Entrevista "As pessoas saem com autoestima massageada", conta Jessier Quirino, que lança DVD no Recife Noite de autógrafos será nesta quinta-feira, na Passa Disco, no Sítio da Trindade

Por: Marina Simões - Diario de Pernambuco

Publicado em: 16/04/2015 13:00 Atualizado em: 16/04/2015 12:45

Foto: Toddy Holland/Divulgação (Foto: Toddy Holland/Divulgacao)
Foto: Toddy Holland/Divulgação


O poeta e contador de causos Jessier Quirino se agarra na linguagem e na textura interiorana para escrever os textos nos 19 anos de carreira. O arquiteto de formação estreou em 1996 com o livro Paisagem do interior. Hoje, são nove livros, cinco CDs e o primeiro DVD Vizinhos de grito. Ele desenvolve preocupação em direcionar os temas das narrativas para o didatismo. “Tive a preocupação em fazer algo que pudesse ser usado em sala de aula, questionando tal contexto social”, conta o paraibano, lança DVD em noite de autógrafos, nesta quinta-feira (16), às 19h, na loja Passa Disco, Shopping Sítio da Trindade, no Parnamirim.

“Estava em débito com o público há anos. Surgiram gravações piratas e precisava ter um material com qualidade e imagens externas para situar os poemas e situações para enquadrar o Nordeste, e, enfim, ficou pronto”. O espetáculo, gravado no Teatro Boa Vista, em dezembro de 2013, mostra o encontro entre a literatura oral e a escrita, a música, poesia e humor. Participam Maciel Melo e Xangai.



Serviço
Lançamento do DVD Vizinhos de grito, R$ 35, Editora Bagaço
Onde: Passa Disco (Estrada do Encanamento, 480 Parnamirim)
Quando: às 19h
Informações: 3268-0888
Gratuito

Entrevista // Jessier Quirino

Sua poesia ajuda a fortalecer o orgulho de ser nordestino?
Percebo isso nas pessoas. Teve um caso curioso, na Livraria Cultura, no Recife, que me apresentei, as pessoas já saem com autoestima massageada. Recebi o público para autografar o livro. Então, chegaram três amigas e cercaram a mesa. Uma disse: ‘Sou matuta de São Caetano’. A outra: ‘Sou matuta de Belo Jardim’. Então veio a terceira. Uma delas falou: ‘Essa aqui não é matuta não”. Aí ela reivindicou: ‘Não sou matuta, mas painho é’. Achei isso um espetáculo. Três jovens que não têm a ver com aquela realidade, reivindicando a 'matutice'. Gosto de dizer que isso, para mim, são almofadas de penas de sobrecu de pavão.

Foto: Editora Bagaço/Divulgação (Foto: Editora Bagaço/Divulgação)
Foto: Editora Bagaço/Divulgação
Há preocupação em direcionar o que escreve?
Hoje tenho contextualizado algumas temáticas para gerações mais novas. Por exemplo, tenho muita graça no jeito de escrever, desde o título. Para essa geração “shopping center”, que se preocupa muito com estética, em não comer para não engordar, fiz um poema O bolo mau e os três porquinhos, no livro Berro Novo. O bolo é o monstro da história, onde três meninas lindas correm dele. As professoras usam o texto em sala de aula. Também já foi feito em Miss feiura nenhuma - a descrição de uma moça belíssima, que um cabra quando é liso, se for apaixonar por uma moça daquela, ele se lasca. Uma coisa que essa juventude gosta, e uso como ferramenta, é quando tem safadeza no meio. Uma prova disso é a história do Matuto do cinema. Agrada dos mais velhos até as criancinhas.

Com qual tipo de público que você dialoga?
Costumo dizer que é de coveiro de cemitério a piloto de super sônico. Isso envolve gente de todo tipo, criancinhas, intelectuais, gente de raízes interioranas. Uma coisa curiosa é que tem gente que não tem essa raiz e sente saudade de uma coisa que nunca viveu. Eu diria que é como um Parabéns para você, é simples, mas depende de muita sorte.

Há a intenção de transformar o espetáculo em programa de TV?
Já recebi convites para TV e até para blogs. Mas tenho dificuldade grande de fazer a coisa em nível de produção. Preciso ter minha mão no meio. O ritmo da palavra, o tempo, a respiração, são coisas que ensaio. Então, é diferente desse humor ou de programas que tem cinco ou seis pessoas escrevendo e o camarada é só a ponte. Essa estrutura se adequa para anedotas e piadas. Mas nesse contexto, de narrativa e da voz do matuto, depende de ritmo, e é uma coisa que depende muito de mim.

Como se sente em poder ser instrumento de disseminação do modo de falar nordestino?
Sempre tive interesse pela linguagem do interior, uma busca pela esperteza, astúcia, e pela a graça que tem na fala do homem do campo. Sou de Campina Grande, cidade que sempre teve aquele reduto de brejeiros e sertanejos. Usava essa forma de falar e conseguia me impor diante de pessoas mais velhas. Combati minha timidez através do recital, me impus muito. A partir de 1996, quando publiquei o primeiro livro, tive uma surpresa muito grande, porque fui bem recebido e discutido até em sala de aula, por intelectuais. As pessoas diziam que eu fazia conceituações sociais, coisa que não tinha a intenção. E minha obra terminou ficando com essa marca.

O que acha da popularização dos stand-ups?
Na realidade, esse formato já existia de muito tempo, sem ter esse nome. Nomes como José Vasconcelos, Jô Soares, Chico Anísio, Juca Sales eram pessoas que faziam sucesso na minha época e não tinham esse rótulo importado. Hoje, as pessoas fazem isso como uma forma de dar dignidade à profissão. Mas respeito o trabalho de todo mundo. No meu caso não é assim. Primeiro não gosto do nome stand-up. Eu trabalho com narrativas. O stand-up tem uma necessidade quase absoluta de se renovar, como o Facebook e as coisas que correm muito rápido na internet. Acho que o stand-up envelhece com pouco tempo.

Como avalia o uso do palavrão?
Na minha inflexão o palavrão desaparece. A entonação de qualquer palavra que se fale pode diminuir aquilo ao simples. Hoje nem me preocupo mais. Minha poesia primeira explorava isso. Ainda se encontra exemplos nos livros Paisagens de interior e Agruras da lata d'água. Do livro Prosa morena para frente são textos com mais cuidado. O uso de palavrão adoto apenas no palco.

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