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EDUCAÇÃO

Habilidades socioemocionais em tempos modernos. Por Mariana Arantes

Publicado em: 17/09/2019 09:16 | Atualizado em: 17/09/2019 09:20

Existem bombas-relógio nas escolas de hoje. São artefatos ativados diariamente que intoxicam a direção, os professores, os estudantes e os responsáveis. O veneno, sem cheiro, forma ou cor, afeta desde o ensino infantil ao universitário de instituições públicas e particulares, independentemente de serem modernas ou tradicionais e não poupa nem as líderes dos rankings de avaliação do MEC.

Trata-se da bomba da normalidade. Temos aceitado como normal a falência das relações interpessoais, brigas e agressões entre professores e alunos. Assistimos vídeos pelas redes sociais ou nos grupos de mensagens que mostram estudantes batendo e xingando uns aos outros. Docentes sendo ofendidos e apanhando com socos, pontapés e até cadeiradas. É o veneno que faz adolescentes vítimas de bullying, deixa os professores física e mentalmente esgotados e ambos sofrendo com transtornos de ansiedade.

O núcleo da bomba da normalidade é composto pela liquidez das relações atuais que estão cada vez mais frágeis, apressadas e descartáveis, como alertou Zygmunt Bauman. E, ao nosso ver, também pela ausência de compreensão das emoções como parte indivisível do ser humano. Quando não enxergamos a complexidade da dimensão emocional, tão importante quanto o corpo físico e os processos mentais, operamos de forma superficial sem questionar ou refletir sobre pensamentos e ações.

Tratamos os atos de violência na escola como normais já que ocorrem com frequência. Nos intoxicamos mais sem perceber. O que é integral não pode ser reduzido às suas partes sem ser desfeito. Mas, por um reflexo histórico, foi exigido de professores e estudantes que deixassem as emoções fora da sala de aula, separando sentimentos e raciocínio lógico com a ilusão de absorver melhor o conteúdo disciplinar. Negligenciamos dores e tensões que a raiva e o medo provocam no corpo, nos iludimos tratando a tristeza com pílulas à venda na farmácia e engolimos o choro porque na nossa família “homem que é homem não chora”. Felizmente, embora com certo atraso em relação a outros países, estamos aprofundando o debate sobre a relevância da dimensão emocional no ambiente escolar. Temos pesquisas que propõem uma cultura de cultivo das emoções e apontando diferentes formas de compreender como os sentimentos interferem na vida como um todo.

No entanto, com a bomba da normalidade acionada, precisamos tomar fôlego para destruir o núcleo que afoga os relacionamentos na impulsividade e no imediatismo. Escolhas construtivas são feitas com respeito aos limites individuais e coletivos e requerem antecipadamente alfabetização emocional, autoconhecimento e favorecimento ao autocuidado. Mas sem fórmulas mágicas. Processos que devem ser tão seriamente pensados quanto qualquer ato formativo na escola.

* DOUTORA E MESTRA EM EDUCAÇÃO. PESQUISADORA (PORTAL EDUCAÇÃO EMOCIONAL)
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