Vida Urbana

Solar Francisco Ribeiro Pinto Guimarães, um dos imóveis que a Fundaj pede tombamento./Foto: Fundaj/Divulgação.
A Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) solicitou, nesta segunda-feira (13), o tombamento de seu campus no bairro de Casa Forte, na Zona Norte do Recife. O pedido, encaminhado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), reforça a importância do conjunto arquitetônico do Complexo Cultural Gilberto Freyre e visa conter a especulação imobiliária do bairro e a poluição visual e sonora em seu entorno. O local reúne os edifícios Solar Francisco Ribeiro Pinto Guimarães, Paulo Guerra e Gil Maranhão - este último que sedia o Museu do Homem do Nordeste.
A Secretaria de Cultura de Pernambuco (Secult-PE) também recebeu um pedido de tombamento, protocolado pela Fundaj na última sexta (10). “As edificações constituem um importante marco cultural para a nacionalidade, por representar, de forma harmoniosa, várias épocas construtivas. E somando ao valor construtivo, se deve registrar que por elas passaram personalidades que influenciaram a nossa identidade cultural, devendo com isso obter a justa chancela de patrimônio nacional”, afirma o presidente da Fundaj, Antônio Campos.
A Fundaj foi criada em julho de 1949 pelo sociólogo Gilberto Freyre e tem como missão preservar a memória, a formação profissional e a pesquisa social no Norte e Nordeste do país. Ela também é responsável por realizar pesquisas científicas, reconhecidas dentro e fora do Brasil, e ações vinculadas ao Ministério da Educação (MEC). Considerando a importância desses aspectos, o conselho diretor da fundação aprovou o projeto de tombamento e oficializou os pedidos junto aos órgãos responsáveis.
A própria instituição analisou as informações colhidas diretamente das fontes primárias do seu acervo, para garantir a legitimidade do tombamento. Foram levantados dados, documentos e imagens ilustrativas para o pedido, todos de pública transparência e uso coletivo. O memorial descritivo foi assinado por Frederico Almeida, coordenador-geral do Museu do Homem do Nordeste, e Antônio Montenegro, arquiteto e servidor da Fundaj.
“O conjunto de edificações da Fundaj em Casa Forte possui significativos méritos estéticos, históricos e técnicos, e que ensejam, na sua unidade, a proteção do diploma legal enquanto patrimônio cultural de Pernambuco”, destaca Antônio Campos.
Na petição, a Fundaj cita a lei estadual 7.970/1979, que versa sobre o tombamento estadual de bens. Já a ausência inicial de alguns documentos sobre a instituição, é justificada pelas dificuldades decorrentes da pandemia do coronavírus. Quanto a isso, é assegurado que, em breve, também será enviado o que falta.
Os edifícios
Solar Francisco Ribeiro Pinto Guimarães - Do final do século XIX, o solar tem área total aproximada de 610 m². O autor do projeto é desconhecido. O edifício é composto por porão alto e mais dois pavimentos. Ao estilo neoclássico dominante, foram incorporados elementos ecléticos, como ditava a moda na época. A entrada é marcada por um pórtico com colunas e arquitraves. A fachada é revestida por azulejos. A presença do porão alto, elemento comum nos solares construídos no século XIX, serve para isolar o edifício da umidade ascendente do solo e com isso promover melhores condições de salubridade das habitações em um clima predominantemente úmido e em um solo com níveis de lençol freático superficiais. Esteticamente, o recurso adiciona verticalidade à composição, conferindo porte e altivez ao edifício.
O solar foi construído em alvenaria estrutural de tijolos prensados e argamassados com cal e areia e revestidos com a mesma argamassa de assentamento dos tijolos. Os pisos são estruturados em vigas de madeira. No pavimento térreo, um tabuado suporta um primoroso parquet executado com madeiras de tonalidades variadas; no pavimento superior, o piso é um assoalho em pranchas de madeira. No terraço descoberto e vestíbulo da escada, o piso é revestido por ladrilho hidráulico.
O vão central de entrada apresenta imponente escada em madeira e mármore, encimada por uma claraboia, proporcionando iluminação zenital, conferindo leveza ao espaço. As portas e vãos que dão acesso aos salões são de madeira, com elementos metálicos em bronze. A janelas e porta externa, em esquadrias de madeira, possuem bandeiras com vidros coloridos. Os salões do pavimento térreo e hall de entrada têm o teto em gesso ricamente trabalhado.
