Com pedidos de paz e proteção, Águas de Oxalá lava as escadarias da Rua do Bonfim

Olinda se vestiu de branco neste domingo (12) para pedir paz e proteção aos orixás para o Carnaval 2020, durante a 37ª edição do Águas do Oxalá, cerimônia onde acontece a famosa lavagem das ladeiras do Sítio Histórico e da escadaria da Igreja do Bonfim. A festa deste ano trouxe duas novidades. A primeira foi a participação do grupo feminino Voz de Nagô, que abriu a celebração com louvações a orixalá. A outra foi a participação do padre Dom André dos Santos, da Igreja do Bonfim, que deu abençoou em oração a festa e os carnavalescos e pediu respeito, tolerância e união entre as diferentes religiões. Um dos homenageados foi o pai de santo Tata Raminho de Oxossi, que marcou sua presença e puxou diversos cânticos durante a benção dos orixás.

“Estamos aqui reunidos neste dia festivo para comemorar a prática da fraternidade entre todas as religiões e todas as pessoas, independente de seu credo, condição social e sua cor. Quem tem preconceito não pertence a Deus”, ressaltou o padre, finalizando a benção com uma oração, acompanhada pelos presentes. Para Preta Ana, uma das sete integrantes do grupo Voz Nagô, cada cântico entoado durante o Águas de Oxalá foi um pedido de paz, proteção e saúde para todos. “É a primeira vez que participamos da lavagem e foi um privilégio, porque para quem faz música negra, africana, é um evento tradicional para celebrar nossa religião”, disse. 

Representantes de mais de 40 terreiros do Recife e região metropolitana estiveram presentes na tarde deste domingo na Rua do Bonfim. Um dos representantes do Quilombo Cultural Malunguinho, Alexandre L’Omi Lodó, explica que o Águas de Oxalá abre o calendário oficial do povo de terreiro no Carnaval. “Essa cerimônia é uma espécie de Réveillon para nosso povo. É importante destacar que o Carnaval é uma festa que genuinamente começou dentro dos terreiros e suas manifestações são todas de raiz africana, como o maracatu, o afoxé, os bois, as la ursas. E Oxalá é o grande pai da nossa religião. Para ele, fazemos essa procissão, porque ele é o orixá da paz. E esse é o objetivo da festa: pedir paz para o mundo”, destacou Alexandre. 

Após as primeiras louvações, o típico som dos trombones anunciaram a chegada do pai Raminho Oxossi, que puxou os cânticos acompanhado do grupo de percussão de Olinda Ara Ode. Nesse momento, diversos pais de santos jogaram arroz, água de cheiro e flores nos carnavalescos, que representa a benção de Oxalá. A multidão acompanhou com palmas os louvores enquanto era benzida. “Os carnavalescos precisam de axé”, disse um dos organizadores do evento, Silvio Botelho.

O arroz branco é uma das comidas oferecidas a Oxalá, orixá associado à criação do mundo e da espécie humana. “E a água tem a função de renovar os ciclos, remete à fecundidade e representa a evolução da vida. Tanto que nós somos gestados dentro de uma bolsa d’água”, explicou Botelho. Já as flores das espécies graudilho branco e jasmin, que também são jogadas como forma de benção, porque para Oxalá as essências proporcionam felicidade, equilíbrio e harmonia e são utilizadas para purificadoras do ambiente. 

Após a lavagem das escadarias, um andor produzido pelo decorador Fagner Botelho, com cerca de dez mil flores utilizadas na ornamentação e com a imagem de Jesus Cristo, puxou o cortejo pelas ladeiras do Sítio Histórico de olinda, passando por locais como a Ladeira da Misericórdia, Quatro Cantos, Rua do Amparo, Guadalupe, encerrando na Roça de Oxun Oporá. A soteropolitana Gabriela Silva de Jesus, 52, que pela primeira vez participou do Águas de Oxalá em Olinda, ficou encantada com a cerimônia. “Eu sou cristã, frequentadora da Igreja Batista, mas não deixo de estar em contato com minha ancestralidade. Essa festa é muito parecida com a lavagem do Bonfim, em Salvador. A fundamentação é a mesma, a raiz afrobrasileira de nosso povo”, comemorou Gabriela.