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Caso Miguel

Após mais de oito horas, Sarí deixa delegacia escoltada em viatura

Publicado em: 29/06/2020 15:15 | Atualizado em: 29/06/2020 22:11

Sarí precisou ser escoltada por policiais do Core devido aos protestos populares. (Foto: Leandro de Santana/Esp. DP.)
Sarí precisou ser escoltada por policiais do Core devido aos protestos populares. (Foto: Leandro de Santana/Esp. DP.)

Foram mais de oito horas entre a chegada e a saída de Sarí Côrte Real na Delegacia Seccional de Santo Amaro, onde prestou depoimento, nesta segunda-feira (29), sobre a morte do menino Miguel Otávio. Mesmo com veículo próprio no local, a primeira-dama da cidade de Tamandaré precisou ser escoltada por uma viatura do Core, da Polícia Civil, devido aos protestos populares no lado de fora da delegacia. O carro particular foi atingido por objetos e socos pelos manifestantes, que também entoaram xingamentos contra Sarí.

Sarí foi autuada em flagrante, pela Polícia Civil, no dia 2 de junho por homicídio culposo. O menino Miguel estava sob sua guarda temporária no dia, porque a mãe da criança, a doméstica Mirtes Renata, tinha saído rapidamentede sua casa para passear com os cachorros da patroa.


“Eu só fiquei sabendo que ela estava aqui de manhã porque vi na TV, na imprensa. Acho isso um absurdo. Ela é uma pessoa qualquer, então deveria ter esperado a delegacia abrir em horário normal. Por que mais cedo? Por que esse privilégio? Ela não tem cargo político nem curso superior", disse Mirtes, ao chegar no local, por volta das 8h30. Nesta segunda, às 10h, a família de Miguel iria realizar um protesto em frente à delegacia.

Mirtes segurava uma foto de Miguel em seus braços e estava acompanhada de suas irmãs, Fabiana e Erilourdes. Em seguida, chegou o advogado, Rodrigo Almendra, e posteriormente, Marta Souza, avó da criança. E na rua, anônimos se juntavam à família, em um protesto que acabou potencializado por causa do desenrolar da situação. “Considerando os argumentos relativos à possibilidade de aglomeração de pessoas e o risco de agressão à depoente por parte de populares, o delegado deferiu o requerimento. Saliente-se que esse deferimento não enseja nenhum prejuízo aos trabalhos de investigação”, afirmou a Polícia Civil de Pernambuco, em nota.
Manifestantes se aglomeraram em frente à Delegacia Seccional de Santo Amaro; Core foi convocado. (Foto: Diogo Cavalcante/DP.)
Manifestantes se aglomeraram em frente à Delegacia Seccional de Santo Amaro; Core foi convocado. (Foto: Diogo Cavalcante/DP.)

A mãe de Miguel exigia ficar frente a frente com Sarí, tendo em vista que não a via cara-a-cara desde o velório de seu filho, ocorrido em 3 de junho. “Enquanto ela está com dois filhos, dando amor e carinho, eu não tenho mais nenhum para dar amor e carinho”, lamentou, na porta da delegacia. Mirtes também voltou a falar que trabalhava para Sarí, junto com a mãe, mas recebia o salário pela Prefeitura de Tamandaré. “Ela disse para assinar o contrato de trabalho pela prefeitura. Meu nome ainda consta na folha de pagamento. Eu recebi o salário de maio, mas não recebi o de junho. Para onde está indo esse dinheiro?”, questionou.

Revolta
Sarí foi até a delegacia em um carro laranja, acompanhada de seu advogado, Pedro Avelino, e de uma outra advogada, além de seu sogro e do seu esposo, o prefeito de Tamandaré, Sérgio Hacker (PSB). O depoimento, em si, terminou por volta do meio-dia, mas a primeira-dama não deixou o local de imediato. Na rua, a manifestação ganhava cada vez mais força. Gritos de “assassina”, “covarde” e “Justiça por Miguel” ecoavam de diversas vozes.
'Eu escutei absurdos da boca dela', disse Mirtes, indignada após conversar pessoalmente com Sarí na delegacia. (Foto: Diogo Cavalcante/DP.)
'Eu escutei absurdos da boca dela', disse Mirtes, indignada após conversar pessoalmente com Sarí na delegacia. (Foto: Diogo Cavalcante/DP.)

