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Desfile de mulheres indígenas no carnaval traz à tona discussões sobre preconceito e representatividade

Publicado em: 28/01/2020 09:01

 (Paulo Paiva/DP Foto )
Paulo Paiva/DP Foto
A pouco menos de um mês para o carnaval 2020, o Galo da Madrugada, maior bloco carnavalesco do mundo, anunciou que trará para o seu desfile um carro alegórico com representantes indígenas. Indígenas e carnaval. Dois temas ligados através de discussões sobre preconceito, falta de inclusão, respeito e representatividade.

Nas redes sociais, o assunto foi um dos mais comentados nos últimos meses com maior participação do público jovem e ativo em temáticas sociais. Não era difícil de achar na timeline lembretes de "fantasias" que não devem ser usadas nos blocos. Entre elas, a "fantasia de índio", que gerou desavenças após grande parte do público, principalmente feminino, desfilar nas ruas com desenhos corporais, cocais e adereços indígenas.

Voltando para o ano de 2018, quando a repercussão do assunto se deu após um vídeo de Katú Mirim, primeira indígena a trazer o tema à tona para as plataformas digitais gerou polêmicas e dividiu opiniões quando criticou a postura de se "fantasiar de índio". O vídeo surgiu após notar um grande número de vitrines repletas de acessórios utilizados pelas tribos, na Rua 25 de Março, em São Paulo.

"As vitrines estavam repletas de cocares e aquela cena ficou marcada na minha cabeça. Para mim foi como ver meus ancestrais e a mim mesma sendo pendurados", relatou a ativista e artista em seu vídeo no Youtube. Não faltaram comentários. Uma enxurrada de opiniões a favor e contra foram publicados.

Katú Mirim também explica que a fantasia "é apenas o começo de uma discussão sobre questões raciais, direitos, visibilidade e representatividade dos povos originários“, afirma em vídeo para o seu canal.

Em Recife, Carmem Fulni-ô representante de uma das maiores tribos de Pernambuco, a tribo Fulni-ô, que desfilará no carro alegórico do Galo da Madrugada contou que, apesar de entender o movimento, se sente honrada em participar de um dos carnavais mais tradicionais do Brasil, mas por outra questão: a visibilidade da mulher em uma tribo machista.

"Trazer um resgate cultural não é fácil, não podemos ser vistas apenas como fantasia, mas como pessoas da terra, que estamos aqui vivos e muitas vezes não somos respeitados. Eu quero levar para cima do carro a luta das mulheres. Na minha tribo apenas os homens aparecem, concedem entrevistas e representam os Fulni-ô. Quando o convite foi feito para mim, foi um grito de liberdade. Já eles [os homens] não gostaram. Para mim o carnaval não é uma festa, é uma luta", explicou Carmem.

Para o presidente do Clube, Rômulo Menezes, a ideia de trazer representantes de mulheres indígenas das tribos Fulni-ô, Xucuru e Pancararu é uma homenagem de integração e com elementos que estão registrados no cordel.

Outras formas de se vestir no carnaval também devem ser repensadas. O tema "África Pop", ditado em 2016 pelo famoso Baile da Vogue, que acontece no período carnavalesco, foi duramente criticado após ser considerado uma "homenagem" fashion e branca ao país com população majoritariamente negra. A grife Valentino também não escapou. Em janeiro de 2016, o ensaio da campanha foi realizado no Quênia e estrelado por modelos brancas usando roupas caracterizada pelos avaliadores como "motivos étnicos", em uma paisagem deserta e com a participação de mulheres negras e usando roupas tradicionais. Amplamente criticado pelo público, mas aclamado pela crítica, o tema foi caracterizado como "exótico".

Carnaval, celebração momesca e tradicional tão cultivada pelos brasileiros tem indícios de um futuro onde homenagens e celebrações podem e devem ser repensadas. As formas de expressão corporal falam tanto quanto escritas de 140 caracteres, livros, selfies e histórico de resistência de tribos indígenas e africanas que são lembradas quando convém a população branca. 






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