Arte urbana Do outro lado insere fotografias em janelas de demolição no Recife Fotógrafo Thiago França usa material descartado para dar "visibilidade" a oito espaços públicos da capital

Por: Vinícius de Brito

Publicado em: 03/01/2015 12:00 Atualizado em: 06/01/2015 08:58


França nasceu no Recife, em 1986, mas viveu no Acre por 16 anos. Crédito: Facebook/Reprodução
França nasceu no Recife, em 1986, mas viveu no Acre por 16 anos. Crédito: Facebook/Reprodução

Thiago França era o único corpo no meio de um quarto desabitado e sem mobília na São Paulo de 2003/2004. O artista foi para a megalópole aos 17 anos, com perspectiva de ser modelo e ator. Deixou a família materna no Recife e as memórias da infância em Rio Branco (AC), onde passou 16 anos acordando cedo com cheiro de mato e correndo nas ruas de terra. "Desde que fui para São Paulo, eu reparo mais nas coisas no lixo. É impressionante o que pode se achar lá", diz o artista, que reinventa e reaproveita materiais descartados.

Na Páscoa de 2006, Thiago veio visitar a família no Recife e ficou permanentemente. Aqui, cursou filosofia, mas abraçou o mundo artístico. "Comecei a trabalhar com fotografia no mesmo período. E me viciei. Andava com a câmera por todos os lugares e registrava cenas cotidianas na capital, e, quando percebi, tinha um acervo enorme guardado e 'mofando'". A fototeca que vem armazenando há pelo menos oito anos despertou Thiago França a produzir algo e "dialogar diretamente com as pessoas". Assim, surgia o ensejo da intervenção urbana Do outro lado, com fotografias emolduradas em janelas de demolição.

"São imagens do cotidiano nas quatro macrorregiões de Pernambuco, emolduradas em janelas reaproveitadas. Postas em lugares ao mesmo tempo hiperfrequentados e pouco valorizados. Um intercâmbio de imagens entre as regiões", tendo a ideia de "provocar nas pessoas uma relação mais íntima com a urbe", diz.

Crédito: Facebook/Reprodução
Crédito: Facebook/Reprodução
O fotógrafo pulverizou a mostra Do outro lado por oito cantos da capital: há janelas pelo Cais de Santa Rita, no camelódromo da Avenida Dantas Barreto, no Beco do Fotógrafo e na Rua do Riachuelo, ambas no bairro da Boa Vista; na Rua da Aurora e no Recife Antigo. Ao todo, eram dez obras, mas duas foram desinstaladas. A exposição a céu aberto, cujas instalações permanecem no local sempre, já deixou rastros pelo interior do estado, em Goiana, Triunfo e Garanhuns.

As janelas são um convite a quem passa por elas e, simbolicamente, sugerem um mergulho do olhar sobre uma paisagem. França usa, ainda, a Teoria das Janelas Quebradas, baseada em um livro de James Q. Wilson e George L. Kelling, para conceituar a intervenção: o pensamento sugere que janelas rotas desencadeiam em vândalos a tendência de despedaçar outras janelas.

>Número

8 janelas estão espalhas por bairros da capital. Em meados deste mês, outras dez passarão a fazem parte da paisagem do Recife

>Outras intervenções

Crédito: Facebook/Reprodução
Crédito: Facebook/Reprodução
As mãos do artista português Alexandre Farto, o Vhils, escavaram o rosto de uma professora de uma aldeia do Paraná no edifício São Jorge, no bairro de Santo Antônio, no Recife, em novembro. A arte tem como objetivo revalorizar espaços "invisíveis" da cidade. Farto também assina a mostra Incisão, na Caixa Cultural (Avenida Alfredo Lisboa, 505, Bairro do Recife), até o dia 25 de janeiro. A exposição impregna novos conceitos a 54 portas de madeira e reflete a questão dos índios no país. A entrada é gratuita. Horário de visitação: de terça a sábado, das 12h às 20h; domingos e feriados, das 10h às 17h.

Beto Figueiroa humaniza o Morro da Conceição, na Zona Norte da capital, com a intervenção Morro de fé, composta por imagens que o fotógrafo registrou no lugar há 14 anos, durante a festa em homenagem a Nossa Senhora da Conceição, celebrada no dia 8 de dezembro. O trabalho do pernambucano foi parar em algumas casas e escadarias da comunidade, onde instalou lambe-lambes. A exposição pode ser visitada até a próxima terça-feira (6), gratuitamente.

Temas cotidianos inspiram as obras coloridas e lúdicas do artista gráfico Jota Ze0ff, cujas intervenções ganham espaço no Recife (em bairros como a Caxangá, Tamarineira, Recife Antigo, Boa Vista, Santo Amaro) e em outros rincões do estado e do Nordeste. "Procuro sempre muros abandonados para dar vida com minha arte", diz.



MAIS NOTÍCIAS DO CANAL