Diante disso, a equipe da delegacia realizou duas manobras para tentar evitar um possível linchamento. Primeiro, foi permitido que o carro laranja ficasse, literalmente, colado, de costas, com a parede da delegacia, para evitar que a mulher tivesse que se deslocar muito tempo. Mas a fúria popular se intensificou. Foi necessário chamar uma equipe do Core (Coordenação de Operações e Recursos Especiais) para viabilizar sua saída por causa do protesto.

Por volta do meio-dia, Mirtes foi chamada para entrar na delegacia. Ela teve seu desejo de estar frente a frente com Sarí atendido; Ao deixar o prédio, por volta das 13h30, Mirtes estava indignada. “Ela disse que (eu e minha mãe) não tínhamos obrigação de cuidar dos filhos dela. A gente só cuidava porque de manhã ela tinha que correr, depois tinha que ir ao salão, academia, shopping. O povo não parava em casa. Ela disse na minha cara que não apertou o botão (do elevador). Todo mundo viu! Ela vir dizer na minha cara que não apertou. Mentiu na minha cara friamente”, desabafou, ao deixar a delegacia.

Após muita espera, às 14h30, Sarí deixou a delegacia escoltada por policiais e foi colocada dentro de uma viatura do Core. A população dava socos e tapas no veículo e a tia de Miguel, Eriloudes, se colocou na frente por alguns momentos. Ao sair da frente do carro, passou mal e precisou ser acudida. Policiais prestaram socorro e a levaram, dentro de uma viatura, para uma policlínica em Afogados.

Apesar dos questionamentos da imprensa, nem Sarí, nem seu esposo, Sérgio, nem seu advogado, Pedro, se manifestaram. Com o depoimento da primeira-dama e com o laudo do Instituto de Criminalística (IC), entregue no domingo (28), o inquérito do caso deve ser encerrado antes do prazo final - 2 de julho. O delegado Ramon Teixeira promete se pronunciar sobre o caso em coletiva de imprensa, ainda sem data prevista.

Relembre o caso
Miguel morreu ao despencar de uma altura de aproximadamente 35 metros, do nono andar do edifício Píer Maurício de Nassau, que integra um condomínio de luxo popularmente conhecimento como Torres Gêmeas, localizado no bairro de São José, área central do Recife. No dia da tragédia, chorando e procurando pela mãe, a criança entrou no elevador do edifício duas vezes para buscá-la. Ele chegou a ser impedido pela primeira vez por Sarí, mas conseguiu se desvencilhar na segunda tentativa. Em vídeos de câmeras de segurança, a mulher aparece deixando o menino sozinho no elevador e apertando botões.

Como Sarí estava com a "guarda momentânea da criança", ela foi parcialmente culpada pela Polícia Civil pelo acidente, caso previsto no art. 13 do Código penal, que trata de ação culposa, por causa do não cumprimento da obrigação de cuidado, vigilância ou proteção. Após ser presa em flagrante, pagou uma fiança de R$ 20 mil e foi liberada. Ela está sendo investigada por homicídio culposo, onde não caberia intenção de causar a morte da vítima.

Sete pessoas prestaram depoimento à Polícia, ao todo. Além de Sarí, que só depôs nesta segunda, foram ouvidos um morador do Píer Maurício de Nassau, que ajudou a socorrer o garoto, no dia 9; o zelador do edifício, Fábio Batista, e o ex-síndico do prédio, Carlos Nobre, no dia 10; a manicure Eliane Lopes, que estava na casa da primeira-dama no dia da morte, e o gerente de operações do edifício, Tomaz Silva, que também ajudou no resgate da criança. A mãe de Miguel, Mirtes, foi ouvida por duas vezes - no dia do ocorrido, 2, e no dia 25.

Defesa

Os advogados da investigada afirmam que o pedido para que o depoimento fosse realizado mais cedo visava a integridade física da mesma, "em virtude das constantes ameaças de morte que Sarí Gaspar vem sofrendo".

"O Dr. Ramon Teixeira, presidente do inquérito policial que apura as circunstâncias da tragédia, indeferiu o pleito de mudança de local. Antecipou, todavia, o horário do depoimento, não apenas como medida de segurança, para resguardar a integridade física dos envolvidos, mas, inclusive, no intuito de viabilizar o fácil acesso à Delegacia e o início imediato dos trabalhos, pretendendo o célere desfecho da investigação", diz o texto. "Embora a Defesa reconheça a total legitimidade das manifestações populares, há de se ver que a aglomeração na área externa da Delegacia, as agressões verbais perpetradas contra Sarí Gaspar e seus advogados e a violência física dirigida aos veículos evidenciaram, cabalmente, que o início da oitiva em horário de pouca movimentação não apenas foi medida prudente, mas extremamente necessária". 
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