Clouds27° / 28° C

Urbanismo

Após fechamento da rede Big Ben, imóveis ficam abandonados

Prédios onde funcionavam as farmácias estão abandonados, acumulando sujeira e provocando insegurança à vizinhança

Publicado em: 27/04/2018 07:19 | Atualizado em: 27/04/2018 07:46

Imóvel abandonado provoca sensação de insegurança na Rua 48, no Espinheiro. Foto: Nando Chiapetta/DP

O fechamento de 64 unidades das farmácias Big Ben, em todo o estado, em janeiro, deixou um rastro de prédios sem uso. No Recife, muitos dos imóveis ociosos estão localizados em em vias de grande circulação. Em alguns casos, como na Rua 48, no Espinheiro, o encerramento das atividades da farmácia se somou à situação de uma gama de outros endereços desocupados que, além de servirem de ponto de drogas e abrigo de moradores de ruas, acumulam lixo, mato e pichação. Em alguns lugares, os terrenos estão sendo transformados em estacionamento por flanelinhas. “De imediato, o maior impacto é um considerável número de imóveis desocupados em localizações consideradas estratégicas quanto à demanda por comércio e serviços. Isso quer dizer que temos ‘vazios’ surgindo da noite para o dia em zonas da cidade que deveriam estar sempre densamente ocupadas. 


Nenhum ponto comercial com a necessidade de alta rotatividade, como uma farmácia, se localizaria em regiões de pouco fluxo de pessoas ou com pouca infraestrutura instalada”, explica o doutor em Desenvolvimento Urbano Cristiano Borba. Segundo Cristiano, em um cenário de incerteza econômica e de tradicional cultura da especulação do solo urbano, a tendência é que os imóveis sejam oferecidos ao mercado por um valor muito alto, dificultando a reocupação no curto prazo. No caso da Big Ben, outro agravante se soma à situação dos edifícios ociosos: o pedido de recuperação judicial. Na prática, o processo trava os contratos de aluguel vigentes e os proprietários não conseguem receber seus imóveis de volta para viabilizar uma nova ocupação.

A legislação municipal vigente referente às políticas públicas urbanas também não dispõe de instrumentos claros para atuar sobre situações como essa, embora a função social do espaço e a criação de mecanismos de controle sobre o abandono e a especulação do solo urbano sejam os pilares do Estatuto da Cidade. Segundo a Prefeitura do Recife, o município só poderia agir e acionar o proprietário de um imóvel particular nos casos em que envolvem risco estrutural. “A legislação urbana ainda em vigor no Recife é, em sua maior parte, do século passado, sendo notória a sua inadequação às demandas urbanas contemporâneas”, opina Borba.

Degradação
 - Moradores e comerciantes do entorno lamentam a situação. “Eu já presenciei gente usando drogas aqui no estacionamento da Big Ben (na Rua 48). Tenho o costume de andar a pé, sair à noite para bares e agora tenho certo receio de passar por essa calçada. Como o horário de expediente dessa loja era até as 22h, antes do encerramento das atividades, a esquina ficava iluminada, tinha segurança privada e movimentação de pessoas. Outros imóveis também estão sem uso em plena Rua 48. A região fica deserta e acredito que prejudica o comércio do entorno de forma geral”, opina o jornalista Filipe Moura, 41, morador do Espinheiro.

O cabeleireiro Alexandre Marinho, 43 anos, que trabalha em uma galeria ao lado de uma loja da Big Ben, diz que além de ter deixado o local mais inseguro, sobretudo à noite, o fechamento da farmácia atrapalhou o movimento do salão de beleza. “Muitos clientes da farmácia viam o salão e aproveitavam para fazer algum tipo de serviço”, disse.

Com o fechamento da rede, que operava desde 2008 em Pernambuco, 1,2 mil pessoas foram demitidas, inclusive 220 farmacêuticos. O valor do pedido de recuperação judicial ajuizado pela Brasil Pharma (que comprou a Big Ben em 2011, por R$ 453 milhões), na Justiça de São Paulo é de R$ 1,2 bilhão. A Big Ben soma 15 mil credores. Além do impacto trazido pelo esvaziamento do espaço em si, o fechamento em massa da Big Ben levanta novamente a discussão em torno do fenômeno de expansão das redes de farmácia no Recife.

 

Falta de diversidade levanta discussão 


A prática de demolir e substituir imóveis preexistentes por um novo padrão de edifícios monofuncionais, cujas construções são específicas para esse uso, pode ser bastante nociva dentro da perspectiva da dinâmica urbana, provocando a permanência indefinida de espaços inúteis em zonas densas e valorizadas da cidade, sobretudo se o encerramento de atividades se repetir com mais duas ou três redes num curto espaço de tempo.

“Esses empreendimentos que começam a reverberar em toda esquina, quando não se trata de franquia ou negócio mais consolidado, invariavelmente serão empreendimentos de recursos fáceis de financiamento, que se proliferam de maneira faraônica e meteórica e todos sabem como vão acabar. Temos o caso da Farmácia dos Pobres, entre outros exemplos, como as lojas de hortifrutas”, lembra o arquiteto César Barros.

Por esse motivo, ele diz que é preciso que os órgãos municipais competentes intervenham. “A dinâmica urbana é feita da diversidade de usos, como farmácia, padaria, oficina, borracharia, bodega, açougue. É função do poder público garantir essa dinâmica, trabalhando a diversidade, evitando clusters, especulação e garantindo que todas estejam presentes no território”, justifica.

“Do ponto de vista da arquitetura, objetivamente, não há nenhuma justificativa para que uma farmácia não possa ser instalada em um edifício originalmente residencial, por exemplo. Se o fenômeno ocorresse com a preservação do imóvel anterior, o que aconteceria após o encerramento do funcionamento da farmácia seria a liberação de um imóvel de razoável capacidade de adaptação a novos usos, garantindo maior resiliência naquela parcela urbana”, acrescenta o urbanista Cristiano Borba.

Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.

Mais notícias

Acompanhe o Diario de Pernambuco no WhatsApp
Acompanhe as notícias da Xinhua