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Violência

Ex-PM, acusado de matar jovem no Ibura, será julgado nesta segunda

Mário Andrade foi morto em 2016, aos 14 anos. Sargento reformado está preso e já perdeu a farda militar. Júri começa às 9h

Publicado em: 24/09/2018 08:02 | Atualizado em: 24/09/2018 08:12

Foto: Gabriel Melo/Esp.DP
Joelma Lima, 36 anos, fez um bolo de aniversário para o filho morto. É de chocolate, decorado com a bandeira do Sport. Sobre o símbolo do time, ela desenhou o nome do jovem. O bolo será cortado hoje, data do nascimento de Mário Andrade de Lima. Há 17 anos ele veio ao mundo, às 14h45, no Imip, unidade reservada às famílias pernambucanas sem muitos recursos.

Depois de fatiado, o alimento será distribuído no Fórum Desembargador Rodolfo Aureliano, na Ilha Joana Bezerra. Por um grande acaso, a data do aniversário de Mário é a mesma do julgamento do homem acusado de assassiná-lo.

O crime aconteceu em 25 de julho de 2016, em uma via importante do Ibura, a Avenida Dois Rios, na periferia do Recife. As duas datas, a do nascimento de Mário e a do julgamento de seu algoz, são simbólicas para Joelma. A expectativa da mãe é por uma espécie de renascimento do filho mais velho. Ainda hoje. Quando foi morto, com três tiros, tinha apenas 14 anos.

O julgamento está previsto para começar às 9h. Será acompanhado por integrantes de diversos movimentos que apoiam a luta por justiça abraçada por Joelma Lima. Dois ônibus foram mobilizados para levar as pessoas do Ibura ao fórum. Desde o assassinato, foi criada uma campanha chamada Mário, presente!. Em suas entrevistas, Joelma costuma dizer: “ele matou o filho da mãe errada”.

Joelma se refere a Luiz Fernando Borges, na época do crime, sargento reformado da Polícia Militar. Um mês após o assassinato do adolescente, ele se entregou à Justiça. Atualmente, espera a sentença da Justiça no Presídio de Igarassu. É réu confesso e já perdeu a farda de militar após conclusão do Processo Administrativo Disciplinar feito pela Corregedoria da Polícia Militar. Alega ter praticado o crime por achar que seria assaltado por Mário. Hoje, contará com um defensor público durante o julgamento. Antes de morrer, de joelhos, o adolescente pediu por sua vida.

A justiça para Mário será buscada pelo promotor Guilherme Castro, do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), e pelas assistentes de acusação Jacqueline Martins e Camila Antero. Ambas atuam como voluntárias no processo. Ele vai a júri popular por homicídio qualificado contra Mário e homicídio tentado contra um amigo do adolescente.

Para a acusação, Mário foi morto por motivo fútil, ao bater na moto do réu enquanto dirigia uma bicicleta. Junto dele estava um amigo, também adolescente, que conseguiu escapar. Foram arroladas pela acusação quatro testemunhas. Uma delas é Joelma. Pela primeira vez, ficará cara a cara com o assassino do filho.

O juiz responsável por dar a sentença é Jorge Luiz dos Santos Henrique. O julgamento acontece na 2ª Vara do Tribunal do Júri, no terceiro andar. Os jurados são pessoas da sociedade civil, escolhidas por sorteio. As irmãs de Mário, com sete e seis anos, esperam o resultado do julgamento em casa. A mais velha anda quieta no quarto. Era a mais apegada ao irmão. Diz querer se juntar a ele.
 
Contra o extermínio da juventude negra 
 
O assassinato de Mário tornou-se bandeira de luta contra o extermínio da juventude negra. Desde aquela data, movimentos de apoio à causa já se mobilizaram de variadas formas para chamar a atenção da sociedade para o tema.

Mário e sua história tornaram-se tão simbólicos que uma turma de direito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) fez uma homenagem póstuma ao jovem morador do Ibura. Nomearam a turma com o nome do menino cujo sonho era ter uma fábrica de feijão.

O fotógrafo e jornalista Marlon Diego também se inspirou na história do adolescente para fazer seu Trabalho de Conclusão de Curso na UFPE. Durante sete meses ele acompanhou a rotina de familiares e amigos da vítima para apresentar um livro de fotojornalismo sobre o tema.

Enquanto não se tornava empresário por conta da pouca idade, Mário ajudava a mãe trabalhando na venda de gás de cozinha, à tarde, e fazendo sucos em uma lanchonete, à noite. Pela manhã, cursava o 8º ano em uma escola pública.

Mário foi morto quando voltava para casa, de bicicleta, diante de dezenas de pessoas. O sargento reformado vinha no sentido contrário, em uma moto. Fazia movimentos de zig-zag com o veículo. Também estaria alcoolizado. A moto do acusado e a bicicleta de Mário se encontraram. Um outro homem estava na companhia do PM. Nunca foi localizado.

Joelma quer a pena máxima para o ex-PM. “A condenação não vai trazer meu Mário. Queria trazer meu filho para casa no dia do aniversário dele. O que vai me acalentar é saber que outra mãe não passará o que eu passei na mão dele.”
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