Dança Espetáculo de Débora Colker traduz, em dança, interior da mulher

Por: Isabelle Barros

Publicado em: 29/03/2015 08:18 Atualizado em: 29/03/2015 11:13

Foto: Divulgação
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Como traduzir, em dança, o mundo interior de uma mulher que decide viver duas vidas? Foi essa pergunta que a coreógrafa Deborah Colker tentou responder em seu espetáculo mais recente, Belle, que teve apresentação neste sábado no Teatro Guararapes, localizado no Centro de Convenções, em Olinda. A resposta da coreógrafa a essa questão, no entanto, faz pensar sobre como a dança pode tratar um material ficcional e dramatúrgico sem cair em um didatismo que afasta do espetáculo a forca que ele poderia ter. A duplicidade da história trágica de Severine, mulher burguesa e bem casada que decide apimentar sua rotina ao se tornar, todas as tardes, uma prostituta de codinome Belle, perdeu em sutileza, embora a coreografia traga a habitual excelência técnica da Cia. Deborah Colker, com mais de 20 anos de existência.

A idéia para o espetáculo veio do livro Belle de Jour, de Joseph Kessel, lançado nos anos 20 e que era, em sua época, escandaloso por mostrar a mulher em uma posição de protagonista do próprio prazer. Esta e a segunda vez em que Colker opta por um material literário para conceber um espetáculo: a sua experiência anterior foi com Tatyana, personagem do romance em versos Eugene Onegin, do russo Alexander Pushkin, com apresentação no Recife em 2013. Em Belle, assim como em Tatyana, a apresentação da narrativa e feita de forma muito clara para o espectador, o que e, a principio uma vantagem, mas apresenta algumas armadilhas ao longo da coreografia.

Outro acerto foi a mudança da estrutura da peca: antes concebida com dois atos, agora a peca tem apenas um, o que mostra de forma mais orgânica, tanto coreograficamente quanto cenicamente, esse interesse crescente pelo erotismo proibido a Severine/Belle pela sociedade. Algumas idéias, inclusive se repetem: uma delas e o uso de uma tela, ou tecido, para pontuar mudanças de estado dentro da coreografia. Aqui, em Belle, um grande pedaço de tecido simboliza essa diferença entre a vida aceita socialmente e o submundo sexual da prostituição, como se essa passagem de Severine para essa vida dupla fizesse referencia também ao rompimento do himen e a perda de uma virgindade simbólica.

A idéia central do espetáculo e contar bem essa historia de infelicidade que ganha contornos cada vez mais eroticos ate o seu (anti)clímax. No entanto, os elementos da peca usados para trazer essa historia a vida tem significados bem desgastados pelo uso: a troca das sapatilhas de bale na casa de Severine para o salto alto no bordel, a referencia a pole dance a partir de um enorme abajur em cena, o figurino, inclusive em momentos nos quais os bailarinos ficam apenas de cuecas, tudo ganha os contornos de uma sensualidade previsível. O sexo, apesar de ainda ter muitos tabus, ja esta bem longe de ser um assunto praticamente interditado, como na época em que o livro-base da coreografia foi escrito. A coreografia, entao, usa ate de simulações do ato sexual, mas isso tem um resultado curiosamente neutro, por nao acrescentar nada ao que esta tao exposto no mundo e nao deixar muito espaço a imaginação de quem ve. Ainda assim, a coreografia vale a pena ser vista por mostrar em plena atividade uma das companhias mais longevas do Brasil que tem um grande vigor técnico e o mérito de tentar se reinventar a cada trabalho, embora nem sempre o resultado encha tanto os olhos. O espetáculo tem mais uma apresentação neste domingo, as 19h, também no Teatro Guararapes, com ingressos a R$ 80 e R$ 40 (meia) para a platéia e R$ 70 e R$ 35 (meia) para o balcão.

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