Arqueologia

Pesquisa reconstrói rosto do 'flautista'

Estudo da Unicap revela face de um índio que viveu há dois mil anos no Agreste de Pernambuco

Publicado em: 15/03/2018 09:46 | Atualizado em: 15/03/2018 09:52

Roberta Richard Pinto, coordenadora do Museu de Arqueologia da Unicap. Foto: Julio Jacobina/DP

O rosto de um pernambucano que viveu há dois mil anos será revelado através da técnica de reconstrução facial forense feita a partir do crânio. A peça faz parte de achados encontrados em junho de 1983, no Sítio Furna do Estrago, município de Brejo da Madre de Deus, no Agreste do estado, e está exposta no Museu de Arqueologia da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). 

O crânio pertence a um homem adulto, que possivelmente portava, entre os braços,  uma flauta confeccionada com uma tíbia humana de 33 centímetros. Por essa razão, está sendo chamado de “flautista”. Especialistas acreditam que se trata de um ancestral da tribo indígena Xucuru. Na terça-feira, em uma decisão inédita, a Corte Interamericana de Direitos Humanos reconheceu as violações sofridas por este povo, determinando que o Estado brasileiro conclua o processo de demarcação de terras e crie um fundo de US$ 1 milhão para reparação dos danos. 

O resultado da pesquisa da Unicap, incluindo a imagem da face redescoberta será apresentado no dia 24 de abril, às 19h, em evento aberto à comunidade no Museu de Arqueologia. A reconstituição possibilitará o conhecimento das características da população pré-histórica de Furna do Estrago. A primeira parte do projeto consistiu em digitalizar o crânio (catalogado como FE11) em 3D, utilizando-se a técnica de fotogrametria, um escaneamento em três dimensões feito a partir de fotografias digitais. 

“Com o crânio digitalizado, modelamos sobre ele os músculos principais da face e complementamos com o restante dos chamados tecidos moles (gorduras, glândulas etc), projetando a espessura da pele com tabelas estatísticas levantadas em uma população próxima à do crânio”, explicou a bióloga Roberta Richard Pinto, coordenadora do Museu de Arqueologia da Unicap. Todo o trabalho é feito tomando como base uma vasta bibliografia científica produzida desde 1895, coordenada pela arqueóloga Jeannette Maria Dias de Lima (1939-2002). 

Segundo Roberta, o crânio é de uma pessoa que morreu com cerca de 45 anos. “Ele se destacou entre os demais 83 materiais osteológicos encontrados, pelas particularidades no seu esqueleto e no enxoval funerário enterrado junto com o corpo. Além da flauta feita com uma tíbia, achamos 22 contas de sementes (adereço indígena), restos de um colar e fibras de vegetais possivelmente usados no sepultamento. O indivíduo também tinha uma fratura na bacia”, comentou a pesquisadora. 

Segundo a biológa, para proceder a reconstrução facial forense foi preciso digitalizar o crânio. “Nesse caso, optou-se pela fotogrametria, uma técnica que utiliza uma série de fotografias, de 30 a 70 tomadas, do crânio, tiradas em círculo e enviadas a um programa de computador que converte a sequência das imagens em um objeto tridimensional”, esclareceu. 

Depois, o crânio é alinhado segundo o Plano de Frankfurt, que simula a posição do rosto quando o indivíduo está de pé. Programas de computador calculam a quantidade de músculo e pele que a pessoa teria. “A estrutura então recebe uma espécie de massa virtual esculpida usando como base as projeções feitas em etapas anteriores. Assim, a face é finalizada, recebendo pigmentação e cabelos”, disse.
 
O estudo atual está sendo acompanhando também pelo cirurgião plástico Pablo Maricevich, o 3D designer Cícero Moraes, o historiador e professor do curso de licenciatura em história e vice-coordenador do Programa de Pós-graduação em Ciência da Religião da Unicap, Luiz Carlos Marques, e os arqueólogos Flávio Moraes, coordenador do Núcleo de Pesquisas e Estudos Arqueológicos e Históricos da Ufal, e Daniela Cisneiros Mützenberg, professora de graduação em arqueologia da UFPE e pesquisadora da Fundação do Museu do Homem Americano.
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