O solar, que já passou por intervenções de restauro nas décadas de 1950, 1980 e 2010, encontra-se em bom estado de conservação, observando-se deterioração pontual nos revestimentos em azulejo das fachadas, que exige intervenção. No porão do solar funciona a sala de exposição Galeria Baobá. O solar conta com dois edifícios anexos com sistema construtivo semelhante ao dele. Essas edificações, dispostas em “L”, formam um pátio central para o qual o conjunto está voltado.
Com a inauguração do Complexo Cultural Gilberto Freyre, será instalada no Solar a Pinacoteca, com espaço para exposições permanentes e de curta duração. Já nas edificações anexas funcionam hoje a Galeria Mauro Mota e a Sala do Conselho Deliberativo (Condir), além de outros espaços utilizados como arquivo para o administrativo e para livros da Editora Massangana. Onde hoje funciona o Condir, será instalado o Memorial Gilberto Freyre. Era nesse espaço que o sociólogo fundador da Fundação Joaquim Nabuco despachava. Quando o Complexo for inaugurado, contará também com a Cinemateca Pernambucana, que está instalada provisoriamente no primeiro andar do Museu do Homem do Nordeste.
Edifício Gil Maranhão - Da década de 1960, esse edifício projetado pelo arquiteto Carlos Falcão Corrêa Lima tem área total aproximada de 1200 m². É um exemplar notável do modernismo brasileiro/pernambucano. A arquitetura moderna, contrapondo-se ao neoclassicismo e ao ecletismo dominantes durante o século XIX e início do XX, se caracteriza pelo emprego de novas tecnologias construtivas, de formas geométricas simples, sem adereços; pela estrutura autônoma em relação às paredes; pela planta livre, capaz de responder a múltiplas demandas; pelo emprego de pilotis; pelos grandes planos de vidro das fachadas; pela integração entre os espaços internos e externos. Outra característica importante é a adoção dos princípios da racionalidade e da funcionalidade que resultam na setorização e hierarquização dos espaços do edifício segundo seus usos e funções.
Conta com pavimento térreo e superior. A estrutura é em concreto armado. A fachada tem como destaque o painel cerâmico Canavial, do artista Francisco Brennand, com um espelho d`água. Também apresenta planos extensos de esquadrias em ferro e vidro e trechos revestidos com azulejos.
O edifício está localizado mais ao fundo do terreno de modo a criar um amplo jardim voltado para a Avenida Dezessete de Agosto. Nele, estão instalados, no térreo, o Museu do Homem do Nordeste, o Cinema do Museu e a sala de exposições Waldemar Valente. No piso superior funciona, provisoriamente, a Cinemateca Pernambucana, que será levada para o anexo do Solar Franscisco Ribeiro, dentro do Complexo Cultural Gilberto Freyre. Com a transferência, esse piso superior voltará a expor o acervo do Museu do Homem do Nordeste, que conta com uma reserva técnica de 16 mil peças.
Edifício Paulo Guerra - Da década de 1980, o edifício foi projetado pelo arquiteto Wandenkolk Tinoco. Tem área total aproximada de 2400 m². É composto pelo pavimento térreo e mais duas torres articuladas, cada uma com três pavimentos. Sua estrutura é em concreto armado. Está localizado imediatamente após o conjunto oitocentista do Solar Francisco Ribeiro.
Tem características da arquitetura modernista brasileira já em uma fase madura de desenvolvimento, quando novas tendências e possibilidades eram adotadas. O surgimento dos edifícios altos %uFF0D solução modernista para as grandes aglomerações urbanas %uFF0D introduziu novos desafios de projeto, entre os quais a busca por uma convivência entre os hábitos, o clima e as tradições locais se tornou um caminho a ser trilhado.
Assim, o edifício merece destaque pelo respeito aos edifícios oitocentistas, ao mesmo tempo em que adota uma solução bastante ousada: os novos blocos são verticalizados, montados sobre pilotis de concreto, aparenta mais três pavimentos, com sistema estrutural autônomo e intencionalmente visível, chegando a um gabarito maior do que dos edifícios antigos.
Além disso, eles tocam nos blocos ecléticos originais através de uma pérgula, que termina por se espalhar por além das projeções de ocupação dos conjuntos verticalizados, ampliando a área sombreada para além dos pilotis e se abrindo para jardins internos. O seu acesso principal, por sob tal grelha de concreto armado, se dá justamente pelo espaço que já existia entre os dois blocos em L, indicado pela projeção em balanço de uma marquise também em concreto armado. No edifício funcionam hoje a Editora Massangana, a Sala Calouste Gulbenkian, a presidência e todo setor administrativo da Fundação Joaquim Nabuco.
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