cláudia Aires, sócia da Nuvem Produções, na galeria desde 2013
“Sou de João Pessoa e moro no Recife há 8 anos, mas sempre ouvi falar da Galeria Joana D’Arc. Minha irmã, que mora aqui há mais tempo do que eu, conheceu o marido na Boato. É um local que teve ações de arte e moda muito importantes para a cidade. Artistas tamém tiveram ateliê por lá. Nem acreditamos quando arrumamos uma vaga na Galeria. Vimos um salto qualitativo muito grande na frequência, em ter um espaço nosso, com bons artistas. É um lugar que faz parte do imaginário do Recife”